Folha de S. Paulo


Da caçamba de uma picape, atirador usa um fuzil para matar javali de 90 kg

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Três batidas na cabine da picape, dadas pelo passageiro na caçamba, são a senha para o motorista parar. O alvo está por perto.

"Cuidado com os ouvidos", diz um dos três integrantes do grupo. Poucos segundos depois, soa um barulho seco, alto, vindo de um projétil especial disparado por um fuzil 7 mm. O alvo está a algumas dezenas de metros do carro, sob a mira a laser do rifle.

No meio da noite, iluminada apenas por três lanternas potentes, o atirador pula do carro e corre em direção ao campo de sorgo, cereal semelhante ao milho.

Vê as marcas de sangue no solo e chama os dois amigos para, por terra, continuarem a busca. A cerca de 100 metros da primeira marca de sangue, o javali está caído, morto. O animal pesa aproximadamente 90 quilos. O tiro acertou a lateral do corpo.

O abate –o primeiro de três naquela noite– ocorreu na zona rural do município de Monte Azul Paulista (a 400 km de SP), na madrugada da última terça-feira (25). Na região onde fica a cidade, perto de Ribeirão Preto, o javali é considerado uma praga pelos agricultores.

Pela devastação que causa no ecossistema, principalmente no Sul, o animal é o único no país cuja caça é liberada pelo Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente).

Segundo o órgão federal, há hoje 7.000 pessoas cadastradas para o abate do animal. Mas, segundo técnicos que estudam o assunto, o número real é maior, pois a burocracia faz com que muitos não se regularizem. Em Monte Azul Paulista, os caçadores têm o cadastro e autorização do Exército para portar o armamento pesado.

"Fazemos tudo dentro da lei. O risco desse animal para a fauna nativa, as plantações e o gado é enorme", diz Mardqueu França Filho.

Advogado na cidade e atirador esportivo em provas olímpicas por hobby, ele foi o autor dos disparos que mataram três javalis e feriram um naquela madrugada, em cerca de duas horas.

Clique na infografia: Onde fica Monte Azul Paulista

DEVASTAÇÃO

Antes de o sol cair, uma volta pelo sítios e fazendas da região basta para perceber o estrago que os javalis fazem. Enquanto o campo de sorgo –onde o maior javali da noite foi morto– tem diversas crateras, as plantações vizinhas de seringueiras têm várias árvores jovens destruídas pelos dentes dos animais.

A plantação de milho também é alvo dos bichos, que passam o dia escondidos em canaviais ou nos brejos. Nascentes das fazendas têm seus cursos interrompidos porque os bandos e as famílias de javalis chafurdam na região atrás de alimento, como sementes e insetos.

Moradores da região relatam também que os javalis comem ninhos de espécies de aves que põem seus ovos no chão, como o quero-quero, a perdiz e as codornas. "Nem mesmo as plantações de batata-doce, com cercas elétricas, são poupadas", diz Mardqueu, que sai a caça, em média, três vezes por semana na região.

Os javalis também podem passar doenças ao gado, como a febre aftosa. "Estamos enxugando gelo. São milhares de animais, e um atirador assíduo como eu, por exemplo, não matou nem 70 neste ano", diz.

CARNE

A norma do Ibama, além de exigir o cadastramento do atirador e de suas armas –e do local onde serão feitos os abates–, também proíbe que a carne do javali seja comercializada. A saída é usar para consumo próprio.
Por isso, o jantar antes da caçada na segunda-feira (24), teve lombo ao forno com limão-cavalo, fruto da expedição da semana anterior.


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