Folha de S. Paulo


Após 14h, PM controla rebelião em presídio do RN neste domingo

Veículos da Polícia Militar entraram na Penitenciária de Alcaçuz, maior presídio do Rio Grande do Norte, por volta das 6h da manhã deste domingo (15), no horário local (7h em Brasília). Uma rebelião ocorria na prisão desde o fim da tarde deste sábado (14).

O motim foi controlado por volta das 8h (horário de Brasília), segundo informações da Secretaria de Segurança Pública. Pelo menos 26 presos foram mortos, de acordo com o governo estadual. Em coletiva de imprensa, o secretário de Justiça, Wallber Virgolino, disse que o número pode se aproximar da matança que aconteceu na penitenciária de Boa Vista (RR), onde 33 detentos foram mortos.

Com mais essas 26 mortes, o número de assassinatos em presídios pelo país chega a 135 casos nas primeiras duas semanas do ano. As mortes já equivalem a mais de 30% do total registrado em todo ano passado. Neste mês, já ocorreram outros massacres de grandes proporções em presídios do Amazonas e de Roraima.

A rebelião foi motivada por uma briga nos pavilhões 4 e 5 do presídio, envolvendo membros do PCC (Primeiro Comando da Capital) e do Sindicato do Crime, de acordo com o governo. O que deu início ao conflito foi a invasão de um pavilhão por presos inimigos. O governo diz que a rebelião foi restrita a esses dois pavilhões e que não houve fugas.

Virgolino disse que já foram identificados seis líderes das facções e que eles serão transferidos para outro presídio.

No início da tarde, ainda estava sendo feita uma perícia para identificar mortos e autores dos crimes. O local ficou parcialmente destruído.

NOITE ADENTRO

O conflito começou por volta das 17h de sábado, no horário local (18h em Brasília). A Polícia Militar acompanhava a situação da rebelião, com tropas do choque e do Bope no local, mas não conseguia entrar no prédio.

Durante a madrugada, o clima foi tranquilo. Os presos permaneciam fora das celas e circulavam nos pavilhões. Lideranças de facções teriam sido separadas pela polícia com bombas de efeito moral.

Na madrugada, familiares do lado de fora da penitenciária improvisaram papelões nas calçadas e se protegeram do frio com cobertores.

Por volta das 2h, eles organizaram um culto ecumênico, com rituais e canções de diferentes religiões, seguidos de orações.

Quando amanheceu o dia, recomeçou a busca por notícias de sobreviventes. Homens da Força Nacional, bombeiros e ambulâncias permaneceram na porta do presídio, e policiais militares tentavam tranquilizar as pessoas.

Dona Zélia de Melo, 44, era confortada pelas filhas e amigos. Chorava ao pensar que seu filho poderia ter morrido. Diego de Melo, 27, foi preso acusado de tráfico de drogas. Condenado a 11 meses, já cumpriu metade da pena. Ele estava no pavilhão 4, o que teve mais mortes.

Zélia afirma que o filho integrava o Sindicato do Crime. "Eu fiquei sabendo da rebelião pelos amigos e vizinhos que me falaram por telefone. Só Deus para nos proteger dessa agonia", diz.

A dona de casa Maria Santos, 60, moradora da zona norte de Natal, diz que está cansada de ser surpreendida com más notícias vindas de Alcaçuz, onde seu filho, de 37 anos, cumpre pena por tráfico de drogas.

"Quem nunca soube o que é o inferno, é aqui (Alcaçuz). Os agentes (penitenciários) fazem o que eles querem. É uma humilhação para as esposas", afirma.

Francisco Costa/Folhapress
Rebelião em presídio de Alcaçuz, no RN, foi controlada na manhã deste domingo
Familiares de presos aguardam do lado de fora da Penitenciária de Alcaçuz, no RN

O Sindicato da Polícia Civil do Rio Grande do Norte emitiu uma nota em que alerta sobre ataques nas ruas e em outros presídios por facções. O Estado afirma que apenas em Alcaçuz ocorreu rebelião.

O secretário estadual de Justiça, Wallber Virgolino, reconhece a crise no sistema penitenciário e afirma que o governo criou uma equipe para gerenciar a rebelião.

Segundo o advogado Gabriel Bulhões, da Comissão de Advogados Criminalistas da OAB-RN, há uma "guerra de facções" no Estado entre o PCC e o Sindicato do Crime –uma dissidência do PCC que surgiu por volta de 2012. Os dois grupos lutam pelo domínio do sistema carcerário, em especial em Alcaçuz, o maior presídio estadual.

"Essa situação estava para explodir há algum tempo", afirma Bulhões. Segundo ele, o clima estava tenso nos últimos meses e há informações de que os grupos estavam se armando para o confronto.

O governo informou que criou um gabinete de gestão integrada e que enviou batalhões de todo o Estado para o presídio. O Ministério da Justiça disse, por meio da assessoria, que o ministro Alexandre de Moraes acompanha a situação em Natal.

Imagens compartilhadas na internet atribuídas ao motim mostram presos sendo mutilados e decapitados. O governo não confirmou se as fotos e vídeos são verdadeiros.

Penitenciária Estadual de Alcaçuz

ALCAÇUZ

A Penitenciária de Alcaçuz abriga 1.083 presos, mas tem capacidade para apenas 620, segundo dados da Secretaria de Justiça. O presídio fica no município de Nísia Floresta, a 25 km de Natal.

Construída sobre dunas, a penitenciária registra fugas frequentes de presos: basta cavar um túnel na areia para sair.

Além disso, como as dunas se movem com o vento, o acesso ao presídio também fica facilitado. Algumas vezes, há dunas tão altas que permitem a visão de dentro do pátio.

"Se um garoto pegar um estilingue e colocar um celular ou drogas, lança para dentro do presídio", diz Ivenio Hermes, pesquisador do Observatório da Violência do Rio Grande do Norte.

O Rio Grande do Norte viveu uma crise de segurança pública no ano passado, com ataques a ônibus. A Força Nacional chegou a ser enviada para o Estado.

Na época, o governo atribuía os ataques a uma reação à instalação de bloqueadores de celulares nos presídios estaduais e informou que as ordens partiam de dentro das penitenciárias.


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