Folha de S. Paulo


Crime invisível: Dados de sequestro-relâmpago em SP não são divulgados

A fisioterapeuta Joana (nome fictício), 27, parava o carro em uma rua de Santo Amaro (zona sul de São Paulo) na segunda-feira (22) quando um casal armado a abordou –queriam mantê-la refém enquanto outro criminoso sacava dinheiro e fazia compras com cartões dela. "Está difícil de dormir até hoje. A gente fica muito inseguro."

Trata-se de um caso clássico de sequestro-relâmpago –crime que, apesar de relatos frequentes em São Paulo, é como se fosse "invisível": não se sabe se aumentou, caiu ou quantas vítimas fez.

Isso porque a Secretaria da Segurança não divulga os números separadamente. Nas estatísticas da violência, eles são somados aos roubos.

Mas o governo tem como quantificá-los: nos boletins de ocorrência, há o subtipo "sequestro-relâmpago".

Foi essa, por exemplo, a classificação de ao menos 11 crimes que a polícia atribui a um casal preso na terça-feira (23) sob a acusação de praticar sequestros-relâmpago na zona sul, entre eles o ataque contra Joana –que conseguiu escapar sem ferimentos quando seu carro "morreu".

Na casa dos dois foram encontrados dinheiro (até cédulas estrangeiras), relógios, tênis e celulares de vítimas, segundo o delegado Francisco Solano de Santana. O casal ainda não tem advogado.

Reprodução/TV Globo
Casal preso nesta semana acusado de sequestros-relâmpagos na zona sul de São Paulo; com eles foram apreendidos relógios e dinheiro
Casal preso nesta semana acusado de sequestros-relâmpagos na zona sul de São Paulo

A polícia começou a chamar vítimas para reconhecimento do casal. No primeiro dia, seis foram à delegacia, no bairro de Campo Grande. Nesta quinta (25), mais cinco.

O delegado estima que os suspeitos, com ajuda de uma terceira pessoa, cometeu 30 sequestros-relâmpagos desde 2013 na região, ocupada por condomínios de classe média e alta. Por isso, pediu à Justiça que os dois fiquem presos na própria delegacia, em vez de ir a um Centro de Detenção Provisória, até que todas as potenciais vítimas façam reconhecimento.

A estratégia é produzir inquéritos que mostrem que o grupo agia seguidamente. Assim, aumenta a possibilidade de obter na Justiça condenação próxima da pena máxima, 12 anos de prisão.

"O sequestro-relâmpago é considerado roubo. E assim é tipificada a metodologia. Se se estende muito tempo, aí passa para a extorsão mediante sequestro", disse nesta quinta (25) o secretário da Segurança da gestão Geraldo Alckmin (PSDB), Alexandre de Moraes, para justificar por que não divulgam informações sobre esse tipo de crime.

Segundo Moraes, não há "nenhum dado da inteligência" das polícias que aponte alta de sequestros-relâmpago.

"Eles publicam apenas o que por resolução são obrigados a publicar, nem uma linha a mais. É uma coisa política, não técnica", diz o sociólogo Guaracy Mingardi. "Uma vez um delegado me disse: 'Esse negócio de estatísticas é só para cobrar a gente'."


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