Ao final de cada dia, o paulistano descarta 34 milhões de 'bitucas' de cigarro nas ruas. Pequena e dispersa por todo canto, ela parece não incomodar, mas os restos equivalentes ao consumo de 1,7 milhão de maços de cigarro dariam para encher um apartamento de 70 metros quadrados.
O cálculo é da organização social "Rede Papel Bituca" – que estimou a quantidade descartada do resíduo – entre os fumantes da população economicamente ativa da capital paulista. Recente pesquisa do Datafolha também apontou que 21% dos paulistanos fuma.
A maior cidade do país não dispõe de uma lei que penaliza quem é flagrado jogando lixo nas ruas, como é feito no Rio de Janeiro.
Nas vias públicas do Rio, dependendo do volume do lixo descartado, a multa pode atingir um valor superior a R$ 3.000.
Moacyr Lopes Junior/Folhapress | ||
Bitucas jogadas no chão se acumulam em sargeta na praça da República, no centro de São Paulo. |
Empresas e órgãos públicos de São Paulo têm inserido, de forma tímida nos seus espaços, as chamadas "bituqueiras"– equipamento que acondiciona o resíduo.
Na capital paulista, um projeto de lei tramita desde o ano passado na Câmara. De autoria do vereador Jair Tatto (PT), a proposta prevê multa de até R$ 100 para o "sujão" flagrado.
"É uma medida antipopular e punitiva, mas também educativa. O cidadão vai ter que pensar duas vezes antes de jogar uma bituca no chão", diz o vereador.
Tatto sugere que a fiscalização seja feita por agentes da GCM (Guarda Civil Metropolitana) e o valor arrecadado pelas multas destinado a um fundo de educação ambiental. O projeto já foi aprovado em primeira votação.
POR QUE SUJO?
Editoria de Arte/Folhapress |
Regiões com grande circulação de pessoas, ambientes com alto nível de estresse ou que concentram bares são as mais infestadas pelas bitucas.
O treinador de corretores de imóveis, Roberto Silva, 33, trabalha em uma dessas regiões, o centro. Quatro vezes ao dia, ele repete o mesmo ritual: sai do ambiente de trabalho para fumar. Quando o cigarro chega ao fim, o destino é um só: a rua.
"Sempre jogo a bituca na vala. Nunca na calçada, porque a chuva vem e leva", diz.
Silva diz que desta forma "diminui o dano" devido à falta de um lugar adequado na região para dar um fim à bituca.
"A bituca em contato com a água libera substâncias tóxicas e também acaba entupindo a rede pluvial da cidade. Além de, visualmente, fomentar uma paisagem de degradação", afirma Rafael Rodrigues, 31, gestor da Rede Papel Bituca.
As pontas de cigarro também provocam incêndios. Em 2013, o Corpo de Bombeiros conteve 530 ocorrências do tipo apenas na capital.
Ainda na região central, a negociadora de contas Danielly Nogueira, 33, faz o mesmo. Ela se diz culpada a cada vez que usa os 40 minutos de intervalo para fumar.
"O meu trabalho deixa a minha mente destruída. Não tenho cabeça para pensar em uma solução para as bitucas. Quando não tem um lugar adequado, o jeito é usar o chão."
MAU COMPORTAMENTO
Segundo Cleide Sousa, doutora em psicologia ambiental da UnB (Universidade de Brasília), bitucas de cigarro são o resíduo "mais descartado em todo o mundo".
Ela lembra que a lei antifumo em ambientes fechados obrigou a população a fumar em espaços abertos, "fator que pode explicar o mau comportamento na hora de dar um fim às bitucas".
Para a pesquisadora, o ato mostra "falta de informação" e representa uma "atitude egoísta".
"Quem joga uma 'bituca' no chão não faz uma autocrítica em relação ao próprio comportamento e sempre joga a responsabilidade para o poder público. Mas há uma responsabilidade individual nesse processo que nunca é levada em consideração", explica a especialista.