Folha de S. Paulo


Brasileiro condenado por tráfico de drogas é executado na Indonésia

Um estampido alto e seco à meia-noite e meia (horário local) assustou diplomatas e familiares de prisioneiros na ilha de Nusakambangan, em Cilacap, no interior da Indonésia.

Era o som do fuzilamento de oito condenados à morte, entre eles o brasileiro Rodrigo Muxfeldt Gularte, 42.

Segundo o protocolo de execuções, Gularte ficou preso a uma estaca com as mãos amarradas para trás e vestia uma camiseta branca com um "X" preto na altura do peito, para facilitar a mira dos atiradores –são 12 militares perfilados para cada condenado.

Médicos, religiosos e policiais acompanharam de perto as execuções, num campo aberto. Aos médicos coube apenas constatar as mortes.

Além do brasileiro, foram executados um indonésio, dois cidadãos da Austrália e quatro da Nigéria.

Uma filipina, que também estava na lista, escapou da execução minutos antes.

Supri/Reuters
Oficial indonésio com as pranchas onde Rodrigo levava drogas em 2004
Oficial indonésio com pranchas onde Gularte levava drogas; ele foi executado pelo crime de 2004

DROGA NUMA PRANCHA

Recrutado por um traficante de drogas, o paranaense foi preso em 2004 ao tentar entrar no aeroporto do país com seis quilos de cocaína escondidos em pranchas de surfe.

Na ocasião, ele estava com dois brasileiros. Mas Gularte assumiu que a droga era toda dele, e os amigos foram liberados pelos indonésios.

No ano seguinte veio a condenação à pena de morte, contra a qual fracassaram todos os recursos, inclusive os pedidos de clemência feitos tanto pela família dele como pelo governo brasileiro.

Gularte foi o segundo brasileiro executado no exterior em tempos de paz. Em janeiro deste ano, o traficante Marco Archer Cardoso Moreira, 53, também foi fuzilado nessa mesma ilha indonésia, a 400 km da capital Jacarta.

No momento do fuzilamento, somente dois brasileiros puderam permanecer na ilha: o diplomata Leonardo Monteiro, da Embaixada do Brasil em Jacarta, e Angelita Muxfeldt, que há três meses chegou à Indonésia para ficar próxima ao primo.

Os dois não puderam acompanhar a execução, mas estavam próximos o suficiente (a cerca de 1 km) para escutar a ação dos atiradores.

Horas antes, na última conversa com o diplomata, o brasileiro alternou momentos de delírio e lucidez e afirmou que, após a morte, iria para o céu. "Daqui irei para o céu e ficarei na porta esperando por vocês", disse Gularte, segundo relato do diplomata à reportagem da BBC Brasil.

O corpo de Gularte foi embalsamado e, em seguida, seria levado à capital do país, onde aguardará a liberação para o translado ao Brasil.

Num último encontro antes da morte, ele pediu à prima que fosse enterrado em Curitiba (PR).

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REAÇÃO

A mãe dele, Clarisse, soube da execução na capital paranaense, Estado onde nasceu. A família preferiu que ela não viajasse à Indonésia, por medo do seu estado de saúde. Ela o viu pela última vez em fevereiro passado.

A família de Gularte e o governo brasileiro reagiram logo após a morte. Em nota, familiares disseram que o fuzilamento dele será uma "lembrança de que a luta para abolir a pena de morte é uma longa estrada a seguir".

Os parentes também criticaram a Indonésia por ter ignorado a doença do brasileiro –ele teve a esquizofrenia constatada em dois laudos.

Já o governo brasileiro afirmou em nota que a execução configura um "fato grave" nas relações com o país asiático.

Em entrevista em Brasília, o embaixador Sérgio França Danese relembrou os apelos ignorados pelos indonésios. "Estamos procedendo a uma avaliação sobre a atitude a adotar em relação a esse país a partir de agora."

Colaborou BRASÍLIA

Editoria de arte/Folhapress

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