Folha de S. Paulo


Supremo deve definir alternativas para acesso a remédios de alto custo

O Supremo Tribunal Federal retoma nesta quarta (28) um julgamento para decidir se os Estados devem ou não fornecer medicamentos de alto custo fora da lista do SUS ou até sem registro no Brasil a pacientes que recorrem à Justiça para obtê-los.

Diante do impasse, representantes dos governos esperam que seja adotada ao menos alguma solução intermediária que possibilite a diminuição do impacto das ações nas contas públicas.

Pedro Ladeira - 27.mai.2015/Folhapress
O ministro do Supremo Tribunal Federal, Marco Aurélio Mello
O ministro do Supremo Tribunal Federal, Marco Aurélio de Mello

Já associações de pacientes pedem que a decisão não inviabilize a análise de outras ações ou bloqueie acesso aos remédios por quem não têm outra opção de tratamento. Ministros do Supremo ouvidos pela Folha consideram que esse tema é um dos mais delicados que passaram pelo plenário recentemente.

Pelos menos três magistrados defendem, em conversas reservadas e sem revelar o voto, a possibilidade de o tribunal encontrar uma saída alternativa, estabelecendo uma regra que atenue os impactos da judicialização nos cofres estaduais, sem vedar o acesso de cidadãos de baixa renda a remédios de alto custo.

Judicialização da saúde

Relator do caso, o ministro Marco Aurélio Mello adianta que vai tratar da necessidade de exigir que a família do paciente seja solidária quando possuir recursos. Na avaliação dele, quando o beneficiário tiver um parente com capacidade financeira para custear o tratamento, esse familiar pode ressarcir os Estados dos gastos com o paciente.

Ele já defendeu que o Estado forneça remédios de alto custo a pacientes carentes desde que haja registro na Anvisa (vigilância sanitária). A presidente do STF, Cármen Lúcia, também já defendeu que sejam estabelecidas diretrizes para o fornecimento de medicamentos demandados em ações judiciais.

Iniciado há duas semanas, o julgamento foi suspenso após o ministro Luís Roberto Barroso pedir vista. Ele e outros nove ministros ainda devem proferir seus votos.

AUMENTO DA JUDICIALIZAÇÃO - Condenações do Estado de SP

CASOS

Dois casos motivaram a análise. O primeiro é de uma paciente do Rio Grande do Norte com hipertensão arterial pulmonar. Em 2007, ela recorreu à Justiça para ter acesso a um medicamento de alto custo não disponível no SUS. Obrigado a custear o remédio, o Estado recorreu ao STF.

O segundo caso é de uma paciente de Minas com doença renal crônica que recorreu ao Supremo para o Estado custear o acesso a um remédio sem registro na Anvisa.

Para o procurador do Rio Grande do Sul Tanus Salim, que representou os Estados na primeira sessão de julgamento, os governos não podem ser obrigados a custear remédios de alto custo que não estão previstos no SUS.

"Senão o atendimento a poucos usuários, feito com muitos recursos, vai inviabilizar o tratamento a todos os usuários", diz. Segundo o procurador, se o pedido não for atendido, Estados esperam que haja ao menos critérios. "E aí poderia verificar vários fatores: se é o único tratamento disponível, se tem certificação quanto à segurança e comprovação de eficácia e se há possibilidade de conservação e estocagem."

AUMENTO DA JUDICIALIZAÇÃO - Número de ações por 100 mil habitantes*

Outros fatores a serem analisados, diz, seriam a possibilidade dos pacientes de custear os medicamentos e se existem recursos suficientes no orçamento dos Estados.

Dados do Ministério da Saúde mostram que, neste ano, os gastos com demandas judiciais para fornecimento de medicamentos já superam R$ 1 bilhão. Somados os gastos de Estados e municípios, a previsão é que o valor chegue a R$ 7 bilhões.

"Não se separa desses R$ 7 bilhões o que é uma 'boa' e uma 'má' judicialização. É um impacto significativo, mas está longe de ser o principal problema na saúde, que é o subfinanciamento", avalia Ramiro Sant'Ana, defensor público do DF.

Para ele, parte das demandas também ocorre por demora na incorporação de medicamentos no SUS. "Quando faz parecer que só se judicializa medicamentos caros, corre-se o risco de tomar o todo pela parte", afirma.

PACIENTES

Receio semelhante é compartilhado por associações que representam pacientes. Para Regina Próspero, do Instituto Vidas Raras, a decisão deve observar a critérios e não vedar o acesso por completo a alguns medicamentos –caso daqueles sem registro, por exemplo.

"Deve-se olhar caso a caso. Há doenças com outras opções terapêuticas. Mas há casos em que o paciente já passou por todos os tratamentos possíveis que existem no Brasil e não reagiu. Ele vai morrer porque se fechou as portas?", questiona.

O diretor-presidente da Anvisa, Jarbas Barbosa, diz temer que uma decisão favorável à oferta de medicamentos sem registro possa dar brecha para que produtos sem segurança comprovada cheguem ao país. "Se abre mão do registro, pode entrar qualquer coisa, inclusive produtos fraudulentos. É uma situação muito grave", avalia.

AUMENTO DA JUDICIALIZAÇÃO - Gastos do Ministério da Saúde com ações judiciais, em R$ bilhões*

R$ 5 bilhões foi o valor gasto por municípios, Estados e União com a judicialização em 2015

R$ 7 bilhões é quanto governos deverão gastar em 2016, segundo o ministro Ricardo Barros


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