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Debate sobre redução da idade penal deixa jovens internos apreensivos

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As discussões de uma comissão especial da Câmara dos Deputados, em Brasília, chegaram ao pátio da Fundação Casa (antiga Febem) de Osasco, na Grande SP. Os jovens internos, na maioria de 16 a 18 anos, estão tensos diante da eventual redução da maioridade penal.

Pesquisa Datafolha realizada na semana passada mostra que 87% dos brasileiros seriam a favor da redução da maioridade penal de 18 para 16 anos. O percentual é o maior já registrado pelo instituto desde a primeira pesquisa sobre o tema, em 2003. Naquele ano e também em 2006, quando ocorreu um segundo levantamento, 84% disseram ser a favor da redução da idade.

"Meu medo é ir pro CDP [Centro de Detenção Provisória, para adultos] e ficar lá apodrecendo. Aqui, pelo menos, eu posso estudar", disse André (nome fictício), com 18 anos recém-completados.

De um grupo de oito jovens que falaram com a Folha na tarde desta terça (14), três disseram ter aprendido a ler e escrever na Fundação Casa. André é um desses adolescentes.

Todos estão matriculados na rede estadual de ensino e têm de frequentar as aulas dentro da própria unidade. Além de estudar, passam por 40 horas semanais de atividades (de esportivas a cursos de arte e profissionalizantes).

Quando estavam do lado de fora, segundo relatam, não iam à escola por diversos motivos, como envolvimento com adultos criminosos e problemas na família.

A unidade Osasco 2, onde está o grupo ouvido pela reportagem, não recebe jovens reincidentes. É considerada uma unidade tranquila. A maior parte está ali por roubo. O tráfico vem em segundo lugar e está em crescimento. Como no resto da fundação, poucos cometeram crimes como latrocínio e homicídio. São, em média, cerca de 3%.

"A maioria aqui rouba porque precisa, mas também tem quem rouba porque quer, pela adrenalina", disse Tiago (nome fictício), 16, que alega ter roubado porque precisava.

"Acho que tem o lado da punição, de estar longe da família, e o lado que me ajuda a estar mudando", afirmou ele, internado há sete meses.

Editoria de Arte/Folhapress

Para a presidente da Fundação Casa, Berenice Giannella, é um "equívoco" falar que os adolescentes não são punidos atualmente.

"Pergunte para qualquer adolescente que entra na fundação se ele acha que não está sendo punido. Fica lá, na fundação, sete, oito meses, dormindo com pessoas que você não conhece, tomando banho de cinco minutos".

A tramitação da PEC (Proposta de Emenda à Constituição) gera ansiedade entre os internos e algumas dúvidas.

"Se vocês [jornalistas] virem que a gente está tranquilo aqui dentro, que está tendo muitas coisas melhorando pra gente, vai motivar essa lei a não ser aprovada, certo?", perguntou o adolescente Ricardo (nome fictício).
"Porque, se estiver tudo bem aqui, não precisa mudar a lei, certo?", completou.

As informações sobre esse debate chegaram aos internos por meio dos pais deles.

Funcionários tentam tranquilizá-los: uma mudança na Constituição não teria efeito retroativo, diz a eles o diretor regional Guilherme Astolfe Nico, responsável por 16 unidades da Fundação Casa.

"Quero uma vida melhor para o meu filho", disse André, cuja namorada está grávida de oito meses. "Vou fazer supletivo. Mas vamos ver lá fora, falar é fácil".


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