Folha de S. Paulo


'Gangue da bicicleta' ataca pedestres para roubar celular no centro de SP

Questão de segundos e, antes que a vítima se dê conta, o celular que segurava enquanto lia uma mensagem já está na mão de um rapaz que agora só se vê à distância e vai sumindo, de bicicleta.

A cena e os relatos de furtos de celulares, comuns na região da av. Paulista há cinco anos e subnotificados em estatísticas policiais, agora se repetem nos bairros de Higienópolis (em especial na avenida de mesmo nome), Santa Cecília e Campos Elíseos.

Como ficaram conhecidas, as "gangues de bicicleta" agem principalmente de manhã, final de tarde e à noite.

No distrito policial da Consolação, o delegado Dimitrius Batista mostra no computador uma pasta com o nome "Bicicleta". Ali, só arquivos com suspeitos que usam bikes. E aponta para a pilha de boletins de ocorrência: "90% são por furto de celular".

Na cidade de São Paulo, os registros de furtos em geral (não só de celular) cresceram 2% de janeiro a julho deste ano em relação a 2015.

Na semana passada, Júlia, uma estudante de 13 anos de um colégio da região, postou um alerta numa rede social aos amigos que jogam Pokémon Go no meio da rua.

CRIMES EM SÃO PAULO - Furtos no 1º semestre

"Não fiquem com o celular na mão! Tem um cara que está rodando Higienópolis de bicicleta roubando o celular". Amiga da mesma idade, Natalie teve o celular roubado dessa forma também no final da avenida Higienópolis.

Na semana anterior, tinha sido o fotógrafo Paulo Cavalcanti, 45, surpreendido também por um rapaz sobre duas rodas na mesma avenida, em frente ao prédio onde vive, entre as ruas Itacolomi e Sabará, quando usava o celular para pedir um carro do Uber.

No mesmo dia, ele passou a observar a movimentação da via e diz ter visto outros dois furtos da mesma maneira. "É impressionante a quantidade de gente passando com o celular na mão. É escritório de ladrão, o cara que quiser dinheiro vem para cá."

Segundo o investigador de polícia Lívio Rocha, os autores dos crimes costumam ser menores de idade e andam em bicicletas sem muitos equipamentos, como capacetes ou lâmpadas. "Mas já perceberam que sabemos disso e começaram a se equipar."

CRIMES EM SÃO PAULO - Roubos* no 1º semestre

Alguns foram pegos usando bicicletas de aluguel —há dois pontos ao lado do Mackenzie, universidade próxima.

Batista, delegado da Consolação, diz que a identificação dos autores desse tipo de crime é difícil, porque as vítimas não conseguem ver o rosto e porque as câmeras de prédios não têm boa resolução.

Para ele, aumentou recentemente a notificação desse tipo de crime. Outro investigador ouvido pela Folha afirma que os celulares são "moeda de troca" na cracolândia, na Luz, onde se concentram usuários de crack.

Num posto de gasolina na av. Angélica, o frentista Josenildo de Lima, 40, diz ver os rapazes de bicicleta "quase todos os dias". Em certa ocasião, ele por pouco não foi vítima: "Estava ouvindo rádio enquanto trabalhava, e um tentou dar o bote, mas consegui segurar o celular".

Lima diz que os rapazes têm uma estratégia: "Primeiro passa um, observa a pessoa segurando o celular, vê se tem polícia, dá a volta e então ele ou um segundo roubam".

Sentada nos degraus do Centro Universitário Maria Antonia, semanas atrás, Sarah Ribeiro, 20, mexia no celular quando um menino de bicicleta passou e levou o telefone. "Liguei depois para o meu número, e quem atendeu disse: 'Tinha que ser roubada mesmo, quem mandou ficar com o celular na mão?'"

Assaltada perto do Mackenzie da mesma forma, a secretária Monique Guimarães Rosa, 22, mexia no celular num ponto de ônibus da avenida Angélica quando foi abordada pela Folha, às 17h de sexta (26): "Não aprendo... Mas a gente vai fazer o quê, ficar incomunicável?"

CRIMES EM SÃO PAULORegião central vive onda de furtos
Região central vive onda de furtos

GOVERNO NEGA

A Secretaria da Segurança Pública de São Paulo cita a redução dos registros em um distrito policial para afirmar que "não há onda de furtos na região de Higienópolis".

Segundo a pasta, houve "queda de 16,2% de ocorrências deste tipo" de janeiro a julho de 2016 —dados referentes à delegacia da Consolação, uma das duas que atendem vítimas na região.

Os registros de furtos no distrito de Santa Cecília mostram crescimento de 21% de janeiro a julho em relação ao mesmo período do ano passado —informações não citadas pela secretaria.

De janeiro a julho de 2016, houve 4.491 furtos registrados nessas duas delegacias —perto de 21 a cada dia.

Pedestres e policiais da região citam a ação principalmente de criminosos de bicicleta para levar celulares.

Segundo os investigadores, a dificuldade de acabar com esse tipo de crime se dá porque os autores dificilmente são reconhecidos por vítimas —que não chegam a ver seus rostos— e porque são menores de idade e praticam furtos —ou seja, não ficam muito tempo distantes da rua, uma vez apreendidos.

Também dizem que esses ciclistas compõem grupos diferentes para atacar.

AUTORES

A pasta do governo Geraldo Alckmin (PSDB) afirma ainda que "todas as ocorrências registradas na região são investigadas pela equipe do 4º Distrito Policial a fim de identificar os autores".

Para justificar a queda no registro de furtos nessa delegacia, a secretaria cita as prisões feitas na área. "O resultado é fruto do trabalho integrado das polícias. As rondas preventivas da PM, realizadas pelo 7º e 13º batalhões, realizaram 576 prisões no mesmo período", diz a nota da Secretaria da Segurança Pública.


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