Folha de S. Paulo


Governos rejeitam auditoria da Samarco sobre tragédia em Mariana

A União e os governos de Minas e Espírito Santo rejeitaram o modelo de auditoria para fiscalizar as ações de recuperação da área atingida pelo rompimento da barragem de Fundão, no ano passado, em Mariana (MG).

A auditoria foi contratada pela fundação Renova, criada após a tragédia que matou 19 pessoas pela Samarco e suas controladoras, a Vale e a BHP.

Os procedimentos apresentados pela auditoria, segundo o comitê formado pelos governos estaduais, não previam analisar se os programas de reparação vêm sendo feitos de maneira correta e com qualidade –restringiam-se a uma verificação contábil das medidas adotadas.

Com a reprovação, a Renova pediu à empresa de auditoria que revise a proposta. A decisão do comitê foi tomada no último dia 20, numa reunião em Brasília, quando também foi determinado que o novo documento terá que ser apresentado até o fim da primeira semana de outubro.

A auditoria independente é um dos compromissos assumidos pela Samarco no acordo assinado em março entre a mineradora, suas controladoras e os governos.

Segundo o documento, essa auditoria seria uma medida de reforço à fiscalização governamental no cumprimento dos programas que as mineradoras planejaram para recuperar a área. Além de verificar se o dinheiro tem sido aplicado corretamente, a auditoria teria que fazer "o acompanhamento e a fiscalização da qualidade dos programas" e apontar "elementos de insuficiência" neles.

No entanto, a auditoria apresentada pelas mineradoras descumpria essas cláusulas, segundo a diretora de Biodiversidade e Florestas do Ibama, Ana Alice de Marques.

"Os procedimentos não atendiam ao que estava no acordo. Não adianta só acompanhar se o dinheiro está sendo colocado nos programas, se não se acompanha a qualidade deles", diz. "A auditoria tem que ver se a metodologia usada é a melhor e se o resultado está sendo alcançado."

Procurada, a fundação Renova afirma que a empresa de auditoria contratada deixará "mais claro suas responsabilidades" no modelo.

ACORDO

O acordo feito entre as mineradoras prevê uma reparação no valor de R$ 4,4 bilhões até 2018 nos locais atingidos pelos 32 bilhões de litros de rejeito de minério. Nos anos seguintes, mais aportes continuariam a ser feitos.

A fundação Renova foi criada para gerir os programas que serão tocados com esse dinheiro. Embora o acordo não esteja validado pela Justiça, as mineradoras dizem que seus termos continuam em vigência. Caso descumpra medidas previstas na cláusula, a Samarco e suas donas podem ser punidas com multas.

No início de setembro, a empresa disse que já havia gastado R$ 655 milhões em recuperação ambiental e socioeconômica. O rompimento da barragem matou 19 pessoas há 11 meses e deixou um rastro de destruição até o litoral do ES. O Ministério Público Federal, que investiga o caso criminalmente, não ofereceu denúncia até o momento.

Na semana passada, a Samarco obteve autorização do governo de MG para construir obras que alagarão um trecho de Bento Rodrigues, povoado destruído pelos rejeitos. A intenção é evitar que mais lama polua afluentes do rio Doce durante o período chuvoso.

Em réplica, o Ministério Público de Minas Gerais entrou na Justiça com uma ação que questiona a necessidade de construção do dique.

O Caminho da Lama

REVISÃO

Procurada, a fundação Renova, criada pela Samarco, afirma que o documento que apresenta a proposta de auditoria, chamado "procedimento operacional padrão", será revisado pela empresa contratada para "deixar mais claro suas responsabilidades".

Segundo a fundação, a proposta apresentada não se restringe à auditoria contábil e contempla também os outros itens acordados, com "asseguração do cumprimento do escopo acordado e do atendimento aos critérios e indicadores definidos para avaliação das entregas acordadas".

Em nota, o órgão afirma que "há uma questão de aprofundar o que se refere à responsabilidade técnica das obras executadas e à garantia da qualidade".

"Essa garantia, por lei, é de responsabilidade do executante da obra, cabendo à auditoria assegurar que os procedimentos e controles de qualidade foram seguidos pela fundação e pelas empresas contratadas para execução dos programas", afirma.

A Renova diz que irá apresentar a nova proposta dentro do prazo determinado pelo comitê dos governos –dez dias antes da próxima reunião, prevista para acontecer nos dias 17 e 18 de outubro, em Belo Horizonte.

Sobre a construção do dique em Bento Rodrigues, a Samarco tem dito que haverá alagamento apenas de parte da área já impactada, não prejudicará estruturas históricas nem encobrirá as casas que ainda estão de pé.

Em nota divulgada após receber a autorização, a empresa disse que a decisão "foi tomada após uma ampla e profunda discussão e análises técnicas. Outros locais foram descartados sobretudo pelo caráter emergencial".


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