Folha de S. Paulo


Para evitar filas e risco de gripe, pais contratam pediatras por aplicativos

Com prontos-socorros e consultórios lotados por causa do surto de gripe H1N1, uma nova forma de assistência médica ganha força entre os pais de crianças pequenas: o pediatra em casa.

Plataformas digitais, como a Dr.Vem e a Dokter, utilizam um modelo parecido com o do Uber: a pessoa se cadastra, aponta sua localização pelo celular e chama o profissional.

O aplicativo então aciona o pediatra mais próximo para o atendimento. O médico telefona para a família e faz uma triagem para saber o estado geral da criança. Se for uma emergência, orienta os pais a levarem ao hospital.

Se o caso for considerado de baixa complexidade (gripe comum, uma otite ou outra virose, por exemplo), a consulta domiciliar é agendada para uma hora depois, em média. Em São Paulo, o custo da primeira consulta é de R$ 197. Em Brasília, varia de R$ 300 a R$ 400, dependendo do horário.

"Está difícil ir a um pronto-socorro de pediatria e não ficar quatro horas esperando. A ideia [com o aplicativo] é esperar pouco por uma consulta que demande o tempo necessário", afirma o cirurgião Marco Antonio Venturini, criador do aplicativo Dokter.

Moradora de São Paulo, a contadora Elisabeth Kessper, 41, mãe de Pietro, de um ano e dez meses, usou pela primeira vez o serviço há duas semanas, após se deparar com o pronto-socorro lotado.

"Meu filho estava com dor de garganta e vomitava muito. O pediatra dele estava viajando. Fui até o PS, mas a previsão era de três horas de espera e fiquei com medo de ele sair de lá ainda pior", diz.

Segundo ela, a médica examinou o menino "dos pés à cabeça" e, ao final de quase uma hora de atendimento, receitou um antitérmico e um medicamento para conter o vômito. Ela conseguiu que o plano de saúde reembolsasse o valor do consulta.

A pediatra Fernanda Trolezi, da plataforma Dr. Vem, afirma que 80% dos casos são de baixa complexidade e podem ser resolvidos no atendimento em casa (ou no consultório médico).

"No PS, você acaba tendo contato com outros tipos de doença, sem contar o próprio H1N1. Você pode estar com qualquer tipo de gripe e sair de lá com H1N1", explica.

Ela diz que outra vantagem do atendimento em casa é que a criança fica menos estressada. "A gente consegue examiná-la melhor, sem choro. Alguns até dizem: 'Quando você volta, tia?' A situação é muito diferente daquela que a gente vê num hospital ou consultório."

No final da consulta domiciliar, o médico gera um relatório que é compartilhado com o pediatra da criança.

Segundo o economista Daniel Lindenberg, co-fundador da Dr.Vem, o perfil dos médicos que atuam na plataforma é de jovens entre 28 e 35 anos que já têm uma experiência prática (em hospitais pediátricos, por exemplo), mas que ainda não dispõem de consultórios privados.

"É um profissional em fase de transição, que procura uma maior qualidade de atendimento do que aquela dispensada nos prontos-socorros. Mas também temos pediatras com horas livres no consultório que têm interesse em atuar na plataforma."

Atualmente, a Dr.Vem conta com 50 pediatras no corpo clínico e se prepara apara oferecer também clínicos gerais e geriatras. Atua somente em São Paulo (capital). A Dokter tem 40 pediatras e 20 clínicos gerais e pediatras para o atendimento de adultos.

Por questões de mercado, as empresas não abrem o número de atendimentos, mas dizem que, desde fevereiro, a procura pelo serviço triplicou, especialmente em razão do surto de H1N1.

ACOMPANHAMENTO

Bráulio Luna Filho, secretário do Cremesp (Conselho Regional de Medicina), diz que, até o momento, não houve questionamentos ou reclamações à entidade sobre os serviços de médico em casa.

Ele afirma que, desde que o médico faça um bom atendimento e obedeça os preceitos éticos, não vê problema na expansão dessa modalidade de atendimento.

Tanto a Dr.Vem quanto a Dokter informam que fazem checagem sobre a vida profissional de cada médico (verificam se tem processo no Cremesp, por exemplo) que atende por meio da plataforma.

Para o clínico geral Gustavo Gusso, professor da USP, o atendimento por meio de aplicativos é uma tendência, mas o problema é que o cuidado médico "fica solto".

"A medicina tem que trabalhar em rede. Como se pode ter certeza de que o caso é de baixa complexidade? E se complica, quem se responsabiliza, quem acompanha o paciente?", questiona.

H1N1


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