Folha de S. Paulo


Arqueólogo cria museu com 90 mil peças em 'palácio islâmico' no Rio

Quando sua coleção de 90 mil artefatos adquiridos, coletados ou doados não coube mais em casa, o arqueólogo Claudio Prado de Mello, 51, achou uma saída incomum para preservá-la: construiu uma espécie de palácio islâmico de 2.500 m² e colocou tudo lá dentro.

Tão improvável quanto a arquitetura foi a localização escolhida –Anchieta, bairro pobre da zona norte do Rio, próximo ao violento complexo de favelas do Chapadão e distante de roteiros culturais.

"Eu herdei dois terrenos, por isso decidi construir ali. E busquei na arquitetura islâmica uma forma de chamar a atenção das pessoas", diz Mello, mestre em arqueologia pela UFF (Universidade Federal Fluminense).

As colunas, arcos e cúpulas do Museu da Humanidade ganharam forma em 14 anos de obras –o local passou a receber visitas de grupos e escolas em 2009. Dentro, o piso é de mosaicos de mármore e as paredes trazem inscrições em árabe thuluth. O lugar vale R$ 2 milhões, de acordo com o idealizador.

Segundo Mello, o palácio foi construído com dinheiro próprio, fruto do trabalho em escavações, cursos e palestras. Ele comandou, por exemplo, a equipe de escavação arqueológica das obras do metrô de Ipanema e do Leblon, na zona sul do Rio.

"Há diferentes apaixonados por história. O saudosista gosta de lembrar o passado. O colecionador precisa ter posse das peças. O preservacionista é preocupado com o patrimônio em geral. Eu sou todos eles em um só", diz.

A coleção abrange peças desde a Antiguidade até o século 19. São milhares de moedas, frascos, roupas, móveis. De um vaso grego do século 3º a.C. a um sacrário jesuítico espanhol de 1620.

Para aumentar a coleção, Mello procura em sites de leilão –foi assim que comprou por R$ 1.000 uma das 50 réplicas da lâmpada original de Thomas Edison, de uma edição especial de 1929.

O arqueólogo também conserva as notas fiscais, registros de importação e atestados de autenticidade para comprovar a origem e o pagamento de impostos das peças.

Além dos itens de sua coleção, o palácio armazena artefatos públicos por meio do Ipharj (Instituto de Pesquisa Histórica e Arqueológica do Rio de Janeiro), organização privada fundada por Mello.

Com ajuda financeira do governo do Rio, o instituto mantém 1.400 peças das escavações das obras do metrô do Rio, incluindo um penico e uma escarradeira do século 19, além de azulejos e moedas do 2º Reinado (1840-1889).

Como as peças são patrimônio público, o palácio quase preciso uma fortaleza para recebê-las. Foram instaladas 40 câmeras de segurança, sensores infravermelhos e 90 extintores de incêndio.

A sala que guarda esses itens tem ainda equipamento para controle de temperatura e umidade, para a conservação dos artefatos. Mello espera abrir sete salas para visitas sem agendamento no fim do ano e busca doações para as demais.


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