Folha de S. Paulo


Cresce número de salas de aula dentro de hospitais no país

Para chegar à escola, a pequena Lara, 6, só precisa pegar a coleção de lápis e cadernos e atravessar o corredor. Às vezes, nem isso: acompanhada de uma professora da rede pública, aprende a ler e escrever no próprio quarto e até na sala de quimioterapia.

Enquanto luta contra a leucemia, a menina é um dos cerca de 500 alunos que estudam, todos os meses, dentro de hospitais paulistas.

Funciona assim: após a chegada de uma nova criança no hospital, os professores das chamadas "classes hospitalares" contatam a escola onde ela estuda –pública ou particular– e se informam sobre o conteúdo ensinado. Em alguns casos, a própria escola fornece as atividades.

As aulas são dadas em uma sala no próprio hospital ou no leito das crianças mais debilitadas, o que motiva algumas delas. Para participar, é preciso autorização médica.

Embora pouco conhecida, a iniciativa avança em todo o país. Hoje, ao menos 146 hospitais brasileiros têm classes hospitalares para crianças e adolescentes em tratamento.

Há dez anos, eram 80, segundo levantamento de pesquisadores da UERJ (Universidade do Estado do Rio de Janeiro) que estudam o tema desde 1996.

"Mas ainda é muito pouco", diz Eneida Simões da Fonseca, da Faculdade de Educação da UERJ. Aos poucos, parcerias de hospitais e escolas da rede pública mudam esse cenário.

Em SP, o número de classes hospitalares aumentou de 48 para 60 nos últimos dois anos –o Estado é o que tem mais escolas em hospitais no país, seguido pelo RJ e PR.

Outras três devem começar a receber alunos no próximo semestre, segundo Denise Arantes, coordenadora do centro de apoio pedagógico especializado da Secretaria de Educação do Estado de SP.

O modelo também existe em outros pontos do país, como Natal. Lá, as aulas no hospital Giselda Trigueiro começaram em abril. Outros hospitais já demonstraram interesse em receber professores, segundo a supervisora das classes no RN, Simone Rocha.

RESISTÊNCIA

Apesar do avanço, o serviço, incluído na chamada educação especial, ainda encontra dificuldades e resistência de alguns setores.

"Há alunos que ficam sem aulas por falta de professor no hospital", diz Fonseca. Além disso, segundo ela, alguns cursos voltados à formação desses professores focam na doença, e não na didática.

Outra dificuldade é fazer o atendimento ser reconhecido pela escola de origem do aluno. Quando isso não ocorre, professores aplicam uma prova para saber que conteúdos ensinar. Ao final, enviam um relatório das atividades.

"A ideia é que a criança, ao voltar para a escola, não se sinta deslocada nem perca o ano", diz a professora da PUC-PR Elizete Matos, para quem a iniciativa ajuda a diminuir a evasão.

Após se afastar da escola no 3º ano para tratar um câncer, Beatriz, 10, continuou os estudos no hospital Darcy Vargas, na capital paulista. Um ano e meio depois, já de volta à sala de aula tradicional, ela ainda procura a professora sempre que volta ao hospital para consultas.

"Me ajudou muito no tempo em que fiquei fora [da escola]. Quando voltei, foi facinho recuperar o conteúdo", conta a menina, hoje no quinto ano, enquanto brinca com a amiga Gabriela, 11.

Se as duas já voltaram à escola formal, Camila, 9, agora se prepara para isso: desde abril, reveza os estudos em casa e na classe hospitalar.

Mesma situação vive Lara, 6, cuja maior preocupação era deixar a escola, segundo a mãe, Juliana Souza, 29. Hoje, é continuar nela: "Antes, ela só queria assistir desenho e pintar. Agora, ela pede para fazer a lição", conta.


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