Folha de S. Paulo


Disputa entre traficantes mata três no Rio de Janeiro

Em 48 horas, três pessoas morreram e quatro ficaram feridas em disputas de traficantes pelo controle da venda de drogas em dois morros da zona norte do Rio. Entre as vítimas está o menino Ryan Gabriel, 4, atingido no peito, no domingo de Páscoa (27), por uma bala perdida.

O garoto brincava em frente à casa dos avós no morro do Cajueiro, em Madureira. O avô, Milton do Amparo, 48, disse que vizinhos conversavam na calçada no momento em que começaram os tiros.
Ferido, o menino foi levado para o hospital, mas morreu nesta segunda-feira (28).

A notícia da morte revoltou moradores do morro do Cajueiro. Cerca de 30 pessoas saíram em passeata pelo bairro. As principais ruas foram interditadas pela polícia, e o comércio fechou.

Outro grupo, integrado também por menores de idade, depredou duas estações de BRT (corredor exclusivo de ônibus) e incendiou uma delas e dois ônibus, fazendo o transporte deixar de circular.

Até o Mercadão de Madureira, centro de vendas popular de frequência diária média de 80 mil pessoas, fechou.

"A gente fica preocupada com os filhos que estão vindo do trabalho e está tudo fechado. Está cheio de criança na escola municipal ainda, porque os pais não conseguem ir buscar", disse a auxiliar de produção Ana Paula Souza, 55, moradora de Madureira.

Divulgação
Cartazes da ONG Rio de Paz mostra lista de crianças mortas por bala perdida no Rio, entre elas, Ryan
Cartazes da ONG Rio de Paz mostra lista de crianças mortas por bala perdida no Rio, entre elas, Ryan

REVOLTA

Diante do IML (Instituto Médico Legal) no centro do Rio, Milton do Amparo, 48, aguardava o carro da funerária que levaria o corpo de seu neto Ryan Gabriel Pereira dos Santos, 4.

A mãe do menino, Tayane Pereira da Silva, 20, já tinha ido para casa, segundo ele, "desesperada".

Amparo estava ao lado do neto no momento em que ele foi atingido por uma bala perdida na frente de sua casa, em Madureira (zona norte).

Ao ouvir o barulho do tiro, ele puxou Ryan para protegê-lo, mas o menino já estava ferido.

"Arrancaram um pedaço de mim. Em pleno domingo da Páscoa, dia da ressurreição de Jesus... Em vez de ele estar comendo o bombonzinho dele, ele ganhou uma bala perdida", lamentou o avô.

O enterro será nesta terça-feira (29), às 14h, no cemitério de Inhaúma.

Paulo Campos/Folhapress
Milton do Amparo, 48, segura foto do neto Ryan Gabriel, 4, morto por bala perdida no Rio
Milton do Amparo, 48, segura foto do neto Ryan Gabriel, 4, morto por bala perdida no Rio

CRISE

Em crise financeira, o Estado do Rio vive momento de recrudescimento da violência e da insegurança.

O problema aumenta com o descontentamento da Polícia Militar, que recebe salários no 10º dia útil de cada mês. Cresce quando o Estado deixa de lado programas que concediam gratificação extra a policiais que fizessem os chamados "bicos oficiais".

A situação reduziu o patrulhamento na região a pouco mais de cem PMs por dia, numa área habitada por 530 mil pessoas, segundo o IBGE, divididas em 17 bairros.

Desde domingo passaram por Madureira dois "bondes" (comboios) de traficantes. Um seguiu para Cascadura, no Morro do Fubá. Deixou dois mortos e um ferido.

Outro foi para o Cajueiro. Segundo policiais do 9º BPM (Rocha Miranda), eram traficantes ligados ao Terceiro Comando invadindo a comunidade do Cajueiro, de criminosos do Comando Vermelho.

Segundo moradores, já é rotina. "É uma constante, entre quatro e cinco da tarde em Madureira está tendo tiro. Eles passam atirando, não querem saber, à luz do dia mesmo", diz um morador que pediu para não ser identificado.

Procurados, a Secretaria Estadual de Segurança e o secretário José Mariano Beltrame não se pronunciaram sobre a violência na região.


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