A Aeronáutica levará em consideração a análise da voz dos pilotos durante a investigação de acidentes aéreos. O objetivo é detectar eventual fadiga (cansaço) dos pilotos e descobrir o quanto isso contribuiu para o desastre.
A previsão é que a análise da voz passe a compor as investigações em 2017 ou 2018, diz o Cenipa (órgão da Aeronáutica que apura as razões de um acidente aéreo). O prazo se deve ao fato de haver ainda algumas etapas a cumprir. A principal delas é estabelecer um protocolo para orientar o investigador durante a apuração.
Será preciso definir, por exemplo, quando a fala de um piloto indicar fadiga. Há elementos para determinar isso, como bocejos, a duração e a frequência de pausas durante a fala e, entre outros, o tempo que o piloto demora a responder ao controle de tráfego aéreo, diz a tenente-coronel Laura Marcolino, chefe da assessoria de fatores humanos do Cenipa.
A voz é um dos elementos indicadores de fadiga. A partir da análise, será possível mapear o que contribuiu para o cansaço –ambiente de trabalho, cultura da empresa, carga de trabalho e condições de descanso, entre outras. Também permitirá "propor recomendações de segurança mais efetivas", diz a tenente-coronel.
Na prática, a análise da voz igualmente supre uma limitação atual nas investigações. "As cabines não são filmadas. Em caso de um acidente, como você vai verificar o comportamento de um piloto? Uma dessas possibilidades é a análise da fala e da voz", diz Paulo Licati, também envolvido no projeto como coordenador da comissão nacional de fadiga humana do Comitê Nacional de Prevenção de Acidentes Aeronáuticos, colegiado que é ligado ao Cenipa.
A fonoaudióloga Carla Vasconcelos desenvolve uma pesquisa para estabelecer parâmetros do que será considerado fadiga ou não e o método científico para tal. O trabalho será apresentado como doutorado na UFMG.
Ela irá comparar, por exemplo, a voz de um piloto em estado normal com a do mesmo profissional já cansado, para detectar alterações. A intenção, diz Carla, é avaliar entre cem e mil pilotos brasileiros.
RAZÕES
A medida permite aprofundar os motivos que levam um avião a se acidentar. Países como Estados Unidos e Canadá já levam em conta a voz para detectar o cansaço da tripulação –em maio, um psicólogo ligado ao NTSB (equivalente americano do Cenipa) esteve no Brasil para falar do tema.
Entre outros, o órgão americano constatou cansaço pela voz do comandante de um cargueiro da UPS que caiu em 2013 no Alabama. Os dois pilotos morreram na ocasião.
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ACIDENTES AÉREOS
Brasil levará em consideração análise da voz para detectar cansaço em investigações de desastres
INSPIRAÇÃO
As agências de investigação dos EUA e do Canadá, que já apuram esse item nos acidentes aéreos
ITENS ANALISADOS
- Duração de um discurso
- Taxa de um discurso: divisão de sílabas por tempo
- Duração de pausas num discurso
- Número de pausas
- Número de hesitações na fala
ESTÁGIO ATUAL
Pesquisadores e membros de uma comissão do Cenipa estão desenvolvendo a metodologia para ser aplicada no Brasil. A aplicação deve ocorrer até o ano que vem
O QUE PODE RESULTAR DA ANÁLISE DA VOZ
Recomendações de segurança que orientam as empresas a ajustar as jornadas de trabalho, por exemplo
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EXEMPLOS DE ACIDENTES NO PASSADO
USAir 427 - 8 de setembro de 1994
Uma das maiores investigações da história do NTSB, o órgão de investigação de acidentes americano. O avião caiu durante a aproximação para o aeroporto de Pittsburgh, ao enfrentar uma esteira de turbulência. A partir da análise da voz do copiloto, detectou-se uma manobra equivocada em um dos lemes. No desastre, 131 morreram
UPS 1354 - 14 de agosto de 2013
O avião cargueiro caiu durante aproximação no aeroporto de Birmingham, no Alabama. Piloto e copiloto morreram. Entre os fatores contribuintes estão o cansaço, a distração e confusão do comandante, analisados pela voz da caixa preta. A investigação também concluiu que estava com ausência de sono
NO BRASIL
Como não há metodologia, não foi verificado o cansaço na voz dos pilotos. Mas há elementos para suspeitar: na caixa-preta do Airbus da TAM que caiu em Congonhas em julho de 2007, o maior acidente aéreo em território brasileiro, o copiloto boceja –um dos indícios de fadiga.