Folha de S. Paulo


Doria quer fatiar Anhembi em três partes para acelerar privatização

Joel Silva/Folhapress
SAO PAULO,SP, BRASIL- 06-10-2016 :*** ESPECIAL DOMINGO*** Vista do Sambodromo do Anhembi. Especial de domingo sobre a privatizacao do parque pelo candidato eleito Joao Doria.. ( Foto: Joel Silva/ Folhapress ) ***COTIDIANO *** ( ***EXCLUSIVO FOLHA***)
Vista do Sambódromo do Anhembi

O prefeito eleito João Doria (PSDB) quer fatiar a privatização do Anhembi em três partes para tentar acelerar a venda do complexo da zona norte de São Paulo ainda no primeiro ano de mandato.

A Folha apurou que a proposta deve contemplar três editais de licitação que podem ter diferentes interessados: um para explorar as feiras (de atividades variadas, como dos setores têxtil, de calçados e automotivo), outro para as convenções (com auditórios e tradicional uso em formaturas) e um terceiro para a área do sambódromo.

A equipe de Doria calcula arrecadar ao menos R$ 7 bilhões com a soma do três partes do complexo e do terreno do autódromo de Interlagos, na zona sul da cidade.

O processo de venda do Anhembi foi definido como a primeira prioridade da futura Secretaria de Desestatização e Parcerias, criada pelo tucano e que estará sob a responsabilidade do engenheiro Wilson Poit, que trabalhou para a gestão do prefeito Fernando Haddad (PT) por dois anos e cinco meses.

Pela expectativa da futura gestão, as instalações do Anhembi estarão sob controle da iniciativa privada até dezembro de 2017 -mesmo prazo previsto para a concessão do parque Ibirapuera.

Especialistas ouvidos pela Folha avaliam que, por um lado, a estratégia do tucano pode ser atrativa ao mercado, mas que há risco de a prefeitura ficar com algum "mico" -por falta de interesse privado em alguma das três partes que estarão fatiadas.

CARACTERÍSTICAS

A área de feiras do Anhembi já foi bastante cobiçada, sendo inclusive a casa do salão do automóvel por 46 anos. O evento em 2016 migrou para a São Paulo Expo (zona sul).

A exploração do sambódromo, por outro lado, sempre esteve voltada aos desfiles de escolas de samba -e, nos últimos anos, a shows. Mas a gestão Doria quer exigir na licitação que a empresa que assumir essa parte tenha que ceder a área de graça à prefeitura no Carnaval.

Os editais vão amarrar a venda à manutenção das características das áreas.

Doria e concessões

O comprador do sambódromo, por exemplo, não poderá destruir a infraestrutura existente para construir prédios no lugar dos equipamentos de lazer e cultura.

Mas não está descartada a implantação de novos empreendimentos no terreno. Segundo a análise da gestão tucana, a área poderia comportar mais um hotel, além de edifícios comerciais.

Essas condições são consideradas essenciais pelo setor privado para que os editais tenham interessados.

A equipe de Doria também pretende incentivar a construção de um monotrilho do estacionamento do Anhembi até a estação Tietê do metrô -num modelo semelhante ao trem que funciona do aeroporto de Porto Alegre até uma estação das proximidades.

ARENA

A proposta de exploração do Anhembi pela iniciativa privada já havia sido lançada pela gestão Haddad, mas de uma maneira mais tímida.

Em vez da venda do complexo planejada por Doria, a administração petista planejou uma PPP (parceria público privada), pela qual alguma empresa teria a concessão temporária do espaço.

Haddad também lançou um edital para a construção de uma arena multiuso no Anhembi em parte do local usado como concentração pelas escolas de samba, antes dos desfiles carnavalescos.

O local será planejado para receber shows de até 20 mil pessoas, ou eventos esportivos, como partidas de tênis, basquetes e lutas de MMA.

A ideia é que a empresa interessada construa a arena num prazo de até três anos em troca da exploração de eventos por 30 anos. A prefeitura vai ganhar ainda um aluguel pela cessão do terreno.

Caso essa concessão não seja finalizada por Haddad até dezembro, deverá ter continuidade em 2017 por Doria.

MICO

O interesse do setor privado na privatização do Anhembi vai depender do valor estipulado pela prefeitura para quem quiser comprar as instalações.

E um dos desafios será evitar que a parte do sambódromo se torne um "mico", avaliam especialistas.

O futuro dono da área deverá cedê-la à prefeitura de graça durante os desfiles de Carnaval. O lucro terá que ser obtido pelo comprador no resto do ano.

"Se a prefeitura pretende fazer da venda uma fonte de renda, não vai funcionar. O objetivo precisa ser praticamente parar de pagar as despesas mensais de manutenção. Caso contrário, não terá mercado", diz Carlos Ari Sundfeld, professor da FGV Direito SP.

Jorge Araújo/Folhapress
Preparativos dos carros alegóricos no sambódromo do Anhembi, zona norte, para o primeiro dia de desfiles do Carnaval de São Paulo
Preparativos para o Carnaval de São Paulo no Anhembi em 2016

O especialista é a favor da divisão do Anhembi em três partes para agilizar na venda. Mas ressalta que os interessados no sambódromo precisariam investir em infraestrutura para receber outros tipos de show.

"É bom lembrar que concessões de estádios de futebol para a Copa do Mundo não deram certo. São áreas muito grandes que continuam sendo sustentadas com dinheiro público", afirma Sundfeld.

O advogado Bruno Werneck, sócio do escritório Mattos Filho, avalia que tudo depende da compatibilidade do preço de venda.

"Não tem o Carnaval, mas tem todo o resto do ano. A pergunta que vale é: quanto o setor privado está disposto a pagar?"

A viabilidade econômica é a palavra que vai definir eventual sucesso ou fracasso das privatizações da gestão tucana, na avaliação do advogado Fabrício Dantas, sócio do Vinhas e Redenschi. "A falta de segurança jurídica e regulatória também podem afastar investimentos."

Tanto no caso do Anhembi como no de outras privatizações previstas, incluindo a do autódromo de Interlagos, uma quantidade grande de exigências tende a inviabilizar os negócios, afirma Sundfeld, da FGV/SP.

Ele também é cético em relação à concessão do estádio do Pacaembu. "O futebol ali não vai dar renda ao privado", diz. Segundo Doria, a concessão do estádio terá que preservar a realização de jogos de futebol no campo.


Endereço da página:

Links no texto: