Folha de S. Paulo


PM concluiu investigação de fraude sem ouvir 12 oficiais

A sindicância que apurou um esquema de fraudes em licitações do Comando-Geral da Polícia Militar de São Paulo foi encerrada sem ouvir 12 dos 20 oficiais que foram listados pela própria corporação porque poderiam, no mínimo, fornecer subsídios à investigação.

Os nomes desses oficiais da PM foram citados em documentos por terem contribuído "para ao menos uma das fases" das licitações sob suspeita e incluídos em uma lista da sindicância como "pessoas a serem ouvidas".

Eles, porém, não prestaram depoimentos. Após dois anos e meio de investigação, os trabalhos foram encerrados em agosto de 2014 atribuindo toda a responsabilidade por fraudes ao tenente-coronel José Afonso Adriano Filho.

Conforme revelou a Folha na semana passada, as fraudes nas compras da cúpula da PM envolveram itens como clipe, açúcar e peça para veículos. Dentre as irregularidades havia pagamentos por produtos não entregues.

A apuração foi concentrada nos anos de 2009 e 2010, nas gestões José Serra e Alberto Goldman (PSDB).

As empresas de fachada que foram beneficiadas, porém, receberam pelo menos R$ 21,5 milhões da corporação entre 2005 e 2012.

Editoria de Arte/Folhapress

CORONÉIS

Os nomes dos 20 oficiais foram listados pela auditoria da sindicância em 458 licitações do Comando-Geral sob suspeita. Por exemplo, por terem pedido ou aprovado as compras e serviços que, no final, se mostraram fraudulentos.

Como não foram ouvidos, não é possível dizer se eles de fato participaram do certame ou mesmo se tinham alguma ciência das irregularidades.

Dos 12 oficiais que deixaram de ser ouvidos há dois coronéis, dois tenentes-coronéis e dois majores, além de capitães e tenentes. Na época das fraudes, Adriano Filho era major -na hierarquia, inferior a quatro desses oficiais.

Ele admitiu parte do esquema, mas, sem citar nomes, disse que fazia tudo com conhecimento dos superiores –não para enriquecimento próprio, mas para bancar gastos extraoficiais da PM.

Um dos oficiais da lista de pessoas que deveriam ter sido ouvidas é a coronel Maria Aparecida de Carvalho Yamamoto, responsável pelo setor de comunicação da Polícia Militar, que teria solicitado acessórios de informática e locação de equipamentos.

À Folha, Adriano Filho disse que a área comandada pela coronel Maria era uma das abastecidas por ele com dinheiro obtido no esquema de fraudes. Ele dizia manter uma espécie de banco, com dinheiro em espécie, para pagamento de despesas "corriqueiras" de vários setores.

"Pergunta para ela [Maria] por que a comunicação andava. Eu não deixava faltar dinheiro lá. Eu dava tudo."

Procurada, a coronel Maria disse que não iria se manifestar porque só Alexandre de Moraes, secretário da Segurança, falaria sobre esse tema.

Moraes afirmou nesta quinta-feira (25) que um Inquérito Policial Militar será aberto para apurar por que os oficiais não foram ouvidos e outras irregularidades envolvendo empresas de fachada contratadas pela corporação.

A lista dos que deveriam ter sido ouvidos também inclui Paulo Adriano Telhada, coronel, ex-comandante da Rota e hoje deputado estadual pelo PSDB. Ele foi citado por participar de duas compras (de carimbos e medalhas).

O oficial disse que nunca foi chamado para prestar esclarecimentos e nem sequer sabia que fazia parte de lista de pessoas a serem ouvidas.

OUTRO LADO

O secretário da Segurança da gestão Alckmin (PSDB), Alexandre de Moraes, disse ter determinado a abertura de um IPM (Inquérito Policial Militar) para ampliar as investigações nas licitações feitas pelo Comando-Geral da PM.

A abertura, segundo ele, foi determinada após a Folha revelar que empresas de fachada receberam R$ 21,5 milhões em licitações feitas pela cúpula da PM durante oito anos, e não apenas entre 2009 e 2010, período abrangido pela sindicância.

Também motivou a abertura do inquérito a revelação da lista de 12 oficiais que não foram ouvidos na sindicância.

"Não vamos nem abrir sindicância, vamos instaurar um IPM porque esse instrumento permite que possamos pedir ao juiz a decretação de quebra de sigilo bancário, fiscal, das empresas, de eventuais pessoas envolvidas."

Procurada, a coronel Maria Aparecida de Carvalho Yamamoto disse que não iria comentar esse assunto, nem mesmo se chegou a ser procurada pela sindicância.

"Tudo que tinha que ser dito a respeito dessa sindicância já foi falado, inclusive até pelo secretário. A autoridade máxima aqui na polícia é o secretário. Ele já deu entrevista, já falou. Eu não tenho mais nada a falar."

O coronel Paulo Adriano Telhada, ex-comandante da Rota, disse que nunca foi chamado para dar explicações sobre pedidos de compra e nem sabia que estava na lista de pessoas a ser ouvidas.

Disse que fez pedidos de compra de medalhas e carimbos e que recebeu o material.

Os pedidos, segundo ele, foram encaminhados ao comando do Choque, e não ao tenente-coronel José Afonso Adriano Filho. Telhada disse não saber dizer por que esses pedidos foram enviados a Adriano Filho, do Comando-Geral, porque o Choque poderia fazer as próprias compras.

Os outros oficiais superiores não foram localizados.


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