Folha de S. Paulo


Passageiros passam por 2° dia de transtorno no aeroporto de Congonhas

Zanone Fraissat/Folhapress
Passageiros enfrentam longas filas para embarcar no aeroporto de Congonhas, em São Paulo, pelo segundo dia seguido
Passageiros enfrentam longas filas para embarcar em Congonhas pelo segundo dia seguido

Passageiros enfrentaram filas enormes e tiveram que remarcar voos nesta terça-feira (19) em Congonhas, em São Paulo, na segunda manhã de caos no aeroporto após a mudança das normas de inspeção.

Por volta das 6h, a fila dos raios X dava três voltas no térreo, ocupando toda a área de check-in até as escadas rolantes. No andar superior, a fila seguia pelo saguão, circular, até a porta de embarque.

O corredor que liga a área de check-in e o setor de embarque, com lojas em ambos os lados, ficou lotado. O clima era tenso, com passageiros nervosos, berrando uns com os outros sobre a organização da fila. "Anda, anda! Assim a fila para", exclamava um passageiro com duas pessoas, que aceleraram o passo. Não havia funcionários organizando o fluxo nesse ponto, e era difícil encontrar o fim da fila.

No portão de embarque, uma mãe com uma criança buscava convencer o segurança a deixá-la entrar, gritando que perderia seu voo. Um funcionário, angustiado, tentava passar com um grupo de passageiros na frente, para evitar que o avião decolasse sem eles. Mas a logística era difícil e, no processo, outras pessoas se infiltraram no grupo para furar a fila.

Na segunda (18), a Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) implementou novas regras de inspeção de passageiros nos aeroportos brasileiros. As normas de segurança dos voos domésticos passaram a ser semelhantes às de viagens internacionais -a ideia, segundo o órgão, é se adequar a padrões mundiais. Logo no primeiro dia, houve filas, atrasos e correria em diferentes aeroportos do país.

O superintendente do aeroporto de Congonhas, Carlos Alberto da Silva Sousa, disse na segunda-feira que os transtornos ainda devem durar uma semana. "Vamos ter ações para voltar a ter o nível de fluidez anterior. Acredito que na próxima semana esteja normalizado."

O advogado Luiz Fernando Coimbra, 34, chegou uma hora antes do seu voo para Brasília, marcado para 6h15 desta terça-feira. Após uma longa espera, percebeu que não teria tempo para chegar até o embarque. Saiu da fila e se dirigiu ao balcão da companhia aérea. Foi orientado a remarcar seu voo para 7h45. Por volta de 6h30, Coimbra ainda aguardava na fila, com medo de não conseguir pegar o segundo voo.

"Se não der tempo de ir nesse, vou desistir. Minha reunião é 10h em Brasília", afirmou ele, que finalmente conseguiu embarcar e chegou na capital trinta minutos antes do compromisso. "Foi em cima da hora", disse.

O advogado diz que viaja pelo menos uma vez por semana e que a mudança nas regras vai ter um impacto grande na sua rotina.

"Vou perder horas de sono e de trabalho. Chegava 45 minutos antes e sempre funcionava. Agora vou marcar reuniões só de tarde, porque de manhã corro o risco de perder", diz ele.

A empresária Renata Herrera, 45, estava sentada com três filhos no saguão, enquanto o marido aguardava na fila. Os mais novos —meninos de 9 e 12 anos de idade—, dormiam deitados nas cadeiras com bichos de pelúcia e pequenos cobertores.

A família, que viajava para Porto Alegre, havia chegado a Congonhas 5h20 e tinha perdido o voo das 7h. Tiveram que remarcar para 8h40 e retornar à fila. "Ninguém te informa qual fila pegar, nada. É muito desorganizado", reclama Herrera.

AEROPORTOS

Já engenheiro Daniel Lima, 38, chegou ao aeroporto com duas horas de antecedência, como orientado pela Anac , após as mudanças nas regras. Mesmo assim, por pouco não perdeu seu voo para Uberlândia, marcado para 6h50. "Nunca corri tanto para chegar no portão de embarque", conta ele. "Outras pessoas, que estavam no raio X comigo, não conseguiram chegar", diz.

Lima disse que viaja toda a semana e que vai revisar seus hábitos. "Antes eu chegava com 1 hora e dava, tranquilo. Hoje foram duas horas e não deu certo", afirma. Ele reclamou da falta de organização no aeroporto. "Não tem sinalização, ninguém sabe para onde vai a fila, que acaba se misturando com as do check-in. Não há nenhum funcionário para informar", disse.

Próximo da escada rolante, havia seguranças apenas para controlar o fluxo na subida. Funcionários da Infraero estavam concentrados no andar de cima, já perto do portão de embarque.

Por volta das 8h15, a situação já estava normalizada. No dia anterior, as filas se formaram a partir das 4h30 e só terminaram por volta das 9h30. Os seguranças tiveram que desativar a escada rolante, o que não ocorreu nesta terça. Segundo funcionários, o pico do aeroporto costuma ser nas segundas-feiras de manhã, entre 6h e 7h.

DIREITOS

Segundo o professor da FGV Direito Rio, Gustavo Kloh, os passageiros prejudicados têm direito a remarcar o voo sem custo, além de poder pedir reembolso por gastos extras, como hospedagem e alimentação, decorrentes do atraso ou troca de horário.

"Em relação à companhia aérea, não houve prestação de serviço, então é possível pleitear sim. As pessoas estão chegando com antecedência, só que há um problema em uma atividade da Infraero", diz Kloh.

A coordenadora institucional da Proteste (Associação Brasileira de Defesa do Consumidor), Maria Inês Dolci, afirma que os passageiros podem pedir também a devolução do dinheiro, caso decidam não viajar mais. "A empresa precisa oferecer alternativas para o consumidor: se ele quer receber o reembolso ou remarcar o voo", diz.

Kloh afirma, entretanto, que os passageiros talvez não tenham direito a receber indenização por danos morais das empresas, já que o erro seria da Infraero.

"Pode haver uma minoração ou inexistência de dano moral, porque a companhia não fez nada de errado, a responsabilidade é da Infraero. Inclusive, as empresas podem ter uma demanda regressiva contra o Estado e cobrar a Infraero por seus gastos", afirma.


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