Folha de S. Paulo


São Paulo perde 'uma avenida Paulista' por dia em fios roubados

Avener Prado - 3.abr.2014/Folhapress
SAO PAULO, SP, BRASIL, 03-04-2014: Flagrante de roubo de fios durante a madrugada no centro de São Paulo. 3 pessoas roubam fios na rua Marques de Itu esquina com rua Bento Freitas, no centro de São Paulo. (Foto: Avener Prado/Folhapress, COTIDIANO) ***CORRECAO LEGENDA***EXCLUSIVO FOLHA**NAO UTILIZAR SEM AUTORIZACAO DA FOTOGRAFIA FSP***
Criminosos são flagrados roubando fios durante a madrugada no centro de São Paulo

A capital tem 2,6 km de cabos e fios de iluminação pública ou de semáforos furtados diariamente, segundo levantamento feito pela administração Fernando Haddad (PT) a pedido da reportagem do Agora. É como se, todos os dias, a cidade perdesse, em fios, toda a extensão da avenida Paulista, aproximadamente. Esses crimes causam um prejuízo de R$ 1,5 milhão por mês aos cofres municipais.

De janeiro a junho deste ano, foram 469.852 metros (quase 470 km) de fios levados, a maioria deles de iluminação pública. Essa extensão dá quase a distância, por estradas, entre São Paulo e Rio de Janeiro (cerca de 450 km).

Do total de fios furtados no semestre, 447 km são de iluminação pública e 22 km são de semáforos da CET (Companhia de Engenharia de Tráfego). A zona norte é onde mais ocorreram os crimes no semestre.

O especialista em segurança pública e privada Jorge Lordello diz que a prática, para a venda do cobre, é antiga. "É um crime em cadeia. Só existem ladrões porque há receptadores", disse Lordello. Segundo ele, assim como o roubo de objetos de ouro, o receptador derrete o cobre. "Com uma mercadoria derretida fica mais complicado comprovar o crime", disse.

CUSTO

Segundo o delegado Jan Plzak, titular da 3ª Delegacia do Patrimônio do Deic (Delegacia de Investigações sobre Crimes Patrimoniais Contra Órgãos e Serviços Públicos), o quilo do cobre em fio livre de revestimento plástico vale entre R$ 10 e R$ 15 nas fundições da cidade. De acordo com Plzak, o furto de fios é difícil de prevenir. "Não há condição de proteger cada poste e semáforo da cidade", afirmou.

O delegado disse, também, que é difícil localizar o produto do crime depois de os os fios serem descascados. "Sem o revestimento plástico é quase impossível determinar de onde veio o fio. Com revestimento, há identificação e numeração." Plzak disse que as fundições são vistoriadas quinzenalmente.

FIO COM AÇO 'DIFICULTA AÇÃO'

O Ilume, departamento de iluminação pública da gestão Fernando Haddad (PT), disse que o furto de cabos e de fios de iluminação é um problema crônico. Para desestimular os crimes, diz que começou a implantar, em 2014, um cabo chamado bimetálico (feito de aço e cobre). Segundo o Ilume, esse fio "dificulta o repasse do material furtado no mercado clandestino pois possui uma quantidade de cobre inferior" –para separar o cobre do aço é preciso fundir o fio.

A CET diz que todos os cabos foram substituídos e os semáforos foram consertados. A companhia disse registrar boletins de ocorrência nas delegacias das regiões onde ocorrem os crimes.

SEMÁFORO

O semáforo da rua dos Gusmões com a avenida Rio Branco, na Santa Ifigênia (centro), tem a fiação roubada com frequência. Na última terça-feira (19), ele foi reparado pela CET (Companhia de Engenharia de Tráfego), da gestão Fernando Haddad (PT), e nesta quinta-feira (21) já estava quebrado novamente. Acidentes estão ocorrendo no local por causa das falhas constantes.

Na segunda-feira, o motoboy Douglas Vieira, 24 anos, foi derrubado por um Honda Civic dirigido pelo comerciante Roberto Takashi, 60 anos, no cruzamento. Takashi culpa o semáforo quebrado. "Há meses esse farol está quebrado, outros acidentes aconteceram aqui", falou o comerciante.

O fiscal Isael de Souza Silva, 26 anos, trabalha há nove meses em uma loja de motos do outro lado da avenida Rio Branco, e, além do acidente de segunda-feira (18), vem testemunhando outros. "Esse farol funciona de maneira intermitente há cinco meses. Muitas vezes ele para de funcionar por vários dias seguidos. Desta vez ele já está quebrado há cinco dias", diz. "Na semana passada vi dois acidentes nesse cruzamento, ambos por causa do semáforo que não está funcionando", afirmou.

Na quinta estavam quebrados na mesma região os faróis dos cruzamentos da rua Vitória e rua General Osório com a avenida Rio Branco, também por causa dos fios furtados. A CET afirmou que o furto dos fios é frequente no local e que os consertos seriam feitos até o início da noite de quinta-feira.

TRÊS TIPOS DE LADRÕES

O delegado Jan Plzak, titular da 3ª Delegacia do Patrimônio do Deic (Delegacia de Investigações sobre Crimes Patrimoniais Contra Órgãos e Serviços Públicos), aponta três tipos de ladrões de fios. O primeiro é o usuário de drogas que rouba para sustentar seu vício ou o morador de rua ou trabalhador de baixa renda que faz isso por subsistência. "É o que mais prejuízo causa à cidade, pois rouba fiação de semáforos e postes telefônicos", diz.

O segundo pertence a quadrilhas, dispõe de equipamentos e caminhões, acesso a informações privilegiadas, locais para processar os fios e receptadores. "São nosso principal alvo. Com informações de funcionários e ex-funcionários de empresas do setor, eles sabem onde roubar sem ter problemas."

O terceiro tipo é o funcionário das empresas. "Eles cometem fraude, dando informações enganosas sobre vistorias e a quantidade reposta de material. Eles mesmos roubam os fios."


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