Folha de S. Paulo


Desastre em Mariana abala trajetória do presidente da Samarco

Considerado um ex-aluno brilhante da Universidade Federal de Ouro Preto, o presidente da Samarco, Ricardo Vescovi, foi escolhido neste ano paraninfo de uma turma de formandos da instituição.

Em agosto, em aula que marca a despedida dos estudantes, leu trecho de "Grande Sertão: Veredas", de João Guimarães Rosa: "O correr da vida embrulha tudo, a vida é assim: esquenta e esfria, aperta e daí afrouxa, sossega e depois desinquieta. O que ela quer da gente é coragem".

Menos de três meses após sua fala, a vida de empresário premiado se embrulhou a ponto de ele ter pedido à Justiça um habeas corpus preventivo para não ser preso por eventuais crimes ambientais da empresa que comanda.

O rompimento da barragem da mineradora em Mariana (MG) no último dia 5 deixou 11 mortos confirmados -há outros dois corpos não identificados e oito pessoas desaparecidas- e provocou um "tsunami de lama" que chegou ao litoral do ES.

Vescovi teve que depor à polícia e seu trabalho foi colocado em xeque. A Samarco foi cobrada por falta de alerta a vizinhos da barragem -sem dar as devidas explicações- e acusada de artimanhas para não ter dinheiro bloqueado na sua conta.

Nesta segunda (30), na abertura da conferência mundial do clima, a presidente Dilma engrossou os ataques: disse que a tragédia em Mariana foi consequência de uma "ação irresponsável".
estágio

Órfão de pai desde os 16 anos, Vescovi deixou Vitória em 1988, aos 18, para cursar a Escola de Minas, fundada em 1876. Dos 15 alunos que integravam a 114ª turma de engenharia metalúrgica, foi o primeiro a conseguir emprego.

Cinco dias antes da formatura, em 1993, já estava contratado pela Samarco, a mineradora da Vale e da anglo-australiana BHP Billiton na qual havia feito estágio ainda como estudante, em 1992.

"Nos meus 26 anos de universidade, ele foi, certamente, do ponto de vista técnico, um dos melhores alunos", afirma o professor Cláudio Vieira, chefe do departamento de engenharia metalúrgica e de materiais da federal.

Até pedir desculpas, em entrevista ao "Fantástico", da TV Globo, pela tragédia em Minas, Vescovi levou 17 dias.

Sérgio de Moura, funcionário desde 1984 e diretor do sindicato que representa os trabalhadores da mineradora em Mariana, diz que a imagem que ele passa é a de alguém com "visão de futuro".

Em 20 anos, foi de estagiário a presidente da Samarco. Assumiu a função em 2012, aos 41 anos, depois de ter trabalhado nas áreas de pelotização (processo de aglutinação de minérios) e marketing e de ter sido diretor de operações e sustentabilidade.

"Ele conhece profundamente as operações, do trabalho na mina até a entrega do produto no navio", diz Sérgio.

Nos últimos três anos de sua gestão, a Samarco ganhou três prêmios seguidos como a melhor mineradora do país no ranking Melhores e Maiores da revista "Exame".

Em 2012, foi agraciado com a medalha Escola de Minas, da faculdade onde se formou, e, no ano passado, foi eleito o melhor empresário do setor pela revista "Ecológica".

"Se existe uma pessoa que pode recuperar o que aconteceu ela se chama Ricardo. O governo vai sair fora. Eu já fui governo e sei", afirma Hiram Firmino, editor da publicação e ex-secretário do Meio Ambiente de Belo Horizonte.

O juiz Frederico Gonçalves, de Mariana (MG), parece discordar. Em liminar, ele comparou a Samarco ao "botequim da esquina" por não ter cumprido decisão de bloquear R$ 300 milhões para que o valor fosse empregado na reparação às vítimas.

A assessoria de imprensa da mineradora não respondeu aos pedidos de entrevista -e se negou a informar até a idade exata do executivo hoje.


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