Folha de S. Paulo


Corte de água muda rotina e faz parecer que já há racionamento

Na semana em que o governador Geraldo Alckmin (PSDB) admitiu a possibilidade de racionamento em São Paulo, relatos de falta d'água se multiplicaram pela cidade.

A Folha ouviu pessoas que enfrentam cortes de água diários há ao menos uma semana.

A Sabesp diz que os casos são pontuais, devido a manobras técnicas, e que está fazendo ajustes finos para adequar o atendimento à demanda.

Conhece algum lugar onde falta água em São Paulo? Envie seu relato à Folha

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1. Maria Aparecida Moreira Oliveira, 44, comerciante - Freguesia do Ó (zona norte) - Desde março, toda noite, às 21h, começa a faltar água. Minha filha, que trabalha de dia e estuda à noite, precisa tomar banho e escovar os dentes no trabalho.
Em casa, eu pego a água do enxágue de roupa e guardo para limpar o chão da casa. Estamos fazendo de tudo para economizar. Eu, inclusive distribuo a água para os vizinhos aqui, que também estão sofrendo com os cortes.

Apu Gomes/Folhapress
Maria Aparecida Oliveira, 44, em sua casa na Freguesia do Ó
Maria Aparecida Oliveira, 44, em sua casa na Freguesia do Ó

2. André Simões, 36, programador - Vila Nova Cachoeirinha (zona norte) Em casa faz três meses que a água da rua some às 21h e volta só às 5h. Para mim, o pior é não ter água quente. Fico só com a ducha fria da caixa d'água ou corro tomar banho na casa da minha namorada. Se fosse um dia ou outro, pensaríamos que era pontual. Mas todo dia não é coincidência.

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3. Marlene Tornieri, 70, dona de casa - Pirituba (zona norte) - Notei de manhã que a água vinha fraca, barrosa. Depois, vi que ela acabava todo dia, às 23h. Lembrei do racionamento de dez anos atrás e fui desligar o relógio [hidráulico] para não vazar ar, ou a conta vem alta. Encho os baldes e tento limpar a cozinha antes de faltar. Só tenho medo que aconteça de novo [o rodízio de] dois dias com água e um inteiro sem. Por enquanto, me adapto.

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4. Nívea Alves, 43, dona de casa - Itaquera (zona leste) - Há quase duas semanas, cortam a água de casa dia sim, dia não. Nem liguei para a Sabesp, sei que há um racionamento. Fiquei muito brava um dia que a água terminou mais cedo e não pude dar banho no meu filho de 5 anos. Também causa transtorno pelo filtro, que recebe água da rua. Quando ela volta de manhã, vem esbranquiçada, leitosa, com um cheiro forte de cloro. Leva uma hora para normalizar. Não sei mais como me precaver da falta d'água.

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5. Erika Neves, 28, designer - Itaquera (zona leste) - Minha casa é abastecida pela caixa d'água, mas meu quarto, que fica numa edícula, recebe água da rua. Quando ia tomar banho, notei que o chuveiro estava seco. Achei que era um problema interno, mas a água começou a faltar todo dia, cada vez mais cedo. Hoje, o fornecimento para às 22h30. Tive de refazer toda a minha rotina. Guardo garrafinhas cheias d'água para escovar os dentes. O que me incomoda é que não corrigem o problema e também não assumem os cortes.

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6. Egbert Mesquita, 47, administrador do Teatro do Ator - praça Roosevelt (centro) - Os cortes começaram há dez dias sempre à meia-noite. É um transtorno, primeiro porque não houve nenhum aviso prévio e, no fim de semana, temos espetáculos à meia-noite. Se soubéssemos, poderíamos ter pensado em horários alternativos. O público fica sem água nos banheiros e bebedouro e os atores saem com a maquiagem no rosto.

Neste caso específico, a Sabesp informa que serão realizadas neste domingo (13) obras para melhorar o fornecimento de água, o que causará desabastecimento das 9h às 18h.

Avener Prado/Folhapress
Atores no camarim do Teatro do Ator, na praça Roosevelt
Atores no camarim do Teatro do Ator, na praça Roosevelt

7. Renata Maria Pinto Moreira, 37, arquiteta - Há duas semanas, quando percebemos, já não tinha mais água à noite aqui. De manhã, para lavar as coisas a gente abria [a torneira] e saía aquela pressão, vinha uma água barrenta ou turva, esbranquiçada por causa do cloro. Agora, o racionamento está 'oficializado', pois, quando chega 20h, a água já está diminuindo. Sou contra o rodízio, mas, se for inevitável, que pelo menos nos avisem.

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8. Orates Odara, 28, músico - Jardim Peri Peri (zona oeste) - Moramos em seis adultos e uma criança na nossa 'comunidade cultural', uma casa de artistas. Há duas semanas, começou a faltar água. Os cortes vinham às 22h, 21h. Hoje começa às 20h. Quando a água volta, não dá para beber. Tive de sair no meio da madrugada para comprar água para a mamadeira do meu filho João, de dois anos e meio. Coitado, ele acordava com sede e chorava.

Daniel Guimarães/Folhapress
O pai, Orates Odara, 28, e o filho João, 2, no Butantã
O pai, Orates Odara, 28, e o filho João, 2, no Butantã

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9. Luciene Santana, 39, servidora pública - Jaraguá (zona norte) - Na minha rua faltou água domingo e terça o dia inteiro. Liguei na Sabesp e me falaram que iam verificar. Na segunda ligação, eles disseram que, como o nível da Cantareira estava muito baixo, eles haviam desligado o registro. Eu não sou contra o racionamento, mas é preciso avisar antes, para nos prepararmos já que vamos ficar sem água. Na terça, por exemplo, não lavei roupa.

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10. Suzana Farkas, 38, auxiliar administrativa - Vila Joaniza (zona sul) - Tivemos um pouco de água na segunda e na terça, mas depois a torneira secou. Eu só não fiquei 100% sem água porque tenho dois baldes grandes, de 200 litros cada. Mas e quem não tem? Acabei indo para a casa dos meus pais [no Cupecê], já que tenho criança pequena, tenho que me virar.


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