Folha de S. Paulo


Pizzaiolos ambulantes se espalham por portas de estádios e praças de SP

Homem vende pizza na entrada dos estádios durante partidas de futebol

"Foi numa noite em que saiu um pedido de seis pizzas, mas o cliente não foi encontrado. Para não perder, saí vendendo na rua por R$ 10. Parei num estacionamento e quando falei o valor, compraram tudo", conta Dirceu Campos, 32, dono de uma pizzaria na Luz, centro de São Paulo.

Pronto, o plano estava claro. Só dois sabores. Muçarela e calabresa. Economiza no recheio e coloca alguém de bicicleta pelas ruas do bairro a oferecer a redonda por R$ 10.

Não demorou e ficou ainda mais claro. Ir para as ruas, sim, mas em um lugar cheio de gente. A Copa de 2014 estava chegando. Até estádio novo ia ter, gringo que só. Como ninguém pensou nisso antes?

Deu certo. Vendeu mais do que pão quente. E, claro, continuou dando depois do Mundial. Se tem uma coisa que paulistano come é pizza. Se tem um time pelo qual o paulistano torce é o Corinthians.

Simples como 1 + 1, só que melhor. Em vez de 2, deu 800 —por noite. "Fazia cem pizzas e não era suficiente. Até que um dia vendi 800 num jogo do Corinthians", diz Dirceu.

Itaquerão, Morumbi, Allianz Parque, não tem estádio que ele não tenha ido.

Para seu atual desgosto, outras pessoas tiveram a mesma ideia mais ou menos na mesma época. "Não dá pra dizer que inventei, mas nunca tinha visto por aí", afirma.

Agora ele vê. "Minha família inteira está aqui hoje nessa `batida'. Vendendo pizza", dizia à Folha, na porta do Allianz Parque, o tapeceiro Rafael Queiroz, 28, a poucos metros de Dirceu, que se esforçava para desovar suas pizzas.

`MASSA CASEIRA'

Assim como Rafael, que sai de Itaquera, na zona leste, para vender em todos os estádios da cidade, os novos vendedores a R$ 10 fazem a massa, colocam o molho, o recheio e assam em casa mesmo —o que faz com que Dirceu levante dúvidas sobre a qualidade da concorrência. "Se você visse o que aparece por aqui... Vai saber as condições em que são feitas", diz.

Já Rafael garante que as deles são limpinhas. "Comprei um forno industrial. Foi um investimento grande, mas valeu a pena", afirma.

Nem só de futebol, no entanto, vivem os pizzaiolos de R$ 10. Pelas ruas do centro, da zona leste e em locais de balada, eles estão lá.

"Meus antigos clientes hoje são meus concorrentes", diz Natanael Robert, 22, que gasta o verbo na praça Roosevelt para anunciar seu produto. "É 10, é 10 é R$ 10", se esgoela entre skatistas, atores e descolados locais.

Na praça, há ao menos outros cinco fazendo o mesmo em uma noite de terça-feira, com poucas vendas. "Antes vendia 200 por noite. Hoje, se vender 50 tá bom", conta.

O negócio pode já ter sido mais promissor, mas fato é que vendedor de pizza de R$ 10 está virando uma carreira estabelecida na Pauliceia.

Jariclénio Targino, 19, chegou este ano a São Paulo. Trocou uma cidade do interior do Nordeste pela metrópole devoradora de comidas prontas. Aqui arrumou seu primeiro emprego na área.

"Não imaginava que o povo gostava tanto. Mas não é todo dia que vende bem, porque tem muita gente nessa", diz, já vislumbrando futuros percalços com a "bolha" que se criou nesse mercado. Enquanto isso, o produto continua em alta pelas ruas da cidade.

Ah, o gosto: bem, algumas delas estão mais para uma massa de biscoito com queijo. Outras, como a de Dirceu, passam por pizza de verdade.

"É mais para comer alguma coisa rápida e barata, tá valendo", diz Bruno Ferreria, 28, eletricista, na praça Roosevelt.

"Lá em São Mateus tá cheio desses caras também", diz Guilherme Lima, 26, que ao lado de Bruno, deixou mais R$ 10 nas mãos de Jariclénio.

"Ela vem bem recheada... vem sim... pra R$ 10, né?", jura Rafael, em frente ao estádio do Palmeiras.

*

Confira as avaliações dos repórteres sobre a pizza na porta de cada estádio:

ITAQUERÃO
Se o assunto é pizza, com recheio, molho, forno à lenha, esqueça. As redondas vendidas por R$ 10 na frente de estádios, baladas e pelas ruas da cidade estão mais para uma massa com pouco molho, esparsos pedaços de calabresa, ou queijo. Agora, se o negócio é matar a fome e ser honesto, vamos lá: vale quanto custa. (EMILIO SANT'ANNA)
Avaliação: regular

ALLIANZ PARQUE
Fosse uma "Libertadores das melhores pizzas", não disputaria nunca. O molho não era maravilhoso e a massa eu faço melhor. Mas não tinha, por outro lado, ketchup e estava razoável. Resumo da ópera (ou do futebol noturno): disputaria na boa a Sul-Americana: saciou mais do que minha fome e agradou ao estilo pão-duro do momento. (LUÍS EBLAK)
Avaliação: regular

MORUMBI
Embora o preço seja atrativo, comer as "pizzas de estádio" vale apenas como experiência antropológica. O único ponto a favor dessas fatias finas como folhas de sulfite e borrachudas como chicletes é fazer com que o torcedor fique com mais raiva da comida do que de uma eventual derrota do time. (DAIGO OLIVA)
Avaliação: ruim


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