Folha de S. Paulo


Crise afeta segurança e gera 'medo de morrer' no Rio Grande do Sul

Luiz Fernando Schilling, 29, foi assassinado a facadas em um assalto ao defender a irmã. Cristine Fonseca Fagundes, 44, levou um tiro na cabeça enquanto esperava o filho de 10 anos sair da escola. A filha mais velha estava no carro e viu a mãe morrer. Antonio Cascaes Martins, 78, morreu com um tiro no peito enquanto trabalhava na sua barbearia, um ofício de 50 anos.

Homicídios como esses, ocorridos em 2016, em Porto Alegre, aumentaram 128% no Rio Grande do Sul na comparação do primeiro semestre de 2010 com o primeiro semestre de 2016 –de 39 para 89. Se comparado aos seis primeiros meses do ano passado, esse tipo de crime cresceu 35%.

O Estado vive uma crise de segurança pública sem precedente, com corpos degolados nas ruas, disputa entre facções, superlotação de presídios e detentos algemados em lixeiras por falta de vagas nas carceragens. O Presídio Central, que já foi rotulado como o pior do país, tem 4.700 detentos para 1.800 vagas.

Radio Guaíba/Divulgação
Dois homens detidos pela Brigada Militar (BM) entre o final da noite passada e a madrugada desta quarta-feira, em Porto Alegre, foram algemados nesta manha em uma lixeira localizada em frente ao Palacio da Polícia Civil Foto: Radio Guaiba / Divulgacao / CP ***DIREITOS RESERVADOS. NÃO PUBLICAR SEM AUTORIZAÇÃO DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS E DE IMAGEM***
Dois homens detidos na madrugada de quarta-feira, em Porto Alegre, foram algemados em uma lixeira

Com a crise nacional do sistema carcerário, o presidente Michel Temer (PMDB) anunciou um presídio federal de segurança máxima no Estado, ainda sem data e local para início das obras. A desmotivação de policiais militares e civis agrava a situação.

O governador José Ivo Sartori (PMDB) tem pedalado os salários dos servidores, através de parcelas, há um ano. Para tentar diminuir o deficit, Sartori enviou à Assembleia um projeto que extingue órgãos –os deputados já aprovaram o fim de três secretarias e oito fundações.

POLICIAIS INSATISFEITOS

Desde 2015, policiais civis fizeram diversas greves, e os militares ficaram "aquartelados" (dentro dos quartéis) porque são proibidos, por lei, de fazerem greve. "É tenebroso [o parcelamento]. O pessoal fica sem vontade [de trabalhar] e só faz o básico", diz Fábio Castro, vice-presidente do Ugeirm (Sindicato dos Escrivães, Inspetores e Investigadores de Polícia).

Por causa da crise das finanças gaúchas, não há perspectiva de regularizar o pagamento dos salários em curto prazo. À Folha, a Secretaria Estadual da Segurança informou que, apesar dos parcelamentos, os policiais estão recebendo o reajuste salarial que foi determinado no final do governo anterior, de Tarso Genro (PT).

Só neste ano, 2.889 policiais militares deixaram o serviço público, segundo o presidente da Abamf (Associação dos Servidores de Nível Médio da Brigada Militar), Leonel Lucas. Nas ruas, são 16 mil policiais. Há dois anos, eram 23 mil. Para compensar o deficit, a Secretaria informa que 1.900 policiais aprovados em concurso já estão em formação.

MEDO DE MORRER

A sensação de insegurança é tanta que oito em cada dez moradores da capital mudaram seus hábitos devido ao medo. É o que mostra uma pesquisa com 400 pessoas, encomendada pela Asofbm (Associação dos Oficiais da Brigada Militar) e divulgada recentemente.

"O governo foi capaz de decretar estado de calamidade pública por suas finanças, mas não teve a mesma sensibilidade para decretar calamidade em face do risco à vida das pessoas", diz coronel Marcelo Gomes Frota, presidente da entidade.

A pesquisa também mostra que 68,6% dos porto-alegrenses temem assaltos. Destes, 21,3% disseram "ter medo de morrer em um assalto". Além disso, 71,8% foram vítimas ou têm familiares que foram vítimas de algum crime. Sobre a gestão de Sartori, 79,3% acham ruim ou péssima.

Sobre a pesquisa, a Secretaria da Segurança avalia que os policiais "retrabalham" em função da "flexibilização das leis penais e do cenário de desestruturação social atual" e que o quadro é agravado pela crise nacional, com "12 milhões de desempregados".


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