Folha de S. Paulo


Anvisa suspende prazo da primeira etapa de rastreabilidade de remédios

A diretoria da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) decidiu nesta quinta-feira (1°) suspender o prazo para a primeira etapa do sistema de rastreabilidade de medicamentos no país, previsto para dezembro deste ano.

Conhecido como "RG dos remédios", o objetivo do sistema é controlar todo o caminho desses produtos –da indústria às distribuidoras, passando pela farmácias e ao próprio consumidor. Inicialmente, a meta era que as indústrias farmacêuticas entregassem três lotes rastreáveis de medicamentos até esta data para a realização de testes do sistema.

Entenda o rastreamento de remédios

Um ano depois, em 2016, o modelo –que prevê a impressão de um código bidimensional e um número único de identificação nas embalagens, próximos à data de fabricação e número do lote– deveria ser implementado para todos os remédios. A estimativa é que 3,9 bilhões de embalagens circulem por ano no país.

A decisão por suspender a primeira etapa de testes ocorre após pressão do setor, que reclamava dos custos diante da crise financeira e dos riscos do compartilhamento dos dados que podem ser gerados com a rastreabilidade.

O prazo final para o sistema começar a operar, previsto para 2016, no entanto, ainda está mantido.

Segundo diretores da agência, a decisão sobre rever as datas cabe ao Congresso, que analisa o tema.

Após parte do setor cogitar adiar a medida por cerca de dez anos, representantes da indústria farmacêutica, distribuidores e do varejo pedem agora que o prazo seja estendido por quatro anos e oito meses, período no qual seriam realizados testes e inseridos códigos em todos os novos medicamentos.

Para Telma Salles, da Pró-Genéricos, a medida pode dar espaço para mudanças na norma no Congresso. "Fica claro que o sistema de controle de medicamentos só será feito se for abrangente [em todo o setor]", diz.

Questionado, o presidente da Anvisa, Jarbas Barbosa, nega riscos à rastreabilidade com a suspensão dos prazos da primeira etapa. "A apresentação dos três lotes não comprova que a indústria está preparada", afirma. "Ter que apresentar os lotes sem ter uma definição clara de como seria o sistema gerava uma insegurança muito grande em todo o setor", diz o presidente do Sindusfarma, Nelson Mussolini.

CONTROLE DOS DADOS

Além da suspensão dos prazos, a agência também definiu nesta quinta-feira que irá fazer ajustes na norma atualmente em vigor.

O principal ponto em debate é quem deve administrar os dados que serão gerados a partir do rastreamento dos remédios, função que, na proposta anterior, seria atribuída aos fabricantes dos medicamentos.

Associações de farmácias, porém, veem riscos à questão da concorrência caso as informações de venda ao consumidor sejam compartilhadas com os produtores.

Para a Anvisa, o modelo atual também pode trazer prejuízos graves ao SUS, um dos principais compradores de medicamentos produzidos no país.

Conforme a Folha publicou nesta quinta, a agência defende um novo modelo de controle dos dados gerados a partir da rastreabilidade, centralizado no próprio governo.

Neste caso, a Anvisa receberia diretamente das indústrias, distribuidoras e pontos de venda os dados dos medicamentos, sem intermediários.

"A agência vai ter acesso aos dados e pode utilizar essas informações na medida em que a saúde da população precisa ser preservada", diz o diretor Renato Porto.

Agora, a ideia é que a norma seja ajustada para inclusão do novo modelo. A expectativa é que o ajuste ocorra até o final deste ano.

Entidades que representam o setor disseram aprovar o novo modelo.

"Não vejo outro caminho, sobretudo em um momento em que o mundo inteiro discute o acesso à informação e à privacidade dos dados", diz Sérgio Mena Barreto, da Abrafarma, entidade que representa farmácias.

Já o presidente da Interfarma, entidade que representa parte da indústria do setor, vê a proposta com ressalvas.

"Supor que o setor público vai ter recursos e agilidade [para manter um banco de dados do rastreamento dos remédios] me parece confiar demais. Isso pode atrasar a rastreabilidade", diz Antônio Britto.

Ele defende unir "rigor público" e "agilidade privada", em um modelo em que a Anvisa centraliza as informações, mas contrata o sistema em vez de desenvolvê-lo.


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