Folha de S. Paulo


Ladrões roubam cães de raça em bairros de classe média de SP

Bandidos estão roubando, furtando e até sequestrando cachorros de raça em bairros de classe média da capital, como Tatuapé e Mooca, na zona leste, Santana (zona norte) e Campo Belo (zona sul). Os ladrões costumam atacar quando o dono passeia com seu animal.

A Polícia Civil diz não ter números dos crimes porque os animais, segundo o Código Penal, são considerados objetos, e os casos são registrados como roubos gerais.

Mas estatísticas de organizações não-governamentais e entidades de defesa apontam para cerca de 70 casos desde o início do ano. "O que existe hoje são quadrilhas especializadas", diz o maestro Eduardo Roz, 37 anos, protetor de animais.

O objetivo é a revenda dos cães em feiras ilegais –sendo a mais famosa em Itaquera (zona leste)– e sites de leilão. "A polícia sabe dessa feira. Mas precisa ter vontade política de resolver o problema", afirma José Luís Oliveira Santos, da Sociedade Brasileira de Cinofilia.

Levantamento do Ministério Público mostra que as quadrilhas atuam de duas formas. O alvo são sempre cachorros de raças de pequeno porte. Os animais mais velhos são submetidos à reprodução forçada para a geração de filhotes, enquanto os mais novos são revendidos por preços abaixo do mercado. Um cão da raça buldogue francês, por exemplo, que custa R$ 3.500 em pet shops, é vendido por no máximo R$ 1.500.

"Fazemos ações para fiscalizar as feiras e identificar animais possivelmente roubados. Quando recebemos notícias de vendas pela internet, acionamos delegacias especializadas para identificar o autor dos anúncios", diz o promotor Carlos Prestes de Camargo, do Grupo Especial de Combate aos Crimes Ambientais.

GOLPE

Na manhã do dia 12 de fevereiro, a aposentada Clarisse Tria Bianco, 77 anos, passeava pelas ruas de Santana (zona norte), com Toy, o shitzu de 10 anos de sua filha, a professora Maria Salete Tria Bianco, 52 anos, quando uma mulher em um carro a abordou pedindo ajuda para "receber um dinheiro".

Um comparsa que acompanhava a suspeita disse que ela estava passando mal e que precisaria comprar um remédio. Convencida com a história, a idosa entrou no carro. Quando pararam em frente a uma farmácia, a idosa desceu do veículo e o casal arrancou, levando o cão. "Eu fui muito ignorante", culpa-se Clarisse.

Após o golpe, Maria Salete passou a integrar um grupo de resgate de animais em situação de risco nas ruas. "Esse tipo de coisa abala uma família", disse.

Superação é palavra constante do cotidiano da economista Izilda Biel, 59 anos. Na tarde do dia 13 de junho, ela passeava pelas ruas do Tatuapé (zona leste) com Whiskey, um spitz alemão de seis anos, quando um homem passou do seu lado, fingiu tropeçar e puxou o animal pelo focinho de suas mãos.

O crime foi flagrado por câmeras de segurança. As imagens rodaram o Brasil. A polícia identificou que o autor tinha uma comparsa, mas ninguém foi preso. "Não tem o que a polícia fazer. É caso perdido", afirmou.

Para coibir o roubo e furto dos cachorros de raça, especialistas afirmam que os interessados nesses animais podem colaborar, evitando o mercado clandestino.

Sócio diretor da Petland, uma das maiores redes de petshops do Brasil, Rodrigo Albuquerque afirma que o preço menor, maior atrativo para que as pessoas busquem seus animais nessas feiras, não é uma vantagem.

"O gasto é muito maior, pois não se sabe a procedência desse animal, se ele tem pedigree, se ele está saudável. As pessoas precisam entender que estão comprando uma vida, arcando com uma responsabilidade", diz.

Para José Luís Oliveira Santos, da Sociedade Brasileira de Cinofilia Independente, não adianta culpar só a polícia enquanto não houver a mudança de comportamento. "O que a polícia vai fazer? A pessoa chega lá e diz só o nome e que o cachorro é de tal raça e de determinada cor. É necessário que haja a microchipagem de identificação do animal e que tenha a documentação dele."

Segundo Santos, os ladrões também atacam canis. "As quadrilhas souberam agir. Eles compraram um cachorro, compraram outro, seguiram os vendedores, descobriram os canis", afirma. Por causa disso, diz, os canis têm feito a entrega dos filhotes em locais públicos, como shoppings e estacionamentos de supermercados.

INVESTIGAÇÃO

A Secretaria de Estado da Segurança Pública afirmou apenas que os roubos e furtos de cachorros são investigados pelos distritos dos bairros onde acontecem.

A pasta não respondeu os questionamentos feitos pela reportagem sobre a identificação das quadrilhas, possíveis prisões e andamento da apuração dos casos citados na reportagem.

Sobre as feiras, a secretaria disse em nota que a fiscalização é de responsabilidade da prefeitura e que a Polícia Militar atua apenas quando há denúncias ou se depara com flagrantes.

Procurada, a Prefeitura de São Paulo disse que as fiscalizações são feitas diante programação. Não foi informado, no entanto, quantas ações foram realizadas este ano.


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