Folha de S. Paulo


Santa Casa precisa enxugar e mudar de perfil contra crise, diz acionista do Itaú

Convocado por gestores da Santa Casa de SP para tentar reverter a crise do hospital e assumir sua provedoria, o médico José Luiz Setúbal, 58, da família fundadora do Itaú, avalia que a instituição precisará enxugar sua estrutura, com demissões e possível mudança de perfil que reduza a capacidade de atendimento.

Mas diz que desta vez só aceitará a função se houver consenso em torno de seu nome como candidato único -em 2013, com 45% dos votos, ele perdeu a disputa para Kalil Abdalla, que renunciou no mês passado e cuja gestão é investigada pela Promotoria.

"Estou colocando a minha credibilidade pessoal e a da minha família quando aceito ser candidato. O mais fácil seria eu fazer um cheque generoso e assistir tudo de longe", afirmou Setúbal à Folha.

Diante das dívidas de cerca de R$ 800 milhões do maior complexo hospitalar filantrópico da América Latina, Setúbal reconhece possível resistência a ações que planeja, como diminuição da abrangência dos serviços, redução de funcionários e busca de prazo para pagar dívidas.

"Vão falar que é medida de banqueiro. Mas enquanto meu defeito for ser banqueiro, está ótimo", diz. A escolha do provedor será em 9 de junho -possíveis candidaturas ainda serão oficializadas.

Daniel Guimarães/Folhapress
Médico José Luiz Setúbal
O médico José Luiz Setúbal

Folha - Por que o sr. quer ser provedor da Santa Casa?
José Luiz Setúbal - Não era minha vontade, até 15 dias atrás. Recebi muita pressão para ser candidato. Penso que posso ajudar diante da situação muito grave atual. Mas só aceito caso haja consenso em torno do meu nome e eu seja candidato único. A recuperação da instituição precisa de postura de união.

Como pretende enfrentar o rombo financeiro do hospital?
Vou conversar com os três níveis de governo e acertar o que se espera da recuperação da Santa Casa. O hospital não vai fechar, porque é muito importante para a saúde de São Paulo, mas ele pode mudar de perfil, tornar-se um hospital regional, com menor capacidade de atendimento, diminuindo muito de tamanho.
A outra opção, manter tudo como é, atendendo gente do país inteiro, vai exigir outra estratégia e outro esforço a serem pensados. Embora o hospital seja privado, ele tem uma importância social imensa e isso faz o problema passar a ser político. Vai ser preciso um compromisso de todos para resolver.

O secretário [de Saúde do Estado de SP] David Uip disse que a saúde vai ficar pior.
Não quero dinheiro. Quero, por exemplo, apoio para pedir um respiro da Caixa Econômica Federal para o pagamento de dívidas e, assim, conseguirmos sobreviver. Se a Santa Casa morrer, o banco não vai receber.
A falência do hospital é também a falência da sociedade que não consegue manter uma instituição que tem a idade da cidade e que foi erguida com o esforço de muita gente. Pensar em falência me dá uma tristeza enorme [interrompe a entrevista para conter o choro].

E qual o plano para combater a crise de credibilidade?
A Santa Casa é muito maior do que os homens que fizeram todos os malfeitos que estão aí. Estou colocando a minha credibilidade pessoal e a da minha família, quando aceito ser candidato à provedoria para tentar recuperar a instituição. Isso não é pouco.
O mais fácil seria eu fazer um cheque generoso e assistir tudo de longe. Mas, se quero um país melhor, preciso parar de reclamar e arregaçar as mangas para trabalhar para que ele seja melhor.

O saneamento das contas pode passar por ajustes no quadro de funcionários?
Isso é uma realidade. Até um ano atrás, a Santa Casa tinha 40 unidades de saúde e isso diminuiu muito. Os funcionários se aglomeram agora na sede e muitos não têm nem o que fazer. Teremos de enxugar isso. O número é entre 1.000 e 1.200 pessoas, não sei ao certo [atualmente há em torno de 11 mil pessoas].
Sou médico, não gestor. Mas sei que quando um paciente está com uma doença grave ele precisa tomar medicamentos que vão fazer muito mal a ele, mas o tratamento visa a sobrevivência. Infelizmente, teremos de fazer.
Vão falar que é medida de banqueiro, como falaram da minha irmã [Neca Setúbal, que apoiou a candidatura de Marina Silva à Presidência] durante a eleição. Mas enquanto meu defeito for ser banqueiro, está ótimo. Para alguns setores, parece que minha única qualidade é ser herdeiro do Itaú e, por um acaso da vida, ter uma fortuna vinda de um banco.

Que tempo e energia pretende dedicar à Santa Casa?
Como diz aquela piada: se quer que algo seja bem feito, entregue para alguém que não tenha tempo. O meu papel lá será muito político e estou preparado para isso.

Editoria de arte/Folhapress

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