Folha de S. Paulo


Rebeliões deixam ao menos 18 mortos em presídios no Norte

Rodrigo Sales/FolhaBv
17.10.2016 Roraima Penitenciaria Agrícola do Monte Cristo (PAMC)Parentes estao na entrada da penitenciaria em busca de noticias dos presos. Foto: Rodrigo Sales/ FOLHABV ***DIREITOS RESERVADOS. NÃO PUBLICAR SEM AUTORIZAÇÃO DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS E DE IMAGEM***
Parentes na entrada da Penitenciária Agrícola do Monte Cristo (PAMC) em busca de notícias dos presos

Ao menos 18 pessoas morreram em dois confrontos envolvendo facções criminosas dentro de presídios no Norte do país.

A primeira rebelião aconteceu na tarde deste domingo (16) na Penitenciária Agrícola de Monte Cristo, na zona rural de Boa Vista (RR), onde dez detentos morreram. A segunda foi na madrugada desta segunda (17) na Penitenciária Ênio dos Santos Pinheiro, em Porto Velho (RO), onde oitos presos morreram asfixiados.

De acordo com governo de Roraima, entre os dez presos que morreram está o que é apontado como líder do Comando Vermelho no Estado, Valdenei de Alencar, conhecido como "vida loka".

Todos os detentos mortos têm idade máxima de até 30 anos –setes corpos foram empilhados e queimados, o que dificultou o trabalho da perícia para a identificação dos presos. Outros dois presos foram decapitados. Um homem foi morto por perfurações e pauladas. O governo de Roraima afirmou que todos os detentos mortos pertenciam ao Comando Vermelho.

O secretário de Justiça e Cidadania, Uziel Castro, afirmou que detentos da ala 14 quebraram os cadeados da ala e invadiram a ala 12 e que também tentaram invadir a carceragem do presídio, mas foram impedidos.

Segundo Castro, o setor de inteligência da pasta interceptou um áudio que seria de membros do PCC nacional, há 90 dias, avisando que iria iniciar a "guerra" e ordenando o extermínio dos membros da facção do Comando Vermelho. As mortes em Roraima seriam "um cumprimento" da determinação.

O secretário não detalhou a justificativa de as mortes terem ocorrido três meses depois da "ordem" nacional contida no áudio.

A rebelião ocorreu no horário de visitas quando, segundo a Polícia Militar, cerca de 50 familiares estavam no local e foram feitos reféns. Após negociação, todos foram liberados sem ferimentos.

Cerca de 80 homens do Bope (Batalhão de Operações Especiais) foram ao presídio e controlaram a rebelião. Os presos foram encaminhados para as alas e foram trancados. Equipes do IML (Instituto Médico Legal) estiveram no local para realizar a perícia e identificar os corpos.

Durante a manhã desta segunda (17), cerca de 30 familiares dos detentos aguardavam em frente à penitenciária informações e a lista oficial com os nomes dos mortos.

Muitos dos parentes estavam dentro do presídio no momento da rebelião. Alguns contestam ser apenas dez mortos. "Eles querem que a gente saia daqui pra tirar os mortos", disse uma das testemunhas, que pediu anonimato.

"Eu vi quando eles (presos) invadiram a ala com pedras, pedaços de pau e facões. Abracei meu filho para protegê-lo e fui furado na mão", disse o pai de um detento que não quis se identificar.

Segundo ele, os visitantes não ficaram no local porque quiseram. "No desespero, muitas pessoas derrubaram uma parede pra poder sair da ala. Os policiais deixaram acontecer, foram irresponsáveis e omissos. Saímos por conta própria".

Segundo o governo de Roraima, dos 1.400 presos, ao menos 300 foram "batizados" pelo PCC. O Estado quer transferir 16 presos considerados de alta periculosidade.

Durante o domingo, havia 14 agentes penitenciários de plantão, com o reforço de mais 143 policiais militares. O governo informou que pretende contratar mais 300 pessoas para atuar nos presídios.

Para o sindicato dos agentes carcerários de Roraima, o número está longe do ideal. "Hoje o número de agentes não é suficiente pra dar conta do sistema prisional", disse o presidente da entidade Lindomar Sobrinho.

REBELIÃO EM RONDÔNIA

A segunda rebelião aconteceu na madrugada desta segunda-feira (17) na Penitenciária Ênio dos Santos Pinheiro, em Porto Velho (RO).

A Sejus (Secretaria de Estado de Justiça) informou que oito detentos morreram na rebelião e 22 ficaram feridos, sendo dois em estado grave, que foram encaminhados para pronto-socorro da cidade. Os demais foram atendidos na própria unidade prisional.

A rebelião aconteceu por volta da 1h no Pavilhão B do presídio quando um grupo ligado ao Comando Vermelho entrou em confronto com outra facção. O secretário da Sejus, Marcos Rocha, afirmou que de 30 a 40 presos envolvidos na rebelião foram transferidos para outras unidades e perderem o direito ao regime semiaberto.

REFORMA DO SISTEMA PRISIONAL

O ministro das Relações Exteriores, José Serra, disse que a solução para a violência e as violações de direitos humanos nos presídios passa por uma reforma do sistema prisional.

Questionado por jornalistas, nesta segunda-feira (17), na Índia, o ministro disse que não tinha conhecimento sobre as mortes no presídio de Roraima, mas disse que "esse é um problema grave no Brasil, que vem de décadas".

"É difícil imaginar resolver no curto prazo, porque implica reforma do sistema prisional e construção de presídios e custeio para manter presídios, que é altíssimo", afirmou o chanceler.

Colaborou ISABEL FLECK, Enviada Especial a Goa (Índia)


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