Folha de S. Paulo


MG autoriza Samarco a fazer obra que alagará parte de vilarejo de Mariana

Alexandre Rezende/Folhapress
Mariana, MG, BRASIL, 02-12-2015, 10:30h. Imagens da comunidade de Bento Rodrigues tres semanas apôs o rompimento da barragem de rejeitos da Samarco que devastou a localidade. (Alexandre Rezende/Folhapress COTIDIANO) *** EXCLUSIVO FOLHA *** ORG XMIT: Alexandre Rezende
Bento Rodrigues semanas após o rompimento da barragem da Samarco, que devastou povoado

Um decreto assinado pelo governador de Minas Gerais, Fernando Pimentel, autorizou a Samarco a iniciar a construção de um dique que alagará parte da área de Bento Rodrigues, subdistrito de Mariana destruído pelo rompimento da barragem de Fundão.

A intenção é evitar que a lama de rejeitos que está no local volte a poluir os afluentes do rio Doce durante o período chuvoso, que começa em outubro.

Publicado no "Diário Oficial" de Minas Gerais desta terça (21), o decreto afirma que os proprietários da área deverão viabilizar a entrada da equipe técnica da Samarco e dos agentes públicos estaduais no terreno. Ainda diz que a mineradora terá que bancar a indenização dos donos da área.

"A Samarco Mineração S/A fica autorizada a promover todas as medidas necessárias à construção e implantação emergencial do dique", diz o texto.

A Samarco tem tentado comprar os terrenos para a construção do dique desde o primeiro semestre, mas alguns dos antigos moradores não queriam vendê-los por considerar a obra prejudicial à memória dos antigos moradores. O decreto atual permite o uso da área pela mineradora por três anos.

A empresa tem dito que a obra é urgente e não prejudicará estruturas históricas nem encobrirá as casas que ainda estão de pé, mas o Ministério Público de Minas Gerais e o Conselho de Patrimônio Cultural de Mariana iam de encontro à ideia e diziam que o impacto no local podia ser irrecuperável.

Em uma reunião de conciliação entre a Samarco, suas donas (Vale e a BHP Billiton), governos e Ministério Público Federal, no último dia 13, as empresas insistiram para que a juíza que acompanhava a audiência desse a autorização por meio de decisão liminar (provisória). A magistrada, no entanto, não tomou decisão.

O dique, chamado S4, seria a última de quatro estruturas provisórias que a Samarco planejou para "filtrar" a água que passa pelos terrenos próximos.

Atualmente, apenas um dos diques (o S3) funciona e pode não ser capaz de suportar as chuvas previstas. Com o S4, a empresa acredita que teria tempo de construir estruturas de contenção definitivas e evitar mais poluição.

EMERGENCIAL

A Secretaria do Meio Ambiente de Minas Gerais afirma por meio de nota que a obra foi apresentada "como uma medida emergencial para conter o carreamento de rejeitos no período chuvoso" e que, por isso, "o licenciamento é feito corretivamente após a sua implantação".

"A implantação não estava sendo viabilizada pela impossibilidade da empresa acessar áreas privadas", diz o órgão. Segundo o comunicado, a Samarco terá que apresentar os projetos de construção, implantação e operação da obra.

Ela ainda terá que monitorar a qualidade da água no local e "analisar os potenciais riscos, incluindo a apresentação de um plano de contingência e de comunicação de risco, bem como plano para retirada de rejeitos depositados no ambiente".

No entanto, em julho, a própria secretaria disse à Folha que "a construção do Dique S4 não está sendo considerada uma obra emergencial". Nessa época, a mineradora já afirmava que o dique era emergencial e o promotor Marcos Paulo Miranda rebatia. Para ele, a Samarco tinha "fabricado" a urgência de fazer o dique ao não apresentar desde o começo do ano outros meios possíveis de evitar a poluição, já que a proposta do S4 estava suspensa desde fevereiro.

OUTRO LADO

Em nota divulgada nesta quarta, a Samarco afirma que "vem buscando as aprovações necessárias ao início da obra desde fevereiro". "A decisão do governo amparou-se na urgência de reforçar o sistema de contenção de sedimentos no Complexo Minerário de Germano [onde ficava Fundão], considerando-se que o início do período chuvoso está próximo."

A mineradora diz que o decreto não desapropria os imóveis, "apenas afeta a posse". "Após a construção do dique S4, haverá o alagamento de parte da área já impactada em Bento Rodrigues. O muro de pedras existente no distrito também será preservado por uma cobertura que será feita pela empresa. A ruína da Capela São Bento e o Cemitério não serão alagados", diz a nota.

"A decisão de construir o dique S4 em Bento Rodrigues foi tomada após uma ampla e profunda discussão e análises técnicas. Outros locais foram descartados sobretudo pelo caráter emergencial", acrescenta.

O Caminho da Lama


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