Folha de S. Paulo


Com 'crise de identidade', av. Paulista passa por fuga de empresas em SP

Avener Prado/Folhapress
Vista da avenida Paulista na altura da rua Pamplona, região central de SP; via registra 'fuga' de empresas
Vista da avenida Paulista na altura da rua Pamplona, no centro de SP; via registra 'fuga' de empresas

"Vamos sair", diz o executivo de uma empresa de alimentos. Diante da desaceleração da economia e com calçadas lotadas de moradores de rua e camelôs, a avenida Paulista passa por uma "crise de identidade" que tem causado uma fuga de escritórios.

Enquanto os paulistanos discutem a ocupação do cartão-postal da cidade aos domingos, com seu fechamento para o trânsito, e a nova ciclovia atrai cada vez mais frequentadores, 20% dos escritórios na avenida estão vagos, segundo levantamento da consultoria Colliers. Há um ano, esse índice era de 13%.

A crise econômica afeta outras regiões, mas fatores específicos agravam o problema na Paulista: valor do aluguel, idade dos prédios, deficit de estacionamento e protestos que atrapalham o trânsito –em média, um a cada três dias.

Há três anos, o edifício comercial Asahi, perto do Masp, não tinha espaços para alugar. Hoje, tem seis dos 22 andares vazios. "Estamos perdendo muitas empresas para a Barra Funda (zona oeste) e o centro", diz o gerente do edifício, Luís Marcel Main.

Para o presidente do Secovi (sindicato que representa o setor imobiliário), Claudio Bernardes, a atual crise econômica acentua a tendência.

"Temos um excesso de oferta de lajes corporativas, com condições muito melhores que alguns edifícios da Paulista, por serem mais novas e modernas", diz.

Para Marcelo Ghitnic, diretor da divisão de escritórios da Colliers, o principal problema ainda é a qualidade e o alto preço das locações, apesar da queda recente —o valor do metro quadrado de imóveis de alto padrão na avenida foi de R$ 143, no primeiro trimestre de 2014, para R$ 116 no mesmo período deste ano.

No caso da empresa do gerente de compras Leandro Pontes, o fato de a Paulista ser o "protestódromo" da cidade pesou na decisão de abandonar a região da avenida.

"É um custo que se reflete no funcionário que precisa chegar às 8h, mas só vai conseguir chegar às 10h", diz ele, que trabalha na rua Maestro Cardim (Bela Vista).

Mesmo a um quarteirão da avenida, o escritório paga o "custo Paulista". Com poucas vagas de estacionamento para funcionários, gasta R$ 450 mensais por cada uma que aluga na região –em um total de quase R$ 10 mil.

Os inconvenientes também fizeram o advogado Davi Gebara Neto, 46, cogitar sair da Paulista. Em nome da localização privilegiada, porém, ele desistiu da ideia. "Resolvemos apenas colocar uma janela antirruído para amenizar nos dias de protesto", diz.

MIRANTE E CENTROS CULTURAIS

Ao mesmo tempo em que perde força no mundo dos negócios, a avenida Paulista ganha novos espaços de cultura e lazer.

Artistas de rua estão cada vez mais presentes, e dois centros culturais devem ser construídos na via nos próximos anos.

Ambos terão mirantes que permitirão contemplar a vista a partir da avenida, inaugurada há 124 anos.

No início de 2017, o Sesc deve inaugurar uma unidade reformada. Com 16 andares, ela terá teatro, local para exposições e oficinas culturais.

Para o mesmo ano, está prevista também a inauguração de um espaço cultural do Instituto Moreira Salles, com cinema e uma área para exposições.

O local terá um vão-livre, restaurante e jardim com obras de arte.

Neste ano, a avenida também recebeu o shopping Cidade São Paulo, com cinco andares.

OCUPAÇÃO

O uso da Paulista como área de lazer ganhou força após a inauguração da ciclovia no canteiro central.

Na estreia da pista, em junho, a avenida foi fechada para carros. Após público expressivo, a gestão Fernando Haddad (PT) estuda adotar a medida todos os domingos.

A iniciativa desagrada alguns comerciantes e donos de estacionamentos. Já hospitais não demonstram a mesma resistência –de dez ouvidos pela Folha, três não se manifestaram e sete não se opõem ou pedem medidas como a liberação de trajetos alternativos.

Outra hipótese em estudo pela prefeitura é fechar apenas parcialmente a via aos carros no domingo.

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AVENIDA PAULISTA
Conheça momentos históricos

8.dez.1891
Avenida é inaugurada sem nenhuma construção, apenas com terrenos demarcados.

1895
É construída a primeira mansão, denominada Von Büllow, pelo arquiteto Augusto Fried.

Década de 1930
Bondes elétricos passam a circular na via.

1935
Elite constrói casarões. No boulevard Trianon, onde hoje é o Masp, aconteciam bailes.

1955
Começa a ser construído o Conjunto Nacional. A data é marcada pela construção de prédios.

1970
Casarões da avenida são destruídos para a construção de prédios e o alagamento da via.

2011
Avenida perde empresas para a região do rio Pinheiros.

2013
Via recebe protestos contra o aumento da tarifa de ônibus.

2015
Crise, trânsito e protestos acentuam o esvaziamento de escritórios da avenida, que também recebe mais moradores de rua e camelôs.


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