Folha de S. Paulo


Após 25 anos, novo fluxo de brasileiros está a caminho do Japão

Os brasileiros estão retornando ao Japão.

Não aos montes, como entre 1990 e 2008, quando a população de descendentes de japoneses saídos do Brasil e residentes naquele país saltou de 176 mil para quase 330 mil.

Pela primeira vez em sete anos, no entanto, autoridades do Japão detectaram neste 2015 um saldo positivo no fluxo de imigrantes brasileiros de olhos puxados para a terra de seus antepassados.

O movimento não era visto desde 2008, quando a economia japonesa entrou em recessão na esteira da crise mundial, diminuindo a oferta de empregos para esses imigrantes, chamados de decasséguis -termo do japonês para aqueles que saem de sua terra natal para trabalhar em outro país.

NOVATOS E REINCIDENTES

Agora, ainda um pouco desconfiados quanto à nova promessa de emprego dos recrutadores de mão de obra, os decasséguis que hoje arriscam a sorte do outro lado do mundo se dividem entre novatos e reincidentes.

É o caso de Kenny Ida, 37, que retornou ao Brasil há dois anos, após o tsunami de 2011, mas já se prepara para mudar de novo para o Japão no fim de julho, desta vez sem a mulher e os filhos.

"Se ele perceber que está valendo a pena mesmo, aí planejamos a ida de toda a família", diz Eliza Ida, sobre a possível viagem com os filhos de 12 e dez anos.

Outro fator é fundamental na decisão desses brasileiros: a alta do dólar. Os decasséguis ganham em ienes, e, para enviar dinheiro ao Brasil, convertem seus salários primeiro para o dólar e depois para o real.

"Quanto mais alto o dólar, mais ele consegue juntar", diz Kleber Aryoshi, diretor da agência de empregos Itiban.

É isso que leva brasileiros que nunca colocaram os pés no Japão, como o sushiman Tiago Borges Shiguetaka, 35, a sair do país.

Ele pensou em aproveitar sua experiência como cozinheiro para trabalhar no setor de alimentos. Mas mudou de ideia quando descobriu que o salário na indústria de eletroeletrônicos e montadoras é maior. "Meu foco é trabalhar e juntar dinheiro para investir aqui no Brasil. Quem sabe não abro meu próprio restaurante?", planeja.

'ABENOMICS'

Tanto o cônsul-geral do Brasil no Japão, Marcos Farani, como o secretário do setor econômico da Embaixada do Japão no Brasil, Satoshi Ito, confirmam o aumento na demanda japonesa por mão de obra imigrante.

"A proporção de vagas por candidato subiu de 0,83 em 2012 para 1,17 em abril deste ano", diz Ito.

Ambos os diplomatas citam os mesmos dois fatores como determinantes da nova onda decasségui.

Primeiro, o deficit populacional japonês (morre mais gente do que nasce), e consequente envelhecimento da sua população. Segundo, a política econômica do primeiro-ministro Shinzo Abe, conhecida como "abenomics", que incentivou exportações, aumentou a produção interna e reaqueceu a economia.

Enquanto o PIB do Japão no primeiro trimestre cresceu 1% (em relação ao trimestre anterior), o brasileiro contraiu 0,2% em um cenário em que figuram a ameaça do desemprego, da volta da inflação e da desvalorização dos salários, o que deve acelerar esse fluxo.

Por outro lado, a mesma "abenomics" que gerou empregos desvalorizou o iene e aumentou a inflação, o que é ruim para os novos decasséguis, que não devem encontrar hoje as mesmas condições para juntar dinheiro que havia na década de 1990 e no início dos anos 2000.

Tais condições foram transformadas de maneira radical na crise de 2008. O corte de vagas e a redução de jornadas na indústria fizeram com que, em 2009, o governo japonês adotasse uma medida controversa: conceder US$ 3.000 (cerca de R$ 9.300) para que cerca de 20 mil decasséguis retornassem ao Brasil.

Alguns desses imigrantes brasileiros, àquela altura, já dormiam pelas ruas ou sob pontes de cidades do Japão. A condição da ajuda era que eles não retornassem mais ao país por tempo indeterminado.

Poucos anos depois, em 2011, o tsunami que devastou a costa da ilha parecia dar o golpe de misericórdia na esperança de recuperação da economia nipônica. E, em 2012, mais de 15 mil brasileiros retornaram para casa.

As condições econômicas atuais, ainda que não sejam ideais, levaram a embaixada japonesa a emitir, apenas no primeiro trimestre de 2015, 16.314 vistos para brasileiros. Desses, estima-se que quase 3.000 já se registraram como residentes por lá.


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