Folha de S. Paulo


Roubada e apreendida pela polícia, arma volta para o crime

Duas vezes desviado, duas vezes nas mãos do crime, duas vezes apreendido.

O revólver Rossi calibre 38, de corpo preto, cabo de madeira, número D585777, deixou a fábrica no Rio Grande do Sul no início da década de 1980 e veio a ser registrado por uma empresa de segurança privada de São Paulo.

A história dele sintetiza os resultados de um estudo do Ministério Público paulista e do instituto Sou da Paz, lançado recentemente, que rastreou 2.031 de todas as armas (4.289) apreendidas em roubos e homicídios na cidade de São Paulo em 2011 e 2012.

Caminho da Arma; Ilustrações: Adams Carvalho / Editoria de Arte/Folhapress

A maior parte das armas usadas por criminosos é nacional, já foi legal —muitas registradas em São Paulo— e de fabricação anterior a 2003, quando o Estatuto do Desarmamento restringiu o porte e a posse desses artefatos.

Um projeto de lei em análise na Câmara dos Deputados pretende facilitar as regras para a aquisição de armas.

O Rossi 38 foi roubado em 29 de maio de 1998 pela primeira vez. Um jovem de 19 anos, com uma pistola, entrou à tarde numa agência de banco em São Vicente, no litoral paulista, rendeu dois vigias e roubou as armas deles. Uma delas era o Rossi.

Um mês depois, o revólver foi encontrado no guarda-roupa do ladrão —conhecido entre os policiais por outro roubo a banco e que, segundo os registros, assumiu o assalto. Estava com uma bala a menos, segundo a perícia.

Entregue de volta à empresa proprietária, a GP Guarda Patrimonial —que não quis comentar o caso—, o Rossi foi novamente subtraído em março de 2010. Devido aos bancos de dados incompletos, não é possível saber em que circunstâncias aconteceu o segundo desvio.

RETORNO

Sabe-se, porém, que a arma só reapareceu um ano mais tarde, no assalto a um restaurante no Jardim Arize, na zona leste de São Paulo.

"Quando ele entrou, eu percebi pelos lábios dele que ele tinha falado 'assalto'. Meu irmão achou que era brincadeira, até que ele levantou a camisa e mostrou a arma", conta a dona do restaurante.

Foi ela quem, disfarçadamente, chamou a polícia. O ladrão foi preso em flagrante.

Dessa vez, por ter sido apreendido em um ato criminoso, o Rossi não foi devolvido ao dono. Foi destruído pelo Exército em abril de 2012.

"Alguns mitos foram quebrados [com a pesquisa]: a arma do crime não é o fuzil, não é a metralhadora. É o revólver nacional calibre 38. Não veio do Paraguai, não cruzou a fronteira. Ele foi comercializado no Estado de São Paulo e continuou cometendo crimes ali por até 30 anos", diz Ivan Marques, diretor-executivo do instituto Sou da Paz.

Editoria de Arte/Folhapress

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