Folha de S. Paulo


'Nem me lembrava dele', diz dona de carro 'símbolo' da seca em SP

Duas décadas se passaram desde que a enfermeira Rosani Zanin, então com 33 anos, virou uma madrugada de sábado para domingo num distrito policial da zona norte de São Paulo para relatar o furto de seu carro.

Esse veículo, porém, só seria reencontrado agora, em condições muito diferentes da esperada por Rosani em 1995.

A antiga coloração prata do Escort modelo 1994 hoje dá lugar a tons de ferrugem.

A explicação: o veículo passou anos submerso em uma represa do sistema Cantareira e somente veio à tona nos últimos meses, por causa da redução drástica do nível desse reservatório, no município de Nazaré Paulista.

Na lataria, um grafite ("Bem-vindo ao deserto da Cantareira") que ajudou a velha carcaça a se transformar em um dos símbolos da grave crise da água na Grande SP.

A imagem ganhou o noticiário sobre a estiagem, mas a enfermeira, hoje em Mongaguá (no litoral sul paulista), conta que nem sequer estava sabendo do status que a lata velha havia conquistado -foi informada pela Folha.

"Fiquei muito chateada quando fui roubada, mas já nem me lembrava dele. Na época, a seguradora pagou parte do prejuízo, mas, ainda assim, foi algo que atrasou a minha vida", disse.

Rosani conta que comprou o carro zero quilômetro e ainda não havia terminado de pagar as prestações, quando ocorreu o furto, em frente à casa de um amigo.

"Foi o primeiro carro que eu gostei de verdade. Era muito bonito, eu sempre viajava com ele. Naquele tempo, eu trabalhava em dois empregos para pagar as parcelas."

A carcaça do carro foi retirada da represa de Atibainha na semana passada e só foi identificada como o antigo carro de Rosani após a verificação do número do chassi.

Agora, num pátio da polícia, está ao lado de outras 30 carcaças retiradas da represa desde agosto do ano passado.

Até mesmo uma metralhadora foi retirada de lá, de acordo com o delegado Luiz Carlos Ziliotti. "Ainda deve aparecer muito mais coisa por aqui", afirma.

O delegado conta que foi aberto novo inquérito policial para investigar o caso, mas diz não acreditar na localização dos suspeitos pelo furto.

Assim que Rosani for encontrada pelos policiais (o número de telefone e o endereço que constam no boletim de ocorrência não existem mais), ela será chamada para retirar o veículo, que está em meio a dezenas de outras carcaças em um pátio usado pela polícia.

"O que eu iria fazer com ele? Vou dizer apenas 'obrigada' para a polícia", diz Rosani.

Após o roubo de seu Escort, a enfermeira passou a sempre contratar uma seguradora para os novos carros. "A gente fica com medo de ser roubada de novo, né? Tem que estar precavida."


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