Folha de S. Paulo


"Duvidaram que o julgamento ocorreria", diz juiz do Carandiru

Juiz da primeira etapa do júri do Carandiru, José Augusto Nardy Marzagão afirmou que a Justiça foi feita mais de 21 anos após o massacre, contrariando a expectativa de quem achava que o julgamento nunca ocorreria.

"Uma brincadeira que se fazia nos corredores dos fóruns era que os nossos netos ocupariam nossos lugares e esse julgamento não teria sido realizado ainda", conta.

Anteontem, o tribunal do júri condenou os últimos 15 PMs acusados pelas mortes na Casa de Detenção, em outubro de 1992. Ao todo 73 policiais receberam penas que, somadas, chegam a 20.876 anos de prisão.

"Se os jurados acharam por bem condenar, eu acho que foi feita a Justiça", afirma.

Apesar das condenações, todos os policiais aguardarão recurso em liberdade. Não há prazo para que os pedidos sejam analisados no Tribunal de Justiça. Caso se mantenha a decisão inicial, as partes ainda poderão recorrer aos tribunais superiores, em Brasília.

IMPUNIDADE

Marzagão admite que pode haver uma sensação de impunidade na população pelo tempo para a decisão fosse tomada e pelo fato de os policiais não serem presos nesse momento, mas enfatizou a necessidade de aguardar as instâncias seguintes.

"Seria abuso de qualquer juiz, tanto da minha parte, que presidi o primeiro júri, quanto do Rodrigo [Tellini], que presidiu os outros três, se nós decretássemos a prisão deles em plenário. Eles não têm condenação definitiva. Tem que aguardar o julgamento do recurso. Aí sim haverá a afetividade dessa condenação."

Por esse motivo, o promotor Fernando Pereira da Silva, que atuou nas duas primeiras etapas do julgamento, defende mudança na lei.

"Espero que exista uma modificação legislativa para que, em caso de condenação no tribunal de júri, possa ser determinada a prisão do condenado na primeira instância. A decisão do júri é absolutamente soberana", afirma.

Ainda que seja necessário submeter o caso a todos os recursos, ele considera a condenação dos policias uma mudança de paradigma.

"Antes do início do julgamento, no ano passado, o prognóstico das pessoas é que haveria uma absolvição em massa dos policiais. O resultado claramente representa uma mudança de paradigma em relação aos próprios julgamentos de policiais que cometem excesso criminoso no cumprimento do dever."

PRESSÃO

A convicção na absolvição dos PMs ocorria inclusive dentro do próprio Ministério Público –local onde partiu a denúncia que levou as condenações–, por alguns promotores, segundo Silva.

"Havia colegas que pensavam de maneira diferente ou tiveram dúvidas sobre a posição adotada de pedir a condenação, mas eram promotores que apesar do conhecimento técnico não tinham feito uma análise do processo e não conheciam as provas", disse o promotor.

Ontem, a presidente Dilma Rousseff (PT) afirmou em sua conta no Twitter que o resultado do júri representa "uma vitória contra a impunidade".

"O julgamento do Carandiru, com amplo direito de defesa e dentro das regras do Estado de Direito, representa uma vitória contra a impunidade", declarou.

Colaborou TAI NALON, de Brasília


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