Folha de S. Paulo


'Orientação superior' impediu alerta maior sobre crise, diz presidente da Sabesp

Em uma reunião da cúpula da Sabesp neste ano, a presidente da estatal, Dilma Pena, afirmou que uma "orientação superior" impediu a empresa de alertar a população de São Paulo sobre a necessidade de economizar água. Em nota, a Sabesp confirmou a reunião e ressaltou que sua "comunicação é feita de forma autônoma".

"Cidadão, economize água. Isso tinha de estar reiteradamente na mídia, mas nós temos de seguir orientação, nós temos superiores, e a orientação não tem sido essa. Mas é um erro", afirmou Pena a dirigentes da estatal.

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Voz da presidente da Sabesp, Dilma Pena

O áudio da reunião foi obtido pela Folha.

Na nota, a Sabesp diz que "naquele momento, a diretoria discutia com o conselho de administração da companhia (órgão superior) a estratégia de comunicação". "O objetivo da reunião operacional foi de ampliar ao máximo as ações de comunicação para o uso racional da água junto aos funcionários da companhia", diz a empresa.

O governo de São Paulo é o acionista majoritário da Sabesp e tem o poder de indicar a maior parte dos integrantes do conselho de administração da companhia. Em abril, o Estado indicou para compor a cúpula da estatal por um mandato de dois anos Mauro Arce (secretário de Recursos Hídricos de Geraldo Alckmin), Alberto Goldman (ex-governador paulista), Francisco Luna (secretário de Planejamento do governo José Serra), a própria Dilma Pena e outros quatro nomes.

São Paulo enfrenta a sua mais grave crise de abastecimento hídrico. O sistema Cantareira, que fornece água para cerca de 8 milhões de pessoas só na região metropolitana, operava nessa quinta-feira com 3% de sua capacidade.

O governo paulista tem sido acusado de não abordar a questão de maneira transparente por causa do processo eleitoral. O governador Geraldo Alckmin (PSDB) disputava a reeleição e conseguiu um novo mandato em outubro.

Em nota, o Palácio dos Bandeirantes afirmou que "nunca vetou qualquer alerta sobre a crise hídrica". "Ao contrário, o próprio governador concedeu mais de uma centena de entrevistas coletivas, desde fevereiro, para salientar a gravidade da maior seca já registrada na história."

Na reunião, Pena diz que "por uma orientação superior, a Sabesp tem estado muito pouco na mídia".

"Nós tínhamos de estar mais na mídia, os superintendentes locais, nas rádios comunitárias."

Pena segue dizendo que argumentou contra a decisão. "É um erro. Tenho consciência absoluta, e falo para as pessoas com quem eu converso sobre esse tema, mesmo meus superiores."

BANHO EM UBATUBA

Na mesma reunião, o diretor metropolitano da Sabesp, Paulo Massato, diz que a situação é uma "agonia" e diz que "não sabe o que fazer" se os volumes de chuva neste ano repetirem o cenário de 2013.

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Voz do diretor metropolitano da Sabesp, Paulo Massato

"Se repetir o que aconteceu esse ano, do final de 2013 de outubro pra cá, se voltar a repetir em 2014, confesso que eu não sei o que fazer. Essa é uma agonia, uma preocupação."

Depois, ele relata uma "brincadeira" que um colega fez, mas ressalta que é uma "brincadeira séria": "Ele falou: 'Saio de São Paulo, porque aqui não tem água, não vai ter água pra tomar banho, limpeza da casa'."

"Quem puder compra garrafa de água mineral, quem não puder vai tomar banho na casa da mãe, em Santos, Ubatuba, Águas de São Pedro. Aqui não vai ter."

NOTA

Leia a íntegra da nota da Sabesp.

1) O objetivo da reunião operacional foi de ampliar ao máximo as ações de comunicação para o uso racional da água junto aos funcionários da companhia. Vale destacar que a comunicação da Sabesp é feita de forma autônoma. E as decisões ocorrem no âmbito da companhia. Naquele momento, a diretoria da Sabesp discutia com o conselho de administração da companhia (órgão superior) a estratégia de comunicação.

2) Também naquele momento a diretiva era diminuir ao máximo a dependência do Sistema Cantareira. O contexto era de convencer, de forma contundente, os gerentes operacionais da companhia da necessidade de redução. A estratégia tem dado certo. A dependência do Cantareira diminuiu de 9 milhões para 6,5 milhões de pessoas, uma redução de cerca de 30%.


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