Folha de S. Paulo


Testemunha de defesa diz que houve excesso da PM no Carandiru

O desembargador Fernando Torres Garcia, testemunha de defesa do julgamento do massacre do Carandiru, disse nesta segunda-feira que houve exagero da Polícia Militar durante a invasão ao pavimento 9, em outubro de 1992. "Houve inegável excesso [da PM]. Isso me parece nítido", disse.

Nesse quarto bloco do júri, estão sendo julgados dez policiais do Gate (Grupo de Ações Táticas Especiais) pela morte de dez detentos e a tentativa de homicídios de outros três.

Na época da invasão, Torres era juiz-auxiliar da corregedoria de presídios e presenciou, de fora da Casa de Detenção, a entrada da polícia no Carandiru. "Havia uma rebelião e a entrada da polícia se fez necessária", afirmou.

Apesar de ter sido chamado pela defesa, o depoimento do desembargador pode auxiliar a Promotoria, uma vez que ele admitiu que houve uma ação desproporcional a necessária.

Após o depoimento de Torres, o investigador Maldiney Antonio de Jesus, que na época era agente penitenciário do pavilhão 9, onde ocorreu o massacre foi ouvido.

Ele afirmou que, no dia do massacre, não entrou nos pavimentos. Mas disse que nos dois anos que atuou no local, nunca apreendeu arma de fogo com os detentos.

DEPOIMENTO

Durante o depoimento, perito criminal Osvaldo Negrini Neto afirmou que havia vestígios de disparos em rajadas nas paredes do quarto andar.

As marcas, segundo Negrini, apontariam que foi usada metralhadora contra os detentos. Ao todos, seis dos dez detentos mortos tinham ferimentos à bala, de acordo com a acusação.

Questionado pela Promotoria se os policiais que entraram no pavimento haviam feito disparos de alerta ou advertência antes de atirar contra os detentos, o perito afirmou que não encontrou marcas que apontassem uma sinalização.

Negrini voltou a confirmar que o propósito na operação era levar os presos à morte e que não havia sinal de confronto no andar por parte dos detentos.

Assim como nos julgamentos dos blocos anteriores, o perito afirmou que 90% dos vestígios de tiros encontrados foram feito da entrada do pavimento para a cela e que no quarto andar não havia sinais de confronto.

Negrini disse ainda que em uma das celas os policiais atiraram da soleira da porta da cela, sem que houvesse necessidade de abri-la ou chance de desvio por parte dos detentos.

TENSÃO

Durante depoimento de Negrini, o advogado dos policiais, Celso Vendramini, tentou desqualificar o trabalho realizado pelo perito logo após o massacre na Casa de Detenção.

O advogado questionou Negrini sobre o reagente utilizado para identificar sangue humano no local.

Na tentativa de explicar que não se tratava do produto citado pelo advogado, o perito foi interrompido por Vendramini. "Você não tem que esclarecer os jurados, você tem que responder as minhas perguntas", afirmou o defensor.

Os promotores tentaram intervir no interrogatório, o que causou mal estar entre defesa e acusação.

Logo após o final do depoimento do perito, o Ministério Público dispensou uma de suas testemunhas, o chefe de segurança do Carandiru na época, Moacir dos Santos.

A decisão desagradou a defesa, que afirmou em plenário que gostaria de ouvi-lo. "Foi o senhor que arrolou a testemunha?", questionou o juiz Rodrigo Tellini ao advogado. "Não, mas eu gostaria de ouvi-la", disse o defensor, que insistiu no pedido, sem sucesso.

No mês passado, a terceira etapa o júri foi interrompida após o advogado de defesa abandonar o plenário ao acusar o juiz de ser "parcial" e prejudicar a defesa.

O conselho de sentença foi, então, dissolvido. Os 15 PMs, que eram julgados na ocasião, terão de voltar ao banco dos réus no próximo dia 31.

Devido ao grande número de réus e de vítimas, o julgamento do massacre está sendo feito em etapas, conforme os andares do antigo prédio. Em 2013, foram condenados 48 PMs por mortes no primeiro e no segundo andares. Eles recorrem em liberdade.


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