A guarda de uma menina de dois anos nascida em Manaus está sendo disputada por uma haitiana e um casal de brasileiros em Carlos Barbosa (RS), cidade de 27 mil habitantes na serra gaúcha.
A haitiana não pode ver a filha biológica há pelo menos sete meses, quando a juíza da Infância e Juventude Cristina Margarete Junqueira, da Comarca de Carlos Barbosa, deferiu (aceitou), em 13 de agosto de 2014, o pedido de guarda provisória feito pelo casal.
A juíza também negou o pedido de visitas da mãe. O processo corre em segredo de Justiça, e a magistrada não quis dar entrevista.
O casal alega que o bebê foi abandonado aos quatro meses, em 2012, aos cuidados da mãe adotiva do homem que obteve a guarda provisória.
A haitiana nega. Ela diz que até fevereiro de 2013 buscava a filha todos os dias na casa da idosa, que era paga para cuidar da menina. Vizinhos ouvidos pela Folha confirmaram a versão. A imigrante vivia num imóvel em frente à casa da família.
A mãe diz também que, quando passou a trabalhar na cidade vizinha, pegava a filha nos fins de semana. Mas, muitas vezes, o casal não a deixava ver a filha.
"Eu ligava e ninguém atendia. Quando ia ver minha filha, eles não estavam em casa", afirma a mãe, que ainda não foi ouvida pela Justiça.
Segundo os advogados da haitiana, Silvana Lazarotto e Marcelo Corrêa, sua cliente foi proibida de ver a filha. "Não há prova do abandono. É uma decisão injusta", diz Corrêa. Para eles, a juíza se baseou em uma prova unilateral, um boletim de ocorrência de 10 de agosto de 2014 no qual a haitiana é acusada de violência e de uma tentativa de invasão domiciliar três dias antes.
Segundo a mãe, naquele dia o casal não deixou que ela visse o bebê. Na época, eles não eram seus tutores legais.
Uma testemunha afirma que chamou a polícia após presenciar o filho da idosa batendo com um facão na parede para intimidar a haitiana.
"Minha família me abandonou. Mas eles também tentaram me pegar de volta. E não conseguiram", disse à Folha o filho da idosa.
Procurado, o delegado Leônidas Reis afirmou que a ocorrência de invasão de domicílio foi registrada depois que o casal obteve a guarda da criança. A decisão da juíza, porém, saiu três dias depois.
No despacho, a juíza considera a certidão de batizado uma prova dos cuidados do casal. O batismo ocorreu em 2013, sem autorização da mãe, que é evangélica.
A haitiana chegou grávida ao Brasil em 2012. Em Manaus, foi acolhida pela irmã Santina Perin. Segundo Perin, que morou no Haiti por 22 anos, é comum as haitianas deixarem os filhos com vizinhos para irem trabalhar.