Folha de S. Paulo


Economia está mais dependente da água, aponta relatório da ONU

Três de cada quatro empregos de toda a força de trabalho global são dependentes da água, o que significa que a escassez hídrica e os problemas de acesso à água e ao saneamento podem limitar o crescimento econômico e criação de vagas nas próximas décadas. É o que mostra o relatório mundial das Nações Unidas sobre Desenvolvimento dos Recursos Hídricos, Água e Emprego 2016, apresentado nesta quarta (23) pela ONU.

Na prática, metade de todos os trabalhadores de todo o mundo –1,5 bilhão de pessoas– estão empregadas em oito setores muito dependentes de recursos hídricos: agricultura, silvicultura, pesca, energia, manufatura, reciclagem, construção e transporte.

Sozinha, a agricultura consome 70% dos recursos hídricos globais. Indústria e serviços abocanham outros 20% e o abastecimento humano, 10% da água doce disponível.

"Os empregos em todo o mundo são totalmente dependentes da água, e precisamos pensar em quais são os investimentos que precisam ser feitos hoje para enfrentar o cenário que teremos em 30 a 40 anos", diz Ary Mergulhão, coordenador de Ciências Naturais da Unesco, órgão da ONU para educação, ciência e cultura.

Todos os cenários trazidos pelo estudo apontam para o risco de escassez. Entre eles, a projeção da OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico), que estima que 2,3 bilhões de pessoas viverão em áreas com grave restrição hídrica até 2050.

Hoje, 1,8 bilhão de pessoas não têm acesso seguro à água com condições mínimas para o consumo humano.

Outro prognóstico do relatório mostra que o mundo enfrentará um déficit de 40% entre a procura e a disponibilidade de água em 2030, caso nenhuma ação seja tomada.

De acordo com Mergulhão, melhorias na eficiência do uso da água são fundamentais para mitigar esse déficit. "A combinação de expansão populacional, crescimento econômico e urbanização exercem pressão sobre os recursos naturais de forma geral, mas em especial sobre a água", diz.

Outro agravante são as mudanças climáticas. Para cada grau de aumento na temperatura global, aproximadamente 7% da população mundial ficará exposta à diminuição de ao menos 20% no acesso aos recursos hídricos.

EMPREGO

É a primeira vez que esse relatório, produzido todos os anos pela ONU, aborda a relação da água com a geração de empregos.

Ambos os temas estão expressos em dois dos 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS), lançados pelas Nações Unidas durante a Rio+20, em 2012, e que passaram a valer este ano.

O ODS6 prevê "garantir disponibilidade e manejo sustentável da água" e o ODS8 é sobre "crescimento econômico e trabalho decente".

De acordo com Angela Ortigara, do Programa Mundial de Avaliação de Águas da ONU, a agenda do desenvolvimento para os próximos anos permite que os dois objetivos sejam trabalhados de forma conjunta.

"O estuda aponta que há oportunidades econômicas na gestão da água. O reúso, a reciclagem, a captação de água da chuva e o investimento em saneamento tem potencial para criar novos empregos", diz ela. Segundo o relatório, só na América Latina o investimento de US$ 1 bilhão em abastecimento de água e ampliação da rede de esgotos resultaria em 100 mil novos empregos.

PILOTO

No Brasil, as estratégias de cumprimento do ODS6 estão envolvendo prefeituras e iniciativa privada em um movimento para reduzir as altas perdas na rede de distribuição de água.

A Prefeitura de Piracicaba, no interior paulista, foi a primeira a aderir a um projeto piloto de redução de perdas, que deverá ser apresentado durante o Fórum Mundial da Água, a ser realizado no Brasil em 2018.

O município, que hoje tem em média 50% de perdas na rede, quer dobrar a eficiência do sistema, de modo que as perdas não ultrapassem 25% até 2040.

"Até então, as empresas conviviam com as perdas na rede de distribuição como se fosse parte do negócio. Queremos engajar prefeituras e indústria na busca de solução para isso", diz Jorge Soto, diretor de sustentabilidade da Braskem, uma das empresas que lidera a iniciativa, fomentada pela Rede Brasileira do Pacto Global da ONU com outras empresas e ONGs.


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