No último domingo (2), diante do resultado das eleições, a funcionária da USP Sâmia Bomfim, 27, lembrou-se da noite em que foi expulsa da Câmara Municipal de São Paulo. Eleita vereadora pelo PSOL, ela brinca que agora entrará no Legislativo pela porta da frente.

Era 26 de junho deste ano. O vereador Ricardo Nunes (PMDB), ligado à Igreja Católica, convocou uma sessão para comemorar dois anos da retirada da discussão de gêneros no Plano Nacional da Educação. Feministas e ativistas LGBT fizeram um ato contra a homenagem.

Houve bate-boca. Ricardo Nunes mandou que os militantes fossem retirados da sala. Sâmia e seus colegas foram expulsos aos empurrões e spray de pimenta.

"Quando eu estiver na Câmara, vou lembrá-lo [sobre o episódio]", avisa Sâmia. Ricardo Nunes, que foi reeleito, não se recorda. "Nem sei quem é essa mulher", diz.

A partir de janeiro, os dois vão se encontrar em sessões da Casa. Sâmia foi eleita com 12.464 votos. Recebeu R$ 34.500 em doações para a campanha. Parte disso dela própria e de um professor da USP. Além do próprio partido, os outros dois únicos doadores são desconhecidos da militante do PSOL.

Editoria de Arte/Folhapress

A nova vereadora nasceu em Presidente Prudente, no interior do Estado. Veio para São Paulo quando passou no vestibular de letras, na USP.

Mora no último dos quatro andares de um prédio sem elevador em Pinheiros, zona oeste. Na estante, dezenas de livros: de "Irmãos Karamazov", de Dostoiévski, à biografia do guerrilheiro brasileiro Carlos Marighella. Na parede há fotos de Frida Khalo e de Vladimir Lenin.

Feminista, sindicalista, socialista: ela vive protestando. Em 2013, ocupou a reitoria da USP, onde trabalha como servidora concursada. Em junho, estava nos atos contra a alta nas tarifas do transporte.

Em 2015, organizou atos contra o projeto de lei do ex-deputado Eduardo Cunha (PMDB) que criava empecilhos para o aborto legal –em caso de mulheres vítimas de estupro. E atuou em protestos pelo Fora, Temer. "Tomei muita bomba. Geralmente a instituição é sua inimiga. De repente me vejo dentro dela [da Câmara]. Ainda estou tentando entender", afirma.

MANDATO

Nos quatro anos em que passará na Câmara, Sâmia pretende priorizar projetos ligados ao direito das mulheres. Cita: 1) criar mais abrigos e centros de referência que recebam e deem apoio para mulheres em situação de violência; 2) incentivar cooperativas de mulheres na periferia; e 3) conseguir melhorias na iluminação dos bairros.

Na campanha, ela falou em fazer com que as delegacias da mulher funcionem 24 horas por dia. Porém, a polícia é uma atribuição do governo do Estado e não tem relação com a Câmara. "Falei mais sobre usar o mandato para pressionar por essa medida", justifica.

A nova vereadora não tem carro. Diz que usará transporte público para chegar à Câmara, mas não descarta o carro oficial a que tem direito. "Você precisa visitar outros pontos da cidade", diz.

Vê a discussão sobre multas de trânsito como questão menor. "A maioria da cidade anda de transporte público."

Com apenas mais dez vereadores –nove do PT e um do PSOL–, Sâmia fará oposição a João Doria, prefeito eleito pelo PSDB. "Faremos o que for para barrar o projeto tenebroso que ele tem, de privatizações e de retrocessos em todas as áreas. Mas não temos ilusões, não será nada fácil."

Ela despeja críticas ao tucano: "Doria é um lobista. Mente sobre sua trajetória, dizendo ser trabalhador. Ele não é trabalhador, é um dos homens mais ricos do país".

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Raio-X: Sâmia Bonfim

Profissão: Servidora da USP

Carreira: Formada em letras pela USP, tornou-se funcionária concursada da universidade; participou da direção do DCE da instituição; atuou em protestos contra o aumento das tarifas e na organização de protestos contra Eduardo Cunha (PMDB)

Votos recebidos: 12.464 (55º posição)

COMPOSIÇÃO DA CÂMARA PARA 2017 - Número de vereadores eleitos por partido

COMPOSIÇÃO ATUAL DA CÂMARA - Número de vereadores eleitos por partido

ELEITOS PARA A CÂMARA EM 2012 - Número de vereadores eleitos por partido