Folha de S. Paulo


Antes de assumir a Sabesp, Kelman criticou captação do rio Paraíba do Sul

No ano passado, antes de assumir seu cargo atual de diretor-presidente da Sabesp, o engenheiro Jerson Kelman disse que o Estado de São Paulo deveria começar a evitar o desperdício de águas de chuvas como veículo de esgotos na capital paulista antes de começar a captar água da bacia do rio Paraíba do Sul para o sistema Cantareira.

A ANA (Agência Nacional de Águas) autorizou a captação na sexta-feira (16).

Kelman fez a declaração em 3 de junho ao comentar o pedido de autorização para a captação de água, feito em março à presidente Dilma Rousseff (PT) pelo governador Geraldo Alckmin (PSDB), ao qual agora é subordinado como diretor-presidente da Sabesp. O engenheiro havia participado de um debate do "Fórum de Sustentabilidade", realizado pela Folha em comemoração à Semana do Meio Ambiente.

Em conversa no saguão do MIS (Museu da Imagem e do Som) com participantes do evento, Kelman disse não ser "em princípio" contra São Paulo captar água da bacia que abastece também o Rio de Janeiro desde que o governo paulista adotasse medidas contra o desperdício de águas de chuvas como veículo de esgotos em rios como o Pinheiros e Tamanduateí, que atravessam a capital do Estado.

A Folha perguntou à Sabesp se seu novo dirigente ainda tem essa mesma opinião e também se o Estado já adotou medidas concretas para aproveitar águas de chuvas na região metropolitana, que ainda se misturam com a rede de esgotos e aos dois rios, ambos afluentes do Tietê. Por meio de sua assessoria de imprensa, a estatal paulista afirmou que decidiu não responder à reportagem.

O desperdício de águas de chuvas na Grande São Paulo também foi apontado entre as falhas de gerenciamento destacadas por Newsha Ajami, pesquisadora da Universidade Stanford (EUA). Ela esteve na capital paulista em dezembro, a convite do governo do Estado, para discutir a gestão de recursos hídricos com autoridades e outros especialistas.

Na semana passada, em Nova York, em entrevista à Folha publicada na segunda-feira (19), Ajami observou a necessidade de "coleta de água da chuva, que é muito mais limpa que o esgoto" na Grande São Paulo. "Mas, no fim, os dois são despejados no mesmo lugar", afirmou a pesquisadora se referindo ao rio Tietê, onde deságuam o Pinheiros e o Tamanduateí.

DISPUTA

O rio Paraíba do Sul percorre os Estados de São Paulo e Rio de Janeiro. Em março, o governador fluminense Sérgio Cabral (PMDB) reagiu contrariamente ao pedido de autorização de Alckmin a Dilma, dizendo que "jamais" permitiria que se retirasse água que abastece o povo de seu Estado. O governador de São Paulo replicou dizendo que o rio "é dos paulistas".

Somente no final de novembro, já encerradas as eleições, os governos dos dois Estados e de Minas Gerais –onde nascem alguns dos afluentes do rio Paraíba do Sul– concordaram com a captação de água do rio interestadual para o sistema Cantareira.

Na presença do ministro Luís Fuchs, do Supremo Tribunal Federal, os governadores dos três Estados firmaram acordo para o início das licitações de São Paulo para obras de captação das águas para o sistema Cantareira, que enfrenta sua pior crise hídrica.

Na sexta-feira (16), a ANA autorizou o início das obras de interligação com base em relatório de uma comissão da agência e dos três Estados, segundo o qual o projeto de captação é viável e não põe em risco a segurança hídrica da bacia do rio Paraíba do Sul.

Escolhido no final de dezembro por Alckmin para presidir a Sabesp, Jerson Kelman é professor de engenharia da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), doutor em hidrologia e recursos hídricos pela Universidade Estadual do Colorado (EUA) e foi presidente da Agência Nacional de Águas (2001-2004) e da Agência Nacional de Energia Elétrica (2005-2008).


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