Folha de S. Paulo


Dançarino morto em favela do Rio foi atingido por tiro, diz Beltrame

O Secretário de Segurança Pública do Rio, José Mariano Beltrame, disse na noite desta quarta-feira que o laudo cadavérico do dançarino Douglas Rafael da Silva Pereira, o DG, mostra que ele tinha "perfuração de arma de fogo" e que esse tiro teria causado sua morte.

"A perfuração por arma de fogo foi fatal", disse o secretário em entrevista coletiva. A mãe do jovem já tinha dito que ele foi atingido por um tiro nas costas na noite da última segunda-feira. A Polícia Civil, porém, não havia confirmado a informação até então.

Pereira era dançarino do programa "Esquenta", da TV Globo. A morte dele causou uma série de protestos na noite de ontem, que resultaram na morte de um outro rapaz.

O secretário também disse hoje que não descarta a participação de policiais militares da UPP (Unidade de Polícia Pacificadora) do morro Pavão-Pavãozinho na morte do dançarino. Os dez policiais envolvidos na ocorrência, porém, não foram afastados de suas funções.

Para o secretário, ainda não há indícios claros da participação dos agentes na morte de DG. Nenhuma das armas foi apreendida, mas estão relacionadas no inquérito e poderão ser usadas num eventual confronto balístico, caso o projétil que atingiu o dançarino seja encontrado.

"Não quero antecipar proteção aos policiais, mas não quero condená-los preliminarmente. Preciso de um indício mínimo que seja para fazer isso [afastamento]. No momento são várias teses, muita especulação. Não quero tomar nenhuma atitude antecipada", disse o secretário.

De acordo com a coordenação das UPPs, PMs da unidade foram checar uma denúncia de que traficantes armados estariam circulando num beco da favela, por volta das 22h de segunda. Ao chegar na viela, eles foram recebidos a tiros. Houve confronto, mas ninguém teria ficado ferido. Também não houve preso ou apreensão.

Por volta das 9h de terça-feira (22), a PM diz que foi fazer perícia do tiroteio junto com a Polícia Civil e descobriu o corpo do dançarino nos fundos da creche Paulo de Tarso.

Parentes do dançarino afirmam que foram avisados do crime apenas somente às 18h. Beltrame não soube explicar porque a família de DG só foi avisada sobre a morte no fim da tarde, mais de seis horas após o corpo ter sido encontrado.

Na ocasião, PMs isolaram a área e cercaram a creche para aguardar a chegada da diretora da instituição e iniciar a perícia. No momento do crime, havia uma funcionária dentro da creche. Ela deve prestar depoimento à polícia até o final de semana.

Reprodução/Facebook
Dançarino Douglas Rafael da Silva Pereira, conhecido como DG, ao lado da cantora Anitta; morte do rapaz causou protestos no Rio
Dançarino Douglas Rafael da Silva Pereira, conhecido como DG; morte provocou protestos no Rio

TORTURA

A mãe do dançarino, Maria de Fátima, passou quase três horas ontem prestando depoimento na delegacia. Ao sair, disse ter sido informada pelo delegado que seu filho foi atingido por um tiro nas costas, que teria atravessado seu corpo e saído pelo ombro. Ela também diz acreditar que ele foi torturado antes de morrer.

Beltrame, porém, negou que o corpo de Pereira tenha apresentado sinais de tortura. "O laudo não traz essa informação".

No laudo, o IML afirma que o jovem morreu de "hemorragia interna decorrente de laceração pulmonar", causada por "ferimento transfixante do tórax" como consequência de "ação pérfuro-contundente". Duas cápsulas de balas foram encontradas por peritos ao lado do corpo.

"Tenho certeza absoluta que o meu filho foi torturado. Ele tinha um corte na cabeça e no nariz. Estava muito machucado. Tinha marcas de botas nas costas. E o perito [do Instituto Médico Legal] disse que ele foi atingido por um tiro no tórax", lamentou emocionada a mãe.

"Não entendi porque ele e todos os documentos dele, passaporte e o cartão do plano de saúde da emissora, estavam molhados se na terça-feira não chovia. Por que a gente só foi tomar ciência da morte 18 horas depois, se ele estava com identificação", disse a mãe.

Douglas Pereira morava com a mãe na rua Barata Ribeiro, em Copacabana. Ele deixou um filha de quatro anos. Segundo a mãe do jovem, ele costumava levar a namorada -remadora do Vasco- no alto no morro, onde ela mora. Ele ainda encontrava amigos do grupo de dança "Bonde da Madrugada" ali.

PROTESTO

Após a localização do corpo do jovem, moradores da região do Pavão-Pavãozinho fizeram um protesto na noite de ontem. Eles fizeram barricadas com pedras e paus e atearam fogo em objetos e num carro. Houve confronto com a polícia, e um outro rapaz também foi baleado e morreu.

O tumulto se estendeu por duas das principais ruas do bairro e o comércio fechou as portas. O Batalhão de Choque cercou a entrada do Pavão-Pavãozinho e dezenas de moradores atiraram pedras contra PMs. Os Batalhões de Operações Especiais (Bope) também reforçaram o policiamento.

O secretário atribuiu os frequentes casos de tiroteios no Pavão-Pavãozinho e em outras favelas com UPPs a uma tentativa do tráfico em "banalizar" o projeto das unidades.

Ele afirmou que os confrontos na favela de Copacabana começaram a ocorrer após a volta do traficante Adaulto Nascimento Gonçalves, o Pitbull. Ele foi preso pela polícia em 2008, mas foi solto após receber benefício judicial. À época da prisão, o suspeito trabalhava, com crachá de empreiteiras, nas obras do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) na favela.

"De lá para cá tem causado, junto com quatro ou cinco pessoas, essas ações no sentido de gerar a intranquilidade e impor o medo àquela população", disse Beltrame.

O secretário disse querer "pressa" na investigação. "Vamos acompanhar essa investigação com todo rigor e apresentar à sociedade com toda a transparência. Quero pressa nessas investigação para que continuemos nesse trabalho."

Editoria de Arte/Folhapress
Protestos em 10 cidades
Protestos em 10 cidades

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