Folha de S. Paulo


Análise

Lei de zoneamento espelha queda de braço entre interesses opostos

A lei de zoneamento aprovada com larga maioria de votos na Câmara dos Vereadores de São Paulo espelha a queda de braço de diversos interesses.

O fato não só era esperado como desejável: é positivo que mudanças no texto original reflitam o debate realizado por uma parcela da sociedade, que incluiu desde associações de moradores até representantes de interesses privados.

Neste sentido, as modificações são antagonistas não só entre si mas também em relação a espinha dorsal do novo Plano Diretor -que propôs um novo modelo urbanístico para São Paulo, talvez muito progressista para o senso comum.

Sua ideia geral foi mantida, mas, na maioria das vezes, as alterações representam passos para trás quando temos em mente o bem comum, e não o interesse localizado ou a manutenção de privilégios.

Assim, se o Plano Diretor cumpriu seu papel, ao avançar no que se imagina que é uma cidade mais humana e eficiente -intensificando, por exemplo, o uso misto- o zoneamento espelha a manutenção de privilégios.

Marcus Leoni/Folhapress
Cartaz em sobrado no Planalto Paulista, zona sul de São Paulo, critica mudanças da nova lei de zoneamento
Cartaz em sobrado no Planalto Paulista, zona sul de SP, critica mudanças da nova lei de zoneamento

Algumas associações de moradores de bairro estritamente residenciais, por exemplo, conseguiram modificar uma das linhas mestras do Plano Diretor, excluindo a proposta de uso misto e mantendo a homogeneidade de uso.

O fato positivo é que será mantida a qualidade ambiental destas regiões -evento que interessa à coletividade; o elemento negativo é que esses bairros continuarão a ter um só uso, que exclui a maioria da população.

GARAGENS

Outro exemplo de modificação, vista pela ótica dos interesses privados, é a inclusão de garagens e o aumento dos apartamentos nos prédios que poderão ser construídos ao longo dos eixos de transporte público.

Se desde o bonde a legislação já propunha adensar os corredores para tornar mais eficiente o investimento público em infraestrutura de transporte, a novidade era buscar atrair moradores com rendas mais baixa para o centro expandido.

As unidades pequenas e sem garagem, buscavam garantir um valor menor, e assim, supostamente, incluindo essa outra faixa da população que difere do habitual comprador de apartamentos.

O mercado pressionou, baseado em pesquisa que indicam que esse "produto" não tem interessados. Perde a cidade e ganha o mercado, que manteve-se na zona de conforto.

Contudo, a cada dia estamos mais perto de soluções impopulares e inevitáveis, como o pedágio urbano e o aumento do imposto sobre vagas de garagem. Quando isso ocorrer -e o IPTU de uma vaga custar mais do que o de um apartamento- as pesquisas desses "produtos" irão mudar –e a vitória será da coletividade.

FERNANDO SERAPIÃO é crítico de arquitetura e editor da revista "Monolito".

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