Folha de S. Paulo


Crise, feriado em 'dia errado' e chuva esvaziam hotéis em praias paulistas

Com o feriado mais importante do ano em um fim de semana, o que significa um dia útil a menos de folga, o mau tempo nos últimas semanas e, claro, a crise econômica, a ocupação de hotéis e pousadas no litoral norte de SP está aquém do esperado.

No Réveillon de 2015, esses espaços já previam uma ocupação de 80%. Agora, as reservas com antecedência representam cerca de 60% de ocupação, segundo José Carlos de Souza, secretário-executivo do Sindicato de Hotéis, Restaurantes, Bares e similares do litoral norte.

Parte dos hotéis manteve os mesmos preços do ano passado, segundo ele –e há até casos de redução de preço.

O litoral paulista tem vivido um verão com menos sol e calor do que o esperado até agora. Nos comércios e nas pousadas, a torcida é para que a previsão do tempo não assuste mais os turistas durante o fim de semana. Na semana passada, restaurantes e pousadas estavam vazios.

Gerente de um chalé construído por um proprietário que visava aumentar sua renda para manter uma casa em Barra do Una, Kátia Oliveira, 42, diz que o pacote de Réveillon ali custa o mesmo de 2015: R$ 1.935, por cinco noites, para duas pessoas. O valor é inferior à média de R$ 2.000 a R$ 5.000 dos hotéis da região, segundo o sindicato. A procura, segundo Kátia, diminuiu cerca de 30%.

Até os hóspedes endinheirados que vão para a praia de helicóptero têm recorrido menos a essa forma de transporte. O empresário Fabrício Hauschild, 44, proprietário de um heliporto em Juqueí, diz que, neste ano, durante o rigoroso inverno no litoral, o resultado foi "uma catástrofe". "Tínhamos uma média mensal de 70 pousos no inverno; o número caiu para 15."

No Réveillon, ele espera pelo menos de 50 a 70 pousos, mas admite que o número pode ser menor do que o de 2015.

Ele é proprietário de cinco casas no litoral, que aluga para turistas. "Ano passado, a procura era maior. Agora, parece que as pessoas estão deixando para a última hora."

PODER DE COMPRA

Não é só a hospedagem que enfrenta a crise. A compra de imóveis também foi afetada.

"Nos últimos dois anos, sentimos que o poder de compra diminuiu no litoral", afirma Ivan Lopes, 38, corretor de imóveis que trabalha em Riviera e que é proprietário de 11 casas em Camburi que aluga por sites de hospedagem.

Ele diz que "o público de baixa renda" não compra mais apartamentos e casas em Riviera, e quem tem maior poder de compra paga agora R$ 3 milhões em espaços que valem R$ 5 milhões.

Lopes também observa que a data do Réveillon de 2016 tem atrapalhado o aluguel de casas no feriado. O dia 31 cairá em um sábado -e muita gente terá menos tempo de folga para ficar na praia.

Isso atrapalha pacotes do feriado, que englobam entre cinco e sete dias. Pelo Airbnb, a solução foi propor aos hóspedes que só poderiam passar metade da semana na praia a compartilharem o pacote com quem quisesse passar o restante do tempo ali –solução que viabilizou até agora uma única reserva.

ALUGA-SE

Ao lado de uma casa em cima de um morro, com uma vista estonteante para o mar, um chalé foi erguido no começo do ano. Nesse terreno em Camburi, no litoral norte de São Paulo, o arquiteto Marcelo Teixeira, 48, inovou para pagar as despesas da casa.

"É caro ter casa na praia", diz ele, cuja família é proprietária do terreno há 40 anos. Com a crise, ficou mais difícil manter a morada. Para "pagar as despesas", projetou o chalé para duas pessoas que desde maio recebe hóspedes por meio do site de hospedagem Airbnb, por R$ 300 a diária –R$ 500 aos sábados.

Moradores do litoral e donos de casa na praia têm recorrido ao aluguel desses espaços para mantê-los –alguns, como Teixeira, até constroem outras casas, fazendo disso um negócio.

A 3 km dali, longe da praia e mais no meio da mata de São Sebastião, um garoto de 18 anos comprou um terreno com o dinheiro de uma herança. Construiu ali uma casinha simples, só para si.

Isso foi há 20 anos. Hoje, Ivan Lopes tem 38.

Com o tempo, ainda adolescente, percebeu que não teria dinheiro para manter a casa. Construiu outra casinha no terreno para alugar para amigos. Mais uma. Outra. Até que chegou a 11. "Era uma comunidade de surfistas. Só amigos alugavam", diz ele, hoje corretor de imóveis.

Depois de alguns anos com a garantia das 11 casas alugadas anualmente ("Até com fila de espera", diz), em abril de 2016 a primeira delas vagou. Depois, mais uma. De repente, Lopes se viu com cinco casas livres. "Ao deixar as casas, meus amigos disseram que começaram a sentir no bolso, não tinham como pagar, mesmo que fosse pouco."

Quando as casas ainda eram ocupadas, ele cobrava cerca de R$ 1.000 por mês, às vezes era dividido entre mais de um amigo. Agora, com cinco casas mais a sua no Airbnb, cobra R$ 100 por noite.

Dados do Airbnb mostram que em Guarujá, Bertioga, Ilhabela e São Sebastião houve crescimento de 122% no número de anúncios de espaços para aluguel de dezembro do ano passado a dezembro deste ano. A empresa diz também, sem revelar dados, que houve "aumento expressivo da demanda" na região.

Mas, a alguns usuários, o serviço recomenda o barateamento do custo da hospedagem, regulando o mercado da oferta e da demanda, como fez por e-mail com o ator Ramon Devivas, 53, que cobra R$ 300 a noite para duas pessoas no chalé que construiu em Camburi –também com o objetivo de manter sua casa.


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