Folha de S. Paulo


Seca provoca corrida por poços artesianos no interior de São Paulo

Com mais de 2 milhões de pessoas sob racionamento oficial e rios cada vez mais secos, o interior de São Paulo vive agora uma corrida por poços artesianos –que começa a alcançar também a região metropolitana.

Os poços são uma alternativa viável de abastecimento de água, segundo especialistas consultados pela Folha, mas a expansão enfrenta dificuldades, como alto custo, excesso de demanda e lentidão na análise de licenças.

A procura pelo serviço aumentou, segundo as empresas do setor, e a espera para perfurar um poço pode chegar a 45 dias.

"Tenho programação de obras até outubro", diz Hailton Bassan, gerente da Guirado & Guirado, de Indaiatuba (a 98 km de São Paulo).

O número de licenças de perfuração concedidas aumentou 83% no segundo trimestre deste ano, na comparação com o mesmo período de 2013, segundo o Daee (Departamento de Águas e Energia Elétrica), órgão estadual que analisa os pedidos. Foram 178 contra 326 concessões emitidas no Estado.

Editoria de Arte/Folhapress

Um poço não custa menos de R$ 20 mil. As empresas também não garantem que haverá água nem que será de boa qualidade, e dizem que a licença pode demorar até um ano para sair. Apesar de tudo isso, a procura cresce.

"O desespero é grande, o pessoal está querendo fazer poço até em casa", afirma Éverton Antunes, da Prosondas, de Indaiatuba. "Temos recebido muitas ligações de Guarulhos, Itu e Valinhos, cidades que mais têm sofrido com o racionamento", diz.

As águas subterrâneas são utilizadas no abastecimento público em cerca de 75% dos municípios do Estado, principalmente na área do aquífero Guarani (reservatório subterrâneo do Estado), que abrange as regiões de Presidente Prudente, São José do Rio Preto e Ribeirão Preto. São 26.462 poços no Estado, segundo o Daee, dos quais 2.701 estão na capital (8%).

Nas regiões de São Paulo e Campinas, as mais afetadas pela falta de chuva e pela crise do sistema Cantareira, há pouca água subterrânea, por isso quase todo o abastecimento público provém de águas superficiais (rios e mananciais). As subterrâneas (poços) são exploradas em caso de necessidade.

Mesmo assim, estima-se que sejam retirados cerca de 10 m³/s de água do solo na Grande São Paulo, metade do que é enviado para a região metropolitana pelo Cantareira hoje. Isso torna os poços artesianos a quarta maior fonte de água da região, atrás de três represas.

"Em condições normais, nosso maior cliente é o industrial. Hoje, a procura está em todos os segmentos", diz Fernando Daleffe, da Edisonda, de Campinas. "Muitos condomínios, de casas ou apartamentos, têm nos procurado."

CONDOMÍNIO

Rodrigo Krisciunas está construindo um condomínio de dez casas em Vargem Grande Paulista (a 44 km da capital) e optou por fazer um poço artesiano em vez de ligar o empreendimento à rede de água da Sabesp.

"Os condomínios têm de se virar. Se for esperar o governo, falta água", afirma ele, que gastou R$ 60 mil na obra.

Ricardo Hirata, especialista da USP em águas subterrâneas, estima que existam 12 mil poços artesianos hoje na Grande São Paulo, dos quais 3.000 ou 4.000 são legalizados. Mais 800, afirma, deverão entrar em funcionamento entre o começo deste ano e o fim do próximo.

"Vai ter uma corrida aos poços, disso eu não tenho dúvida", diz Júlio Cerqueira Cesar Neto, ex-diretor de planejamento do Daee.


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