Folha de S. Paulo


Cesarianas representam 88% dos partos em hospitais particulares

Em cada 100 partos nos hospitais privados no país, 88 são realizados por meio de cirurgias cesarianas. O índice, considerado alarmante por autoridades de saúde, integra a pesquisa "Nascer no Brasil", coordenada pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), baseada em depoimentos obtidos dentro das maternidades de 266 hospitais públicos e privados.

A média nacional de cesarianas ficou em 52% do total de partos. E o percentual de cirurgias registradas nas maternidades públicas atingiu 46%.

Segundo a Organização Mundial de Saúde, o índice deste tipo de intervenção cirúrgica deve ficar em torno de 15%.

"Por ser uma cirurgia, a cesariana é um fator de risco a mais, tanto para a mãe quanto para o filho", alertou Maria do Carmo Leal, coordenadora da pesquisa.

O levantamento também revelou que 55% das entrevistadas não planejavam engravidar. E, mesmo após o parto, 9% dessas mulheres permaneciam insatisfeitas com a gravidez.

Os pesquisadores envolvidos no projeto entrevistaram 23.894 mulheres, sempre após o parto, entre fevereiro de 2011 e outubro de 2012 em 191 cidades do Brasil.

"Percebemos que houve uma banalização das cesarianas no Brasil. O que passou a determinar este tipo de cirurgia não são mais os fatores clínicos", criticou Rosa Domingues, pesquisadora do grupo da Fiocruz que participou da pesquisa. "Muitas vezes, a mulher não cogita fazer a cesariana no início da gravidez e depois muda de ideia. Isso mostra que algo acontece neste caminho. Por alguma razão, ela acaba convencida a optar pela cesariana".

De acordo com a pesquisa, 36,1% das mulheres em primeira gravidez no sistema privado de saúde sinalizavam a preferência pela cesariana já no início da gestação.

Na reta final da gestação, o percentual de pacientes a favor da intervenção cirúrgica aumentava consideravelmente: 67,6% das grávidas preferiam passar por uma cesariana. E o número final subia ainda mais: no momento da decisão, 89,9% das mães de primeira viagem fizeram cesáreas em maternidades da rede privada.

No sistema público de saúde, 15,4% das pacientes queriam a cesariana desde o início, intenção que se manteve praticamente a mesma (15%) ao fim da gravidez. Neste caso, 44,8% das mulheres, em primeira gravidez, acabaram passando por cesarianas.

"É muito significativo que, nas redes pública e privada, não haja um aumento do desejo da mulher pelo parto normal ao longo da gravidez", diz o obstetra Marcos Dias, do Instituto Fernandes Figueira, que também colaborou com a pesquisa.

Um consenso entre os pesquisadores é que o formato dos hospitais privados é direcionado para as cesáreas.

"No modelo atual, a paciente fica vinculada a um único médico que acompanha todo o processo. Seria necessário ter hospitais com uma retaguarda, equipes de plantão, para receber as gestantes em trabalho de parto. Só que os hospitais privados funcionam como hotéis. A equipe médica chega, trabalha e vai embora", analisa Rosa Domingues.


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