Folha de S. Paulo


Previsão de queda de avião provoca brincadeiras e pânico na Paulista

Nos elevadores dos quatro edifícios nas esquinas da avenida Paulista com a alameda Campinas, em São Paulo, não se fala mais sobre o tempo.

O tédio que circunda discussões meteorológicas típicas de quem compartilha um cubículo espelhado foi substituído por diálogos tensos e irônicos que versam sobre um tema onipresente:

- E esse avião, hein? Cai ou não cai? (risinhos)

- Besteira, né? Acho que não, mas vai que...

A pauta é a previsão feita pelo autointitulado vidente Jucelino Nóbrega da Luz de que o voo JJ3720 da TAM, entre São Paulo e Brasília, se chocaria com um prédio na esquina da avenida Paulista com a alameda Campinas nesta quarta (26).

Em nota, a TAM informa que "considerou o alerta e permanecerá atenta às operações" neste dia. A empresa também mudou a designação do voo para JJ4732. Vai que...

Uma outra suposta premonição de Luz foi registrada em cartório em 2005 e ganhou repercussão depois de o alegado vidente ter revelado documento similar em que previa a queda do avião do presidenciável Eduardo Campos em 13 de agosto último.

No passado, outros documentos registrados por Luz foram avaliados por peritos técnicos, que encontraram indícios de alterações. Ainda assim, vai que...

E é por essa crença velada, envergonhada, ou para apaziguar os ânimos de funcionários, que pelo menos seis empresas do edifício Comendador Alfredo Bonfiglioli, na esquina da Paulista com a Campinas, decidiram suspender o expediente nesta quarta ou iniciá-lo mais tarde, quando o avião estiver são e salvo em destino.

"O brasileiro é supersticioso. Estava todo mundo infeliz no escritório até eu resolver dar 'day-off' [folga]", diz Renato De Luizi, 62, do escritório de advocacia De Luizi.

Fernando Takiyama, 41, vice-presidente da japonesa Toray, que fornece fibras de carbono para os aviões utilizados pela TAM, achou por bem avisar a matriz da previsão de Luz. "Ele é conhecido também no Japão. Não acredito na previsão, mas vai que acontece? Melhor prevenir."

Entre quem trabalha nesses prédios, o clima oscila entre a brincadeira e o pânico.

"Lógico que eu estou preocupada. Minha filha não quer que eu venha trabalhar de jeito nenhum", admite a supervisora Mônica Liguori, 46, que vai entrar mais tarde, às 10h, na certeza de que o sensitivo considerou o horário de verão em seus cálculos.

No ponto de táxi, Osmar Batista de Arruda, 61, comemorou o bom motivo para dormir até mais tarde. "Não vai acontecer nada, mas eu não vou estar aqui, não."

Desavisados sobre o frisson causado por Luz, turistas estrangeiros garantiram 100% de lotação ao L´Hotel, a poucos passos da fatídica esquina. "Está tudo normal, mas eu gostaria de trocar minha folga de terça para quarta", admite a recepcionista Stella Garcia, 27. Vai que...

A cem metros dali, o síndico Severino Alves de Lima, 67, alertou os condôminos da suposta premonição com um aviso no elevador. "Fiquei com a sensação de dever cumprido e surpreso com a crendice das pessoas", diz.

Na galeria comercial Naja, a vendedora Ariane Priscila, 22, já traçou um plano de emergência. "Infelizmente, tenho de trabalhar. Mas virei de sapatilha e, se o avião cair, eu saio correndo. Mas estarei bem vestida para poder dar entrevistas." Afinal, vai que...


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