O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), indicou nesta quarta-feira (30) não apoiar a intenção do colega que comanda a Câmara, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), de revisar uma decisão de ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) sobre a criminalização do aborto.
Na terça-feira (29), a maioria dos ministros da primeira turma do Supremo firmou entendimento de que praticar aborto nos três primeiros meses de gestação não é crime.
Votaram dessa forma os ministros Luís Roberto Barroso, rosa Weber e Edson Fachin. Eles consideraram que os artigos do Código Penal que criminalizam o aborto nessa etapa violam direitos fundamentais da mulher e são contrários à Constituição.
A decisão é sobre um caso específico, de Duque de Caxias (RJ). Embora não precise ser seguida por outros magistrados, pode influenciar outros processos pelo país.
Para se contrapor aos ministros, Maia atendeu a pedidos vindos especialmente da bancada evangélica e disse que vai instalar uma comissão especial para rever a deliberação do Supremo.
A ideia é que os deputados elaborem uma PEC (Proposta de Emenda Constitucional) para deixar claro o caráter criminal do aborto em qualquer momento da gravidez.
O presidente do Senado, que também costuma criticar decisões do Supremo que esbarram em matérias de caráter Legislativo, desta vez apoiou a decisão do tribunal.
"Entendo que, quando o Congresso tem dificuldade para deliberar sobre tema complexo, não acho ruim que o Supremo delibere. O Supremo não pode deliberar quando o Legislativo quer decidir sobre a questão, mas quando o Legislativo tem dificuldades, não se pode contestar uma decisão do STF", disse Renan.
O entendimento de Renan deve esfriar a iniciativa de Rodrigo Maia, que já quer instalar a comissão na Câmara até a próxima terça-feira (6). A opinião do senador é surpreendente e vai de encontro ao que ele defende quando decisões do Supremo esbarram em matérias de caráter Legislativo. Não são incomuns manifestações do presidente do Senado afirmando a importância da separação dos poderes e criticando a intervenção de um deles em outro.
Os partidos já começaram a indicar integrantes para a comissão. Por enquanto, três nomes ligados ao segmento evangélico foram indicados para ocupar algumas das 34 vagas do colegiado: os deputados Antônio Jacomé (PTN-RN), Pastor Eurico (PHS-PE) e Eros Biondini (PROS-MG). A bancada evangélica na Câmara tem 93 integrantes.
"A comissão especial é a primeira de uma série de medidas que a Câmara vai dar a esta decisão esdrúxula do STF, que tenta usurpar competências", disse Sóstenes Cavalcante (DEM-RJ). Membro da bancada evangélica, ele deve ser indicado para integrar o colegiado.
Na próxima quarta (7), o STF vai julgar ação direta de inconstitucionalidade e decidir sobre a legalidade do aborto nos casos em que a gestante contraiu zika na gravidez –o vírus pode causar microcefalia e outros tipos de má-formação em recém-nascidos.