Folha de S. Paulo


Para governo do Rio, plano de SP ameaça água do Estado

O plano de bombear água do rio Paraíba do Sul para socorrer os reservatórios de São Paulo foi alvo de resistência ontem no governo do Rio.

O secretário de abastecimento da gestão Sérgio Cabral (PMDB), Felipe Peixoto, disse à Folha que a proposta do governador Geraldo Alckmin (PSDB) pode gerar um "prejuízo gigantesco" ao Estado.

Afirmou que ela provoca risco de desabastecimento na região metropolitana do Rio e que também pode ameaçar a sobrevivência de pescadores no interior -devido a eventuais acidentes no rio.

Em meio à crise hídrica com risco de racionamento em São Paulo, Alckmin foi anteontem a Brasília pedir à presidente Dilma Rousseff (PT) autorização para captar água da bacia do rio federal Paraíba do Sul e despejá-la no sistema Cantareira, que está no nível mais baixo da história.

O Paraíba do Sul é responsável pelo abastecimento de 15 milhões de pessoas -11 milhões só no Rio de Janeiro. A ANA (Agência Nacional das Águas) foi orientada pelo Planalto a analisar a possibilidade com Minas e Rio, que são abastecidos por essa fonte.

"Não temos nada contra São Paulo, mas precisamos garantir a segurança hídrica do Rio. Não cometeremos nenhuma irresponsabilidade", disse Indio da Costa, secretário do Ambiente do Rio.

Alckmin ligou ontem para Cabral. O tucano declarou que a ideia foi compreendida pelo governador do Rio. Mas a assessoria de Cabral disse que ele só dará resposta após receber parecer de órgãos ambientais de seu governo.

Zanone Fraissat/Folhapress
Trecho do rio Paraíba do Sul em Jacareí, no Vale do Paraíba
Trecho do rio Paraíba do Sul em Jacareí, no Vale do Paraíba

Em nota, a Secretaria do Ambiente do Rio disse que a segurança hídrica do Estado é "fortemente dependente" da bacia do Paraíba do Sul.

O sistema Guandu, que abastece a região metropolitana e recebe água do rio, "já apresenta problemas" no período de estiagem, segundo a pasta. O texto diz que bombear água para São Paulo pode "agravar esta situação".

"Há uma questão grave que é o [risco de] desabastecimento de água da região metropolitana", disse o secretário Felipe Peixoto.

Prefeituras do Vale do Paraíba também manifestaram preocupação. O engenheiro Luiz Roberto Barretti, vice-presidente do comitê que monitora essa bacia, disse que a medida não resolve a crise na Grande SP e "vai piorar a condição da nossa região".

PRECEDENTE

O governo fluminense diz que a exigência de vazão de 250 m³/s no ponto de captação do sistema Guandu não é atendida em 8% do tempo. Ou seja, considera que não há situação tão confortável.

Segundo Rubem Porto, professor da Escola Politécnica da USP, a retirada de 5 m³/s proposta pelo governo paulista é pequena diante da vazão média de 160 m³/s do rio Paraíba do Sul na divisa entre São Paulo e Rio.

"É um valor irrisório. Há reservatórios na região capazes de controlar o volume do rio e diluir o efeito da retirada."

Para o professor de engenharia hidráulica do Mackenzie Paulo Ferreira, porém, o receio é de que se abra precedente para São Paulo retirar depois mais água da bacia.

"Os municípios temem que esses cinco metros cúbicos de água por segundo depois virem dez, depois 15, até faltar água para eles", afirma.

Eles avaliam que a medida atenua, mas não resolve a crise de abastecimento na Grande SP. Diante do crescimento populacional, seria preciso pelo menos mais 10 m³/s.

Colaboraram Natália Cancian, de São Paulo, Tai Nalon e Aguirre Talento de Brasília


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