Folha de S. Paulo


Sob clima tenso, alunos fazem 1ª viagem após acidente que matou 18

Joel Silva/Folhapress
MOGI DAS CRUZES, SP BRASIL- 2016 : Estudantes emocionados se abracam dentro de onibus de estudantes na rota onde morreram 18 estudantes na ultima quinta feira. na rota Sao Sebastiao Mogi das Cruzes. Apos acidente onde morreram 18 estudantes apos acidente( Foto: Joel Silva/ Folhapress ) *** *** ( ***EXCLUSIVOOLHA***)
Estudantes se abraçam dentro de ônibus na rota em que 18 pessoas morreram em acidente

"Que cinto? Que coisa de cinto? Nunca teve. Dá vontade de ficar sem, para multar", diz um estudante de engenharia quando um ônibus da União do Litoral é parado pela Polícia Rodoviária Estadual.

São 17h50 de segunda-feira (13), dia em que os ônibus que levam os alunos de São Sebastião, litoral norte paulista, retomam o caminho de subida da serra do Mar até as faculdades de Mogi das Cruzes.

Na última quarta (8), um acidente com um dos seis veículos dessa linha de estudantes matou 18 pessoas na rodovia Mogi-Bertioga –as causas ainda estão sendo apuradas.

Acompanhada pela Folha, a primeira viagem desde então tem menos passageiros do que o habitual. Os viajantes estão tensos, não há como disfarçar.

"Ninguém quer vir", diz Dielen Laurindo, 21, aluna do primeiro ano de marketing na Universidade Brás Cubas. "Não queria vir. Só consegui dormir hoje, isso depois que tomei dois Dramins", disse.

Em sua camiseta branca, a mensagem: "Eterna Linha 12". Logo abaixo, 18 fotos.

Linha 12 era a que fazia o ônibus que tombou. As 18 fotos são de cada uma das vítimas, incluindo o motorista.

Nesta segunda, os ônibus da União do Litoral foram parados em blitz feita pela polícia, que verificou documentação e condições dos pneus.

Na viagem, que pinga de bairro em bairro de São Sebastião antes de pegar a serra, a tensão pode ser sentida. Poucos falam, alguns risos nervosos, um único assunto: os que se foram na tragédia.

O medo, no entanto, não é exclusividade de quem senta nessas poltronas. Eduardo Nascimento, 61, é um entre os tantos que só vão dormir quando virem seus filhos de volta. Já era assim, agora ficou pior. Seus dois filhos, gêmeos, estão no ônibus: Jonatas e Wesley, 21. "A gente não tem o que fazer. Quem quer estudar tem que subir todo dia", diz o primeiro. "Na mão, fica o coração", afirma o pai.

MUDANÇAS

O trajeto é o mesmo de todos os dias, mas algumas coisas já estão diferentes. Dois dos seis ônibus que levam os alunos foram trocados nesta segunda. São mais novos, confortáveis e, principalmente, "têm cinto de segurança", diz Matheus Menezes, 18, aluno de engenharia civil.

O antigo, dizem os alunos, rodava há mais de 20 anos. "Não tinha cinto em todos os lugares, alguns bancos deitavam porque estavam quebrados", diz Dielen. Nesta segunda, todos foram orientados pelo motorista a colocar o cinto assim que embarcaram.

"Isso, infelizmente, não vai durar", declara Gicelma Vale Silva, 33, diarista e aluna do segundo semestre de direito. "Esse ônibus, novo, com cinto, é uma ilusão", afirma.

Ela não reconheceu o ônibus. Por instantes, ficou parada encarando o letreiro, até se convencer. Quando finalmente subiu, chorava. Cumprimentou um a um antes de desabar em sua poltrona.

E quando passar no local do acidente? "Estarei de olhos fechados, pensando em todo mundo que morreu. Acho que não consigo olhar, nem falar nada", diz a diarista.

Às 18h22, após ser parado pela polícia e seguir viagem, uma voz corta o silêncio.

"Foi aqui", aponta Diogo Garda, 29, aluno do último ano de engenharia.

A esta altura quase todos tentam enxergar alguma coisa no km 84. É impossível, o breu esconde o local do acidente. "Sim, foi aqui."

As vítimas eram amigos de todos nesse ônibus. "Conhecia todos eles. Desde antes da faculdade. Oito eram [do bairro] de Barra do Una", lembra Francisco Araújo, 20. Diogo está sentado, quieto. Gicelma não diz uma palavra.

No início da noite, alunos da UMC e da UBC fizeram um ato em homenagem aos colegas mortos na última semana. Assim que todos os ônibus da União Litoral chegaram, um grupo com cerca de 150 pessoas se reuniu na entrada do campus da UMC. Segurando velas, eles rezaram por cerca de meia hora. Muitos deixaram o local chorando.

A universidade informou que colocou a Clínica de Psicologia à disposição de familiares das vítimas, feridos e alunos que perderam seus amigos.

A missa de Sétimo Dia será realizado na quarta-feira (15).

ITENS DE SEGURANÇA

Procurada, a empresa declarou que todos os ônibus contam "rigorosamente com os itens de segurança" e que os motoristas sempre pediram aos passageiros para que usassem os cintos.

"Isso é estipulado por lei e a empresa segue a lei corretamente", afirmou, em nota.

A empresa diz ainda que todos os ônibus passam por "manutenções preventivas e corretivas", todas em dia.


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