Folha de S. Paulo


Plano de Alckmin para construção de moradia no centro de SP falha

Quatro anos depois do lançamento, uma parceria entre o governo do Estado de São Paulo e a iniciativa privada para a construção de 20 mil moradias no centro da capital paulista ainda não entregou nenhuma casa.

Quando foi anunciada por Geraldo Alckmin (PSDB), em 16 de abril de 2012, a PPP (Parceria Público-Privada) da habitação previa "revitalizar o centro" e diminuir o deficit habitacional da cidade –hoje estimado em 230 mil casas.

Era o primeiro acordo com a iniciativa privada no ramo de moradia social no país. Em seu discurso naquele dia, Alckmin estipulou um prazo de 120 dias para que as construtoras apresentassem projetos e estimou que as obras começariam em 2013.

Em fevereiro daquele ano, o governador se reuniu com o prefeito Fernando Haddad (PT) para anunciar um convênio. Foi um dos primeiros encontros públicos entre o tucano e o petista, numa cerimônia na Sala São Paulo.

A prefeitura ficou responsável por ceder parte dos terrenos para as obras e pelo financiamento de R$ 20 mil para cada apartamento.

A maioria das casas seria destinada a famílias com renda de um a cinco salários mínimos. Algum membro da família deveria trabalhar na região central. Outra parte iria para trabalhadores com renda de seis a dez salários.

Luiz Carlos Murauskas/Folhapress
Obra de 126 apartamentos no Bom Retiro, centro de SP
Obra de 126 apartamentos no Bom Retiro, centro de SP

ATRASO

A PPP não vingou como o esperado até março do ano passado, quando o primeiro contrato foi assinado. Inicialmente, as empresas não se interessaram porque não conseguiam calcular o retorno financeiro.

Esse primeiro contrato previa a construção de 3.683 unidades em áreas da Barra Funda e do Bom Retiro. A construtora devia gastar cerca de R$ 900 milhões. A gestão Alckmin, R$ 460 milhões.

Hoje, no entanto, apenas 126 apartamentos estão de fato em construção na rua São Caetano, no Bom Retiro. Os outros estão em fase de licenciamento -91 foram aprovados na semana passada.

O governo Alckmin justifica o atraso dizendo que a PPP foi uma iniciativa inédita e que, por isso, encontrou dificuldades. Também diz que as obras estão dentro do cronograma, pois os contratos só foram assinados em 2015.

A gestão Haddad afirma que a parceria só começou a vingar após a aprovação do Plano Diretor, em 2014, que marcou áreas de interesse social em terrenos do centro.

PPP habitacional

DA PERIFERIA AO CENTRO

A meta da PPP da habitação é aproximar o cidadão mais pobre do trabalho, diminuindo o tempo de deslocamento no transporte público e no trânsito. As casas também serão construídas em áreas com mais opções de serviço e emprego.

Desde a década de 1970, projetos de moradia social eram tradicionalmente levados para regiões periféricas. Assim surgiram bairros bastante populosos, distantes, e com escassa estrutura pública e de serviços, como Cidade Tiradentes e José Bonifácio (ambos no extremo leste).

Para urbanistas, há duas hipóteses que explicam essa escolha: 1) o terreno é mais barato nos extremos; 2) durante os anos, houve uma "política de expulsão" de grande parte dos trabalhadores mais pobres do centro expandido.

Habitação no centro é uma das principais reivindicações dos movimentos sociais de moradia, que hoje ocupam dezenas de prédios na região.

"Uma habitação mais bem localizada é mais cara, mas ela se paga porque você economiza em transporte e otimiza equipamentos públicos. As escolas públicas, por exemplo, estão cheias na periferia e vazias no centro", explica Caio Santo Amore, professor de arquitetura e urbanismo da USP.

SEM INTERESSE DE PARCERIA

Para os setores imobiliário e da construção, as empresas demoraram a entender as vantagens financeiras da PPP (Parceria Público-Privada) da habitação, lançada pelo governo do Estado em 2012.

"A grande dificuldade foi a indefinição sobre onde eram os terrenos", avalia Rodrigo Luna, vice-presidente do Secovi, sindicato do setor imobiliário de São Paulo.

Inicialmente, a ideia do governo era revelar apenas as dimensões do terreno e em qual bairro ele ficava, sem dar o endereço exato. Com isso, os investidores tiveram dificuldade em calcular o retorno do investimento.

Posteriormente, o governo passou a especificar onde serão as construções, o que aumentou o interesse do mercado imobiliário.

NOVO FORMATO

A PPP inverte o formato comum da habitação popular no Brasil, no qual o governo paga as construtoras durante a obra e depois cobra em prestações dos moradores beneficiados.

No novo modelo, o governo paga para as empresas somente após a entrega dos apartamentos, ao subsidiar parte das mensalidades dos moradores.

As empresas também lucram com a venda de parte dos apartamentos no mercado chamado popular –famílias com renda de seis a dez salários– e com o aluguel de lojas no térreo, por exemplo.

Para o governo Alckmin, as PPPs são uma forma de construir moradias sem comprometer o orçamento.

A gestão aposta em outras parcerias como essa na cidade. Uma delas, ainda em estudo, fica em um grande terreno do Estado próximo à Marginal Tietê, na zona leste, que hoje é ocupado por uma comunidade com mais de 5.000 moradores.

O uso de PPPs para habitação social é celebrado por empresários como uma alternativa à diminuição dos repasses do Minha Casa, Minha Vida –programa de habitação social governo federal. No entanto, há ressalvas.

"Para atrair mais empresas, como as de pequeno e médio porte, os contratos poderiam abranger lotes menores", diz Ronaldo Cury, vice-presidente do Sinduscon-SP, que reúne as construtoras.

"Mesmo com a crise, conseguimos fazer grandes contratos, pois o impacto virá de 2017 em diante", diz Rodrigo Garcia, secretário estadual de Habitação. "Recebo a obra à vista e pago a prazo".

OUTRO LADO

O governo do Estado de SP afirma que as obras estão dentro do prazo, pois o primeiro contrato, que prevê 3.683 moradias, foi assinado em março de 2015. Depois da assinatura, o início das construções foi atrasado pela demora no licenciamento ambiental.

A previsão do governo é entregar as primeiras 126 casas em novembro, e outras 91 em Campos Elísios, em maio de 2017. Em novembro começam as obras de 1.200 no terreno da antiga rodoviária em frente à estação Júlio Prestes.

Outro lote, com 7.000 moradias em áreas do metrô próximas à avenida Radial Leste, deve ter as obras contratadas no segundo semestre.

A Prefeitura de São Paulo afirma que cedeu quatro terrenos para obras da PPP. O prefeito Fernando Haddad (PT) já afirmou que a parceria só saiu do papel após a aprovação do Plano Diretor, em 2014, que criou áreas de interesse social no centro.

Também afirma que um lei de financiamento habitacional precisou ser aprovada na Câmara para que a prefeitura pudesse participar da PPP.


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