Folha de S. Paulo


Jovens recorrem aos 'Felipes do RG' para ter falsificações em São Paulo

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"Fiz com o famoso 'Felipe do RG'. Ele faz para metade de São Paulo", diz Fernanda, 17. O "Felipe do RG" é como são conhecidas há pelo menos três anos nas escolas de classe média da cidade as pessoas que vendem documentos falsos. Data de nascimento, nome e até número do RG e do CPF são modificados.

À Folha, o rapaz que fez as falsificações encomendadas não se identificou como "Felipe", mas disse que ali havia "pelo menos três Felipes". "Aqui todo mundo é Felipe", afirmou. Alguns jovens dizem que o vendedor chega a encontrá-los perto da escola para entregar as falsificações.

Em condição de anonimato, a Folha falou com sete jovens, de escolas como Gracinha –no caso de Fernanda–, Bandeirantes, Vértice, Santa Cruz e Porto Seguro, que compraram documentos falsos por meio do esquema em frente ao Poupatempo da praça da Sé. Todos os nomes citados nesta reportagem foram modificados.

"Fiz quando tinha 16. Todos os meus amigos tinham, sempre saíam e eu nunca podia. Resolvi fazer escondido dos meus pais", conta Amanda, que completa 18 no mês que vem. Ela estudou no Porto Seguro e agora está na faculdade. "Falei com um tal de 'Felipe' e ele fez para mim. Fui buscar perto de uma saída do metrô." Pagou R$ 200.

Ela diz que estava no segundo ano do Ensino Médio e que sempre havia festas para arrecadar dinheiro para a formatura. "Nessas festas, teoricamente só maior de idade podia entrar. Mas ninguém era, né." Também frequentou baladas na Vila Madalena (zona oeste) e formaturas. "Hoje eu não uso mais porque agora acho ridículo."

No caso de Patrícia, 18, que recorreu ao esquema quando tinha 16 e estudava no Porto Seguro, o "Felipe" buscou e entregou na escola os RGs dela e de amigos. "Mudei todos os meus dados", relata. Custou R$ 250.
O RG falso comprado por Gabriela, 20, há três anos, também foi entregue perto do Santa Cruz, onde a jovem estudava. Encontrou o rapaz no shopping Villa Lobos.

'*SUPERCORRUPTO*'

Caio, 19, diz que quando era menor de idade ele mesmo "fez no paint" para poder entrar em "alguns barzinhos" em Guarulhos (Grande SP), onde mora. Mas alguns amigos, conta, compraram seu RG falso na praça da Sé, pagando em média R$ 300.

"É um esquema supercorrupto. Hoje em dia não sei se faria", diz Giovana, 18, que fez seu RG falso há dois anos. "O pessoal [das escolas] passa o contato um para o outro", diz ela, que estudou no Bandeirantes. Na época, seus amigos foram buscar o documento falso em uma estação de metrô, depois de terem ido ao local em frente ao Poupatempo para levar os documentos necessários. "O RG passava até na luz negra."

"Comprei porque queria ir para as baladas, nem era questão de bebida. Óbvio que lá dentro eu bebia, mas o principal era entrar, porque com 16 anos, na minha cabeça, quem ia para balada para maiores de idade era 'cool' e maduro", diz Lívia, 18, ex-aluna do Vértice. Ela conta que é comum alunos fazerem o documento em grupo pois fica mais barato –sempre com a "gangue lá no centro".

A falsificação de documento, assim como seu uso, é crime, punido com multa e reclusão de dois a seis anos. Caso prestem auxílio aos filhos, os pais podem ser penalizados. "Todavia, a responsabilização também ocorrerá caso os pais tenham conhecimento da prática dos crimes e não ajam de modo a impedi-los", diz a advogada criminalista Débora Pimentel.

Segundo o Subprocurador-Geral de Justiça do Ministério Público de São Paulo Mário Luiz Sarrubbo, os menores pegos com documentos falsos costumam ser advertidos seguindo o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) -a internação serve para autores de crimes com violência ou reincidentes.

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