Folha de S. Paulo


Represas de SP iniciam período seco com 20% abaixo da média histórica

Apesar da recente melhora do nível dos reservatórios, a Grande SP entra na estação seca (de abril a setembro) com suas represas 20% abaixo da média para a época. Neste momento, o volume de água armazenado nos mananciais é de 1,2 trilhão de litros, mais que o dobro da quantidade que os reservatórios tinham no início da última estação chuvosa, em outubro passado (589 bilhões).

Essa quantidade armazenada deve ser suficiente para que a metrópole ultrapasse os próximos seis meses sem problemas de abastecimento. O volume atual, mesmo abaixo da média, também é melhor do que o registrado no mesmo período do ano passado. Naquele momento, os reservatórios da região metropolitana estavam 60% abaixo da média histórica.

As represas mais baixas continuam sendo as do Cantareira e do Alto Tietê. Os dois são os maiores reservatórios de água da Grande São Paulo. O Cantareira, que atende cerca de 5 milhões de pessoas, entra na estação seca com 22% de volume armazenado abaixo da média. O Alto Tietê, com 26%. Os outros quatro principais reservatórios, no entanto, têm água reservada de 2% a 15% acima da média.

No início do mês passado, em entrevista, o governador Geraldo Alckmin (PSDB) "decretou" o fim da crise hídrica, agravada no início de 2014 e que deixou todas as regiões da cidade sob racionamento. A chuva ao longo dos últimos seis meses no Cantareira ficou 7% acima da média. Mas a entrada de água nas represas pelos rios segue 12% abaixo da média no período.

Segundo o climatologista do Instituto Nacional de Climatologia, Paulo Nobre, em geral a região Sudeste teve chuvas mais volumosas no último verão, mas é difícil saber se esse padrão perdurará pelos próximos meses. De qualquer forma, a expectativa é de redução de chuvas, já que agora tem início a temporada seca do ano.

Nobre aponta que a tendência é que, nos próximos anos, sejam cada vez mais frequentes os anos com climas extremos. "Nós tivemos dois verões muito secos [2014 e 2015]. Eles podem ser sucedidos por dois verões muito chuvosos. Essa condição de climas extremos é o mais provável de continuarmos experimentando [nos próximos anos]."

Segundo a Sabesp, a estatal paulista de água e saneamento, diferentemente do início da temporada seca dos últimos dois anos, desta vez há maior controle do sistema de tratamento e distribuição. Tal fato possibilita, por exemplo, por meio de um novo sistema de adutoras, transferir água da represa do Rio Grande (que abastece o ABC paulista) para o Alto Tietê (que atende a porção leste).

Outra ação, porém, tem impacto maior sobre a população: a redução de pressão da água nos canos. A medida evita vazamentos e economiza água, mas deixa moradores de bairros mais altos e da periferia sem água em períodos da noite e da madrugada.

TORNEIRA SECA

A auxiliar de limpeza Gabriela Carolina, 21, acorda todos os dias às 4h30 para trabalhar. Moradora da Brasilândia, na zona norte de São Paulo, ela usa a água estocada em garrafas no dia anterior para escovar os dentes. "Todo dia é assim", conta ela, mostrando os baldes e garrafas cheios de água embaixo da pia de sua casa.

A torneira seca é reflexo de uma operação de redução de pressão da água nos canos da cidade, realizada prioritariamente no período da noite. A estratégia existe desde 1997, mas foi intensificada durante a crise hídrica e virou a principal arma da Sabesp contra a seca.

No ápice da crise, em qualquer bairro da periferia era possível encontrar casas desabastecidas. Desde o início de 2016, com a melhora dos níveis das represas da Grande São Paulo, a Sabesp diz ter reduzido o rigor da manobra, o que tornou menos frequentes os exemplos de falta de água na capital. Mesmo assim, ainda é possível encontrar reclamações diárias sobre torneiras secas.

Na Vila Penteado (zona norte), Edna Ferreira, 22, guarda a garrafa de água para o caso de seu filho e sobrinhos terem sede à noite. "Se depender da torneira, não vai ter água", diz. Ela admite, porém, que o período de torneiras secas diminuiu desde o início do ano. "Antes a água acabava às 14h, agora é às 23h." No período mais intenso da crise hídrica, áreas mais altas e periféricas da cidade chegavam a ficar 20 horas diárias sem água.

O vizinho de Edna, Luciano Silva, 38, reclama: "O desconto na conta acabou, mas o racionamento não", referindo-se ao bônus da Sabesp para quem economiza água, encerrado neste mês.

Na zona leste, Luana dos Santos, 35, diz que em sua casa as torneiras ficam secas todos os dias a partir das 22h. "As minhas amigas, que moram em outros bairros, não entendem quando falo que aqui em casa a situação da água não se regularizou. Na casa delas, já não falta mais água."

Ela adianta o horário de sua janta e banho todos os dias. A lavagem da louça e até mesmo a descarga do banheiro, se usado após esse horário, tem que esperar até a manhã seguinte. Luana chegou a ser beneficiada por um programa da Sabesp de distribuição de 25 mil caixas-d'água. Mas a ação, além de atrasada durante o período mais grave da seca, esbarrou na falta de estrutura das casas da periferia.

Muitas delas não tinham laje ou área disponível para receber o reservatório. Foi o caso de Luana, que ainda não conseguiu instalar a caixa- d'água que está no quintal.

JARDINS

A rotina de falta de água atinge também áreas nobres da cidade. Adriana Siqueira, 51, é dona de um bar na alameda Franca, nos Jardins (zona oeste), e reclama de suas torneiras secas a partir da 1h. "Eu preciso da água justamente na hora que eles cortam, no período da noite".

"Quando diz na TV que a situação está normalizada, eu sei que não normalizou. Eles falam que é redução de pressão. Mas não é. É corte mesmo." Ela disse já ter ligado para a Sabesp para reclamar. "Mas me dizem que é uma política da empresa", conta.

Oficialmente, a Sabesp informa que suas operações de redução de pressão estão no mesmo padrão de antes da crise hídrica. Segundo a empresa, portanto, não há falta diária de água na capital.

Infográfico: Reservatórios da Grande SP


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